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Fígaro: pândego da ópera de Rossini é um barbeiro “sabe-tudo” que ajuda a união entre Rosina e o Conde D’Almaviva | Divulgação
Fígaro: pândego da ópera de Rossini é um barbeiro “sabe-tudo” que ajuda a união entre Rosina e o Conde D’Almaviva| Foto: Divulgação

Opinião - Cristiano Castilho, repórter do Caderno G

Vivaz e de bom gosto

A notícia de que uma ópera-bufa do século 19 seria mesclada a desenho animado deve ter sido motivo de algumas caras feias por aí. Entretanto, o que se viu no Teatro Pedro Ivo, em Florianópolis, e que poderá ser conferido no Teatro Positivo, em Curitiba, na próxima semana, é um espetáculo inovador e muito bem costurado.

A história em dois atos tem em Fígaro, barbeiro famoso da cidade de Sevilha, seu protagonista. Ele arranja casamentos, espalha boatos e se envolve no dilema do Conde D’Almaviva, que tenta de todas as formas tirar Rosina, o amor de sua vida, do poderio do seu tutor, D. Bartolo.

Os desenhos de Joshua Held só ajudam na trama. Tanto no aspecto visual (é interessante ver como atores de carne e osso interagem com animações projetadas sem perder o senso interpretativo) como na adição de leveza, tratada sem exageros: nas árias mais longas, elementos visuais surgem na tela como distração momentânea. Há espaço para aranhas marotas, pássaros espevitados, Godzilla e até Darth Vader (o vilão da série Star Wars). O bom gosto predomina, e a estratégia funciona. Em Florianópolis houve alguns problema com as legendas – a ópera é apresentada em italiano – mas nada que comprometesse o entendimento.

Com o selo de qualidade de John Neschling, percebido também na escolha dos músicos e dos cantores, a Companhia Brasileira de Ópera nasce grande. E promete mais. GGGG

  • Pelos traços de Joshua Held, ópera ganha em atualidade sem perder características essenciais

Consta que a reação da plateia que acompanhou a apresentação da ópera O Barbeiro de Sevilha em Florianópolis, na noite da última quarta-feira, se assemelha ao que aconteceu na estreia do espetáculo do compositor italiano Gioachi­­no Rossini (1792-1868), há 194 anos. Risos e mais risos. Mas, se na primeira execução as gargalhadas foram motivadas mais por problemas técnicos – a corda de um violão se soltou –, quem catalisou os sorrisos no último dia 14 foram desenhos animados projetados no telão do Teatro Pedro Ivo, na capital catarinense. A responsável pelo feito é a Companhia Brasileira de Ópera (CBO), trupe desbravadora que já nasce grande e pretende semear como nunca o gênero operístico no Brasil. Curi­­ti­­ba recebe a encenação de O Bar­­beiro de Sevilha de 21 a 25 de julho, no Teatro Positivo.

Com direção artística de John Neschling (ex-maestro da Orques­­tra Sinfônica do Estado de São Paulo), a CBO foi criada na metade de 2009. Reúne diversos maestros e quase setenta músicos e cantores brasileiros e estrangeiros por etapa – a cada turnê de quatro dias, dois elencos se revezam.

"Eu e Neschling queríamos fazer um festival de ópera. Mas como no Brasil nunca tivemos uma companhia estável, pensamos nisso. O Ministério da Cultura imediatamente se entusiasmou com a proposta", explica o produtor executivo José Roberto Walker. O orçamento para a criação do grupo – que também conta com o patrocínio do Banco do Brasil e da Petrobras – foi de R$ 10,3 milhões.

A estreia aconteceu em Belo Horizonte, dia 24 de junho. Antes de Curitiba, a CBO passou por Porto Alegre e Florianópolis. Até o final do ano, mais 11 cidades serão visitadas, sempre com quatro dias de apresentações: três para adultos, com a execução da ópera na íntegra – cerca de 2 horas e 30 minutos – e uma de 50 minutos, pensada para o público infantil.

"Não é que a companhia tenha nascido grande, é que gostamos de pensar em projetos em um nível diferente", diz Walker.

Fígaro Fi!

Além da criação do grupo permanente, algo inédito no Brasil, a ou­­sadia se dá também no momento de execução da ópera de Rossini. O cartunista norte-americano Jos­­hua Held foi convidado para participar do projeto. Então, cantores interagem com os próprios personagens da comédia, criados por ele e projetados em um telão. São cerca de 800 takes diferentes, e o sincronismo entre músicos, cantores e desenhos é um desafio à parte.

"Com a animação projetada, há um outro viés para o maestro. Em alguns momentos, os desenhos têm que coincidir com a música. Em outros, a música tem que esperar determinado efeito na tela", explica Abel Rocha, maestro que irá reger a apresentação em Curitiba.

O fato de ser uma ópera popular de Rossini – até os desenhos Pica-Pau e Pernalonga já se utilizaram da ária cantada pelo pesronagem Fígaro – facilitou a adaptação lúdica do espetáculo.

Fígaro Fa!

Um andar inteiro de um hotel em Florianópolis foi ocupado pelos cantores. O maior motivo são as horas que antecedem o espetáculo. Este é o momento de aquecimento e, se o vizinho de quarto também é um soprano ou um barítono, não há problemas em soltar a voz. Foi o que fez por meia hora a mineira Edna D’Oliveira – que interpreta Berta.

"Aqueço o corpo também. O corpo canta e os músculos têm que estar preparados", diz a soprano. Quanto à Companhia, "luz no fim do túnel". "É uma proposta inovadora. Agora há uma perspectiva de trabalhos para o futuro".

Artistas do mundo inteiro convivem na CBO. Quem não largou o chimarrão nem durante a entrevista foi o uruguaio Federico Sangui­­netti, o próprio Fígaro.

"Já estou misturando italiano, espanhol e português", diz o barítono, também empolgado com o projeto. "Isso é inédito em toda a América Latina. É um impulso que só o Brasil poderia dar", conta, en­­chendo a cuia e aquecendo a voz.

Serviço:

O Barbeiro de Sevilha – Companhia Brasileira de Ópera Teatro Positivo – Grande Auditório (R. Prof. Pedro Viriato Parigot de Souza, 5.300), (41) 3317-3283. De 21 a 24 de julho (adulto), às 20 horas e dia 25 (infantil), às 16 horas. O preço dos ingressos varia de R$ 19 a R$ 74 (adulto) e R$ 10 (infantil). Classificação indicativa: 8 anos (adulto) e livre (infantil). Confira o serviço completo

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