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“Estranho que esse manifesto [dos artistas] se organize com tanta energia contra a FCC e exima das críticas as políticas do governo do estado”, afirma Cordiolli | Henry Milléo/Gazeta do Povo
“Estranho que esse manifesto [dos artistas] se organize com tanta energia contra a FCC e exima das críticas as políticas do governo do estado”, afirma Cordiolli| Foto: Henry Milléo/Gazeta do Povo

Na semana passada, a publicação de um manifesto assinado por artistas, produtores e ativistas culturais mexeu com o setor ao cobrar duramente a gestão da Fundação Cultural de Curitiba (FCC) e seu presidente, Marcos Cordiolli, a respeito de uma série de temas relativos à gestão da cultura na cidade. Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, Cordiolli comentou a legitimidade das demandas, os aspectos políticos da crise, assumiu alguns erros e conta como pretende saná-los.

A FCC passa por uma crise? Qual a sua origem: problemas de gestão ou dificuldades financeiras?

Há duas questões diferentes. Uma tem relação com a estruturação das ações da FCC. A outra, com o nosso relacionamento com os artistas e produtores culturais. No primeiro ponto, de fato, quando assumimos a FCC recebemos um diagnóstico incompleto e irreal sobre vários aspectos da gestão. Isso nos levou a superdimensionar nossas capacidades de atuação. Se há um mea culpa que devemos fazer é o de que superestimamos nossa capacidade de realização em função das dificuldades que de fato encontramos.

Quais são as dificuldades?

Nos últimos 14 anos, o número de espaços culturais cresceu 40% e, nesse mesmo período, o número de servidores que perdemos também foi de 40%. A partir de 2004, o grosso dos investimentos foi passado para o Fundo Municipal de Cultura. Uma conquista que a gente comemora e quer ampliar. Porém, a capacidade financeira da fundação de investir foi bastante reduzida. Esse é o dilema que precisamos resolver. Precisamos ampliar os recursos para a cultura até um patamar maior que o 1% do orçamento municipal — que é a meta dessa gestão para projetos via fundo e renúncia fiscal —, para o custeio da FCC, a manutenção dos espaços e um conjunto de recursos para se investir em ações culturais e políticas estruturantes.

Quando o manifesto foi publicado, a FCC emitiu uma nota dizendo que não o considerava "legítimo por ser meramente político". O senhor ainda pensa assim?

O que nós criticamos foi a origem dele, sem uma liderança identificável, sem assinatura. Nós queremos e estamos dialogando com todas as entidades. Em momento nenhum criticamos a legitimidade da mobilização, nem a de demandas apresentadas. A principal delas, que é sobre o patamar de 1% do orçamento para a cultura, é algo que defendo desde que assumi. Nós vamos intermediar o diálogo com o governo e já marcamos uma reunião na semana que vem com o prefeito Gustavo Fruet (PDT) e com as entidades de movimentos culturais organizadas para discutir essas demandas.

A FCC reconhece que as demandas são reais? Como a FCC vai lidar com elas?

Algumas são reais, outras não. Por exemplo, não ocorreu sucateamento dos espaços. Não reduzimos nenhum espaço cultural desde que assumimos. Nós estamos procurando resolver esse problema histórico e, ao contrário, incorporamos mais dois imóveis [da União Paranaense dos Estudantes e da Casa Kozák], além de termos recuperados uma série de espaços que estavam sucateados, como o TUC, Muma, Cinemateca, Memorial de Curitiba.

Há um conjunto de pessoas que assinou o manifesto com quem temos relação permanente, que tem reivindicações pontuais que são legítimas e sobre as quais estamos conversando. Uma parte delas nasce da nossa dificuldade de ter recursos próprios para ações estruturantes que ainda estão aquém do que precisamos. Por outro lado seria necessário um comprometimento maior do governo estadual.

De que maneira?

Boa parte dessa crise vai ser sanada quando o governo do estado também cumprir seu papel com a cultura. Organizando seus fundos, suas políticas culturais, recuperando os equipamentos da capital. Isso vai nos ajudar muito. Eu estranho que esse manifesto se organize com tanta energia contra a FCC e exima das críticas as políticas do governo do estado. As que nos cabem e são legitimas, vamos atendê-las, mas não podemos pensar na FCC de forma isolada. Enquanto não tivermos uma política de fomento da cultura do estado, por mais que cresçamos o orçamento não vamos resolver a demanda reprimida de artistas e produtores culturais e da população.

Quanto dessa turbulência tem a ver com disputas políticas internas no PT que afloraram depois das eleições do mês passado?

Nosso modelo de gestão democrática com participação e controle público está muito associado ao modelo da participação popular que foi apresentado pelo governo federal. E contra o qual sabemos que há uma oposição muito grande na sociedade. [Também] achei estranho que esse manifesto não reconheceu a grande mobilização das Conferências Municipais e dos conselhos setoriais. Há também um segmento do partido dos trabalhadores que foi contra a coligação com o PDT e que não concorda com a nossa participação no governo. Esse é um debate importante que o PT tem feito. O PT é um partido de profunda democracia interna. E foi assim que decidimos participar da coligação, indicar o nome da vice-prefeita e também participar do governo ocupando algumas secretarias. Nas quatro secretarias do PT no governo, temos seguido à risca tanto a orientação partidária, quanto o plano de governo.

Quando chegaremos ao percentual de 1% do orçamento municipal para investimento em Cultura?

Temos duas drenagens de recursos que afetam a distribuição do orçamento. Um é o pagamento da dívida da gestão passada e outro, o subsídio artificial ao transporte coletivo. Para contornar isso, a prefeitura vai lançar uma revisão do IPTU — promovendo um refinanciamento da dívida. Além disso, acredito que estamos vivendo um período ruim dentro de um ciclo longo de crescimento que será retomado. Acredito que, no começo do ano, a crise vai perdurar, mas com essas equações nós seguramente teremos mais recursos. E, até o final da gestão, vamos chegar a esse patamar formal para ter orçamento para nossas prioridades, fazer concurso público e dar planos de carreira aos servidores. Vamos deixar uma FCC saneada e eficiente. Para conseguir isso, é fundamental que nossos críticos entendam nossas limitações e colaborem de forma mais concreta.

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