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 | Osvalter Urbinati e Robson Vilalba
| Foto: Osvalter Urbinati e Robson Vilalba

Serviço

A Arte e a Maneira de Abordar Seu Chefe para Pedir um Aumento

Teatro Marista. Dias 29 e 30 de março, às 21 horas. Ingressos esgotados.

Esta Criança

Guairinha. Dias 31 de março e 1º de abril, às 21 horas (ingressos esgotados). Dia 1º, às 19 horas (ingressos à venda).

Serviço

O Líquido Tátil

Teatro do Paiol. Dias 27 e 28 de março, às 21 horas.

A Marca da Água

Teatro da Reitoria. Dias 28 e 29 de março, às 21 horas.

Ficção

Teatro do Paiol. Dias 6 e 7 de abril, às 21 horas.

Prazer

Teatro Bom Jesus. Dias 6 e 7 de abril, às 21 horas.

Serviço

O Espelho

Bosque do Papa. Dias 30 e 31 de março, às 11 e 16 horas. Ingressos esgotados.

Maravilhoso

Teatro Bom Jesus. Dias 3 e 4 de abril, às 21 horas.

No Fringe: A Festa

Teatro Novelas Curitibanas. Dias 28 e 29 de março, às 20 horas.

Viúva porém Honesta

Teuni (Teatro Experimental Universitário, na UFPR). Dias 3 a 6 de abril, às 13 horas.

Vazio É o Que Não Falta, Miranda

Teuni (Teatro Experimental Universitário, na UFPR). Dias 5 a 7 de abril, às 18 horas.

  • Ficção, da Cia. Hiato: relação próxima com o festival

As mudanças sentidas pela produção teatral brasileira nas últimas duas décadas estão refletidas ao longo da história do Festival de Curitiba. Com uma curadoria regida pela lógica da vitrine da temporada – em vez da proposição de olhares ou caminhos estético específicos –, a Mostra 2013 segue os ventos dessas transformações, como testemunha de seu tempo.

Nos anos 1990, isso significava especial atenção aos grandes encenadores, tais quais Gerald Thomas e Gabriel Villela, figuras determinantes do modo de se fazer teatro àquela época. Na década seguinte, essa centralidade do encenador arrefeceu e o festival foi, em mais de um momento, considerado "morno", pouco ousado ou uma "feira livre". A cartela de espetáculos preparada para este ano responde a tais críticas com uma programação mais afinada à melhor produção brasileira atual. Ou seja, à pesquisa de linguagem realizada no contexto do teatro de grupo.

"É flagrante a contaminação pelo teatro de pesquisa, reflexo da forte tendência dos modos de produzir em grupo nos últimos dez anos. A programação de 2013 desenha mais claramente essa transformação ao eleger criações de risco em termos de linguagem. Neste sexto ano como diretor geral, o Leandro [Knopfholz] dá sinais de mais abertura à curadoria para a dimensão propriamente artística, às desestabilizações que levem criadores e público a saírem do lugar comum de quando em quando", analisa o crítico paulista Valmir Santos, que acompanha o festival há 20 anos.

É massiva a presença de grupos tais como Lume, Balagan, Opovoempé, Hiato, Luna Lunera, Espanca!, Clowns de Shakespeare, Armazém, Atores de Laura e Cia. Brasileira. "Nos primeiros anos, Galpão e Armazém eram dos poucos que iam ao festival. Havia muita produção autônoma, de juntar elenco", observa o crítico mineiro Miguel da Anunciação, que faz sua 18.ª cobertura do evento curitibano neste ano. Para ele, vê-se uma evolução em relação à própria ideia de diversidade sempre defendida pela curadoria. "O teatro de grupo sofisticou a diversidade, porque os grupos não conjugam o mesmo verbo, cada um tem uma pesquisa diferenciada."

A consolidação como centros produtores de espetáculos foi possibilitada pelo provimento de incentivos fiscais públicos, com destaque para a Lei do Fomento, em São Paulo – ainda que estejam longe de atender às demandas Brasil afora. "Dos anos 1990 para o inicio de 2000, houve um certo recesso da formação de grupos. Não existiam políticas públicas de apoio e financiamento. Hoje, já há até o debate sobre a necessidade de que esses grupos tenham sedes. A atmosfera institucional desfavorável melhorou", constata a curadora carioca Tânia Brandão.

Estrelas

Outras consequências vieram desse fortalecimento do teatro de pesquisa. "O festival se descola um tanto da cômoda associação com artistas da televisão", opina Valmir.

Sintomaticamente, Marco Nanini e Renata Sorrah, as estrelas desta edição, apresentam espetáculos que são frutos de sérios processos de investigação. O solo A Arte e a Maneira de Abordar Seu Chefe para Pedir um Aumento foi encarado tanto pelo diretor Guel Arraes quanto por Nanini como um estudo – um exercício de ator. "O trabalho traz diversas linhas de tensionamento entre a literatura e a performance do teatro, o monólogo, as projeções, o drama e a narração", diz Tânia.

Renata Sorrah foi ainda mais longe, associando-se a um grupo já estabelecido pelo qual nutria admiração, a Cia. Brasileira, com quem faz Esta Criança. "No caso da Renata, a questão [da pesquisa] vai até a própria estrutura do espaço cênico, porque o cenário e a luz trabalham com um espírito de dissolução da concepção realista, no caminho da performance, questionando a profundidade, a perspectiva, os caminhos do olhar", analisa a curadora carioca.

Para Tânia, a recuperação do cinema brasileiro e a especialização da tevê em nichos é o que têm levado atores consagrados a buscarem, cada vez mais, os grupos. "Apareceu essa necessidade de um lugar de pesquisa e criação mais livre e honesto com a própria arte", diz. "É muito interessante dentro da estrutura do teatro brasileiro essa ruptura entre o famoso consagrado e o pesquisador".

Inéditas

As transformações dos últimos anos vão além. "O festival tinha um gosto pronunciado pelas estreias, Curitiba servia com porto de lançamento dos espetáculos, que depois estavam fadados a rodar o Brasil", recorda Miguel da Anunciação. Esse tempo ficou para trás. "As estreias eram mais de 50% da grade. Hoje, essa preocupação não é preponderante", diz Lucia Camargo, curadora do festival há 20 anos. Também nesse caso, a explicação vem da própria dinâmica de produção no país. "As fontes de apoio [financeiro] se concentram no segundo semestre do ano, então há estreias importantes que já aconteceram de julho para cá", diz Lucia.

Ela obseva que o perfil da Mostra 2013 se renovou também com o maior investimento em espetáculos internacionais, que deixaram de ser esporádicos para ocupar lugar fixo na programação anual. O mesmo se deu com a dança e o circo, presentes com mais constância."A grade se abriu bastante para as artes cênicas", diz Lucia. Para ela, falta a ópera. "Quem sabe um dia o Teatro Guaíra se anima a fazer uma com o festival?".

Trajetórias cruzadas

Chama a atenção na Mostra 2013 do Festival de Curitiba a forte presença do teatro de grupo. Desde o Lume, de Campinas, que vem pela primeira vez, com Os Bem-Intencionados, embora já acumule 25 anos de pesquisa, premiada com o Shell-SP neste mês. Até trajetórias que se confundem com a história do evento, caso do veterano Armazém e da jovem Cia. Hiato. E ainda aqueles que enfim retornam após passagens definidoras para suas carreiras.

Quem acompanha o festival desde a década passada deve se lembrar de como a cena mineira ganhou projeção nacional após apresentações marcantes em Curitiba. O caminho aberto pela Cia. Clara foi seguido pelo grupo Espanca!, cujo Por Elise causou burburinho no Fringe 2005 – reforçado por Amores Surdos na Mostra 2006. Dois anos depois, o Luna Lunera se sagrou com Aqueles Dois.

"Ter estreado no Festival de Curitiba detonou um circuito de nossos espetáculos fora de Belo Horizonte", comenta Grace Passô, diretora do Espanca!. Ela interrompe a temporada de O Líquido Tátil em São Paulo para se apresentar na Mostra 2013. Será a primeira vez que tanto o Espanca! quanto o Luna retornam ao evento para mostrar novos trabalhos.

Assim como Amores Surdos, O Líquido Tátil é um drama familiar manchado pelo absurdo. O texto e a direção, desta vez, são do argentino Daniel Veronese, que imprime traços cômicos a uma trama sobre vícios e pulsões incontidos.

Grace constrói sua personagem, Nina, com trejeitos caninos, manifestando uma irracionalidade que desperta o ciúme do marido. Em paralelo, os personagens confrontam o cinema e o teatro, expondo particularidades das duas linguagens.

A atriz acredita que o entusiasmo criado em torno dos grupos mineiros se deu pela renovada relação com o espectador que eles buscavam. "Uma vontade de que os códigos teatrais não sufocassem o desejo de dialogar de uma forma sensível com a plateia", diz.

Ator do Luna Lunera, que volta com Prazer à Mostra 2013, Odilon Esteves acrescenta: "A gente desejava que o público não ficasse de fora. E isso não significa facilitar para o espectador, mas, sim, travar um jogo em que a presença dele faz diferença".

Prazer é uma criação livre, feita em parceria com o dramaturgo carioca Jô Bilac, a partir de estímulos da obra de Clarice Lispector – sobretudo, de Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres. A montagem foi desenvolvida dentro de um observatório de criação aberto ao público interessado. "Uma semana antes da estreia em São Paulo, a partir da conversa com os espectadores, reeditamos radicalmente a dramaturgia", conta Odilon.

Assíduos

Se Espanca! e Luna tiveram suas trajetórias marcadas pelo Festival de Curitiba, o que dizer do Armazém? Desde 1998, quando apresentou Sob o Sol em Meu Leito após a Água, o grupo dirigido por Paulo de Moraes já veio sete vezes. "Sempre fechamos novas apresentações para os espetáculos. Em algumas, as discussões levantadas nos levaram a importantes reflexões sobre o trabalho, principalmente A Caminho de Casa e Inveja dos Anjos", diz Moraes.

Em A Marca da Água, a nova montagem, o Armazém revolve questões antigas: a memória, o tempo narrativo e um olhar poético sobre a existência. Mas também aponta para o futuro. "Mudanças internas estão acontecendo no grupo nos últimos dois anos. Encarando o passar do tempo, a gente vai encontrando novos códigos de criação", conta o paranaense.

Com uma carreira ainda breve, a Cia. Hiato já construiu uma relação próxima com o festival. Dos quatro espetáculos de seu repertório, só o primeiro, Cachorro Morto, não passou pelo evento, mas o reconhecimento por ele obtido gerou o primeiro convite, para Escuro, seguido por O Jardim. "O festival dá mais visibilidade não só dentro do país, como com curadores internacionais e outros públicos", diz o diretor Leonardo Moreira, que recentemente se apresentou na Alemanha e no Chile.

O trabalho criativo e autobiográfico do elenco se aprofunda em Ficção, conjunto de monólogos selecionado para a Mostra 2013. O ator Thiago Amaral, por exemplo, faz um solo escrito pelo pai, reatando um laço rompido por anos. "Ele está se expondo ali", diz Moreira.

A camada cinematográfica, vista nas peças anteriores, é removida ao máximo, assim como a teatral. "É possível tirar a ficção da realidade?", questiona Moreira. "Como diz o filósofo Slavoj Zizek, é como num ato sexual, em que sempre há uma relação ficcional mediando. Se você perde a ficção e pensa no movimento do quadril, perde o sentido".

Jornada prolongada de encontros

A visibilidade proporcionada pela Mostra 2013 não priva alguns artistas de se arriscarem também no Fringe, para revelarem mais facetas de suas criações. É o que fazem, neste ano, os paulistas do Opovoempé, o dramaturgo carioca Diogo Liberano e a diretora mineira Grace Passô. Sem contar os pernambucanos do Magiluth, que voltam pela mostra paralela depois de participar da principal em 2012.

Esses criadores têm em comum a preocupação em tornar mais potente o encontro com o público, cada um ao seu modo. Não é exclusividade deles. Trata-se de uma tendência forte numa parcela do teatro interessada em reafirmar a relevância dessa arte no cotidiano das pessoas, rompendo convenções estagnantes.

"Nada contra as tecnologias da informação, mas, no teatro, podemos ter uma experiência única de estarmos juntos", diz Cristiane Zuan Esteves, diretora do Opovoempé. "Ao aproximar o teatro da vida, ele se torna uma estratégia de ampliação da percepção e de reflexão sobre o estar no mundo".

Convidado a apresentar O Espelho na Mostra 2013, Opovoempé estendeu sua estada em Curitiba trazendo A Festa ao Fringe. Os dois espetáculos integram o projeto A Máquina do Tempo (ou Longo Agora), espécie de trilogia sobre a experiência contemporânea do tempo. O Farol só não vem por ter sido criado para o espaço urbano de São Paulo.

Se O Espelho promove um encontro com bolo e café no gramado do Bosque do Papa, A Festa ocupou o teatro Novelas Curitibanas propondo ao público pensar o presente. "É uma oportunidade de olhar para si e para como usa seu tempo", diz a diretora, revelando que se pede ao espectador, por exemplo, o cálculo de quantos dias já viveu.

Incompletude

Destaque no Fringe 2012 com Sinfonia Sonho, o Teatro Inominável volta com Vazio É o Que Não Falta, Miranda, inserindo elementos da performance dentro da ficção. O espetáculo é um dos dois trabalhos nos quais Diogo Liberano está envolvido. Ele responde também pela dramaturgia de Maravilhoso, peça dirigida por Inez Viana na Mostra 2013.

As semelhanças entre os dois param na inspiração em textos clássicos. Maravilhoso transpõe ideias do Fausto de Goethe ao universo do carnaval carioca. Já ...Miranda é o saldo de uma tentativa de montar Esperando Godot, de Beckett.

"No processo, percebemos que desaprendemos a esperar e buscamos a plena satisfação de nossos desejos. Esperar Godot não faria mais tanto sentido. Optamos então por atualizar o texto original. Descobrimos a nossa dependência por completude, e o vazio como parte constituinte do ser humano", diz o diretor do Teatro Inominável.

Assim como Liberano apresenta trabalhos feitos com núcleos diferentes, Grace Passô não se limita a atuar em O Líquido Tátil (do Espanca!) nem a dirigir Os Bem-Intencionados (do Lume). Vem ainda com Os Ancestrais, programada para a mostra mineira no Fringe e na qual dirige o Teatro Invertido.

Os Ancestrais propõe uma situação-limite: o soterramento de uma família. Os atores se debatem contra condições físicas precárias do cenário (criado por Fernando Marés), enquanto a noção de propriedade de terra no Brasil é posta em xeque.

Interessada em modos contemporâneos de contar uma história, Grace segue trilhos delirantes sem perder o foco na crítica social."Depois de encontradas, que vida essas pessoas terão? São famílias que lutaram para construir uma casa e, de repente, perdem tudo", diz a autora.

Retorno

Ainda no Fringe, é possível ver o novo espetáculo do Magiluth. A boa repercussão da passagem por Curitiba em 2012 com Aquilo Que Meu Olhar Guardou para Você e com apresentações na mostra organizada pela Cia. Brasileira motivou os pernambucanos a retornarem com Viúva, Porém Honesta.

Em busca de uma obra de Nelson Rodrigues para desenvolver seu jogo cênico, o grupo não hesitou em escolher uma das mais frágeis, até por ter sido concebida como resposta rápida às críticas a Perdoa-me por Me Traíres. "A maneira de Viúva... achincalhar o país e lidar com a instituição da família brasileira e o despudoramento com a crítica teatral nos contagiou", diz o diretor Pedro Vilela.

Fiéis à ideia rodrigueana de "farsa irresponsável", cinco atores homens fazem os 13 personagens."Tiramos o Nelson do pedestal em que o andam colocando e trouxemos para um olhar bastante específico, que é o de um grupo de pesquisa que reside em Recife e investe num diálogo contemporâneo com seus espectadores", diz.

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