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O trabalho dos cariocas da Cia. dos Comuns é baseado na construção de uma dramaturgia própria, utilizando elementos cênicos e de textos ligados à cultura afro-brasileiros. O grupo vem pela primeira vez ao Festival de Teatro de Curitiba para encenar Bakulo – Os Bem Lembrados, espetáculo que fecha uma trilogia iniciada com as peças A Roda do Mundo (2001) e Candaces – A Reconstrução do Fogo (2003), tratando de temas relacionados aos ancestrais negros.

Todas as peças têm direção de Marcio Meirelles, que acompanha há algum tempo a companhia criada por Hilton Cobra, formada só por atores e atrizes negros. "Nos espetáculos da trilogia, nos baseamos no trabalho do (geógrafo e professor) Milton Santos, mas, em Bakulo, a inspiração é mais explícita, usamos muitos textos dele e tratamos da questão da produção intelectual negra, da ocupação de território e da memória dos ancestrais. Tudo isso se transforma numa arma para defendermos nossa identidade", comenta o encenador sobre a montagem que tem sessões hoje e amanhã no Guairão.

Segundo ele, A Roda do Fortuna falava das relações necessárias para a cultura negra sobreviver. Já Candance resgatava uma história antiga, que se passa antes de Cristo, sobre rainhas guerreiras negras de um povo que vivia às margens do Rio Nilo, fazendo trocas culturais com o Egito e enfrentando bravamente os romanos. "Fizemos a associação dessas mulheres históricas com as mães dos morros do Rio de Janeiro, que também são rainhas, guerreiras, conseguem manter a estrutura familiar e seus valores apesar da polícia, do tráfico, da intolerância religiosa", diz Meirelles.

Bakulo tem como personagem central um cineasta negro (interpretado por Cobra) que fez um curta-metragem que virou cult nos anos 70. Mas ele não conseguiu dar seqüência à carreira no cinema e continua sonhando em fazer um grande filme, inspirado em Glauber Rocha, mas que na realidade é a história da sua própria vida, tratando dos já citados temas da produção intelectual, ocupação de território e memória. Entre os nove personagens da peça ainda destacam-se um rapper que pretende montar uma rádio para unir sua comunidade e uma professora universitária que desenvolve uma tese ambientalista.

Além do cinema, a montagem apresenta elementos musicais, com um quinteto acústico interpretando canções ao vivo. "A utilização da música ao vivo é constante no meu trabalho. E uma linguagem cênica e dramatúrgica negra não pode deixar de lado a música e a dança, pela movimentação e corporeidade intensas da cultura negra", analisa o diretor.

Outra marca cênica importante em Bakulo é que cada seqüência da peça tem um cenário com uma cor diferente. Meirelles explica que as cores são ligadas aos candomblé, principalmente à cultura banto – bakulo é uma palavra banto que significa ancestrais, no caso, os que deixaram coisas boas e positivas para a tribo. "A cultura banto no Brasil é muito sufocada pela iorubá. Temos uma noção muito louca do que é a África, que fica parecendo apenas uma vila de onde veio tudo. Mas, na verdade, o continente tem muitas culturas e civilizações diferentes. Nossa intenção é mostrar que existem diferenças culturais na África", explica Meirelles.

Serviço: Bakulo – Os Bem Lembrados. Guairão (Pça. Santos Andrade, s/n.º). Hoje e amanhã às 20h30. Ingressos a R$ 24. Informações: www.festivaldeteatro.com.br.

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