
A primeira coisa que chama atenção em Boyhood ("meninice" seria uma tradução simpática) é uma proeza que aparece pouco em filmes de ficção: a história cobre um período de 12 anos e a produção durou o mesmo intervalo de tempo.
Isso significa que o personagem principal, o menino Mason (Ellar Coltrane), cresce, passa pela pré-adolescência e entra na juventude diante das câmeras. Daí o epíteto nacional: "da infância à juventude".
A história começa com a mãe (Patricia Arquette) lidando com um dia a dia difícil na criação de duas crianças Mason, de 6 anos, é uma delas.
A trilha sonora dá a medida das referências que aparecem no filme (outra forma de perceber a passagem do tempo), partindo de "Yellow", do Coldplay, para chegar a "Deep Blue", do Arcade Fire.
A certa altura, o pai (Ethan Hawke) reaparece, algo sem jeito, querendo retomar o contato com os filhos. Tenta se reaproximar também da ex-mulher, mas o que foi quebrado quando se separaram não tem mais remendo. Mason provoca a irmã no café da manhã, a irmã não o deixa dormir no beliche que dividem, a mãe toma partido da filha e o menino fica frustrado.
O enredo pode parecer pequeno nada "acontece" no filme , mas é essa costura de eventos cotidianos que, no fim, cria um efeito extraordinário: é como se estivéssemos testemunhando um conjunto de vidas na tela, com os personagens envelhecendo e passando por etapas que quase todo mundo passa, abarcando de festas de aniversário à rotina na escola, da relação com os pais aos amores da adolescência.
Efeito semelhante aparece na trilogia Antes do Amanhecer, Antes do Pôr do Sol e Antes da Meia-Noite, talvez os filmes mais conhecidos de Linklater (junto com Escola do Rock). A trinca de filmes começa em 1995 e termina em 2013. São 18 anos em que acompanhamos os mesmos personagens, Jesse (Hawke, de novo) e Celine (Julie Delpy). No primeiro filme, os dois se conhecem num trem rumo a Viena, passam a noite juntos, se separam sem trocar endereços nem telefones algo impensável hoje em dia e marcam de se ver dali a seis meses no mesmo local.
A manobra não dá certo e, no segundo filme, eles se reencontram em Paris, mais velhos, cada qual com seus problemas. No terceiro, eles são casados (não é segredo, está na sinopse), têm duas filhas gêmeas e tentam lidar com... a vida. A mesma vida que aparece, surpreendentemente, em Boyhood.
Autêntico
Por decidir contar uma história em que os personagens envelhecem de verdade (em vez de recorrer à maquiagem ou efeitos de computador), o diretor Richard Linklater criou um filme autêntico: é uma experiência ver o tempo passando de fato. GGGG



