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Para o colecionador Vidal Costa, as músicas armazenadas no computador estão “desencarnadas” | Felipe Rosa/ Gazeta do Povo
Para o colecionador Vidal Costa, as músicas armazenadas no computador estão “desencarnadas”| Foto: Felipe Rosa/ Gazeta do Povo
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Edições especiais

Selo Rhino pode relançar obras brasileiras

Discos do a-ha na coleção Original Album SeriesCaixa dos Smiths por US$ 499 no exteriorOnze Sambas e uma Capoeira, de Paulo Vanzolini

Inspirada nas edições que passaram a ser produzidas pela Rhino nos Estados Unidos e na Inglaterra, a Warner Music Brasil planeja relançar artistas brasileiros pelo selo americano no futuro. Por enquanto, a empresa já trouxe para cá cerca de 50 CDs lançados pela série Original Album Series no exterior. A coleção reúne cinco discos de artistas consagrados em um box que traz réplicas das embalagens dos vinis. Chegaram recentemente às lojas caixas do Simply Red, a-ha, Al Jarreau, Faith no More, The Corrs, John Coltrane, Ornete Coleman, Herbie Mann e Tom Jobim (Preço médio: R$ 64,90).

Enquanto isso, a Microservice continua reeditando o catálogo da Copacabana Discos, e acaba de relançar o Onze Sambas e uma Capoeira, de Paulo Vanzolini, originalmente da também extinta e famosa gravadora Marcus Pereira Discos (Preço médio: R$ 19,90).

Grandes relançamentos internacionais também chegaram recentemente ao mercado: a discografia das bandas britânicas Queen e Pink Floyd foram reeditadas em novas masterizações. Também pela Rhino, foi lançado um box com toda a carreira do grupo The Smiths (Preço médio: US$ 499).

Interatividade

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O formato CD continua a caminho da obsolescência e é possível que os jovens consumidores de MP3 de hoje nunca se tornem adultos compradores de discos. A tendência não é novidade para ninguém, e pode levar à equivocada conclusão de que se trata de um mercado desimportante. Os discos físicos continuam sendo o formato preferido para muitos consumidores por uma série de atributos – e as gravadoras vêm dando atenção especial a eles para, talvez, recuperar parte do que foi perdido com o consumo de música on-line.

Um dos caminhos da indústria é o investimento em relançamentos de catálogo, caixas especiais, coletâneas, séries ou uma elaboração mais caprichada nas embalagens de lançamentos. "O mercado físico vai continuar a existir por algum tempo. Ninguém sabe quanto, mas as multinacionais e gravadoras estão tentando se reinventar", diz a gerente de produto da Microservice Sales And Distribution, Adriana Ramos – responsável por reedições e recuperações de acervo da extinta Copacabana Discos, de propriedade da EMI.

Mediação

Relançamentos aos moldes deste projeto são uma das ramificações da estratégia das empresas. A presença de "curadores", que organizam obras que estavam dispersas e recuperam materiais que estavam perdidos, também são emprestam relevância a este tipo de produto. É o caso de Rodrigo Faour e seus trabalhos com a Microservice e a Universal, por exemplo, ou de Charles Gavin e Marcelo Fróes, que estão envolvidos em projetos da Warner Music Brasil. "Quanto mais informação você tem, mais você precisa de mediadores", explica a professora do curso de Estudos de Mídia e Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (UFF) Simone Pereira de Sá, referindo-se à quantidade praticamente ilimitada de fontes para se conseguir música na internet. "Nesse caso, tem mais um mediador, alguém está fazendo o papel de curador", diz. "Isso sempre foi importante para a cultura da música e continua sendo".

Além do conteúdo, o próprio formato do CD ainda atrai muita gente. "O fã quer ter a discografia, um produto diferenciado, e busca pouco o produto pirata", diz a gerente de marketing estratégico da Warner Music Brasil, Elaine Medeiros. Naturalmente, isso se aplica principalmente ao público mais velho.

A gerente de marketing diz que o fato não se restringe apenas a CDs do chamado marketing estratégico – os relançamentos, que costumam ter uma tiragem de cerca de mil cópias na gravadora –, mas também aos novos títulos. "Tentamos buscar produtos mais relevantes da discografia, e acrescentamos encarte com toda a informação do artista, usando fotos novas, agregando algo mais. E também apostamos em novos nomes com material gráfico diferenciado, com o envolvimento de designers", diz.

Em contato constante com consumidores de CDs, o comerciante de discos Horácio De Bonis fala sobre este interesse. "Quem consome o disco original quer ter informações que o MP3 não tem. E ter a praticidade do CD: ter vários aparelhos em casa, passar para o computador, para o pen drive, ouvir no carro", diz. "Mas ele também não abre mão de ter capa, informações, letras de música", diz.

O próprio fato de o CD oferecer uma experiência mais completa o coloca em vantagem em relação ao consumo de música digital, que está acessível a todo mundo, conforme explica Simone. "Isso é importante para a legitimação do próprio produto", diz a professora, que aponta a disputa por legitimidade como um aspecto do consumo de música. "Mas aposto na materialidade como elemento importante da nossa fruição musical", diz.

"A música, em primeiro lugar, é escuta corporal. E tem também relação com as imagens, os elementos extramusicais, que têm a mesma importância. A capa, o projeto gráfico, as roupas que o músico está usando – tudo faz parte da cultura da música", diz a professora.

Um exemplo extremo, que pode deixar a questão mais clara, é o dos colecionadores. O historiador Vidal Costa, que tem uma coleção de cerca de 3 mil discos, explica que o MP3 não tem atrativos para eles. "Não andamos por aí ouvindo música. Não temos esse tipo de interesse. O que nos interessa é ter coleção e informação relativa à música", diz Costa. Para ele, a música digital é "uma desagregação do objeto perceptível". "Posso baixar em alta qualidade. Vou ter essas bandas enfiadas no computador. Mas elas estão descarnadas, despidas do seu objeto, jogadas no éter. Você não tem contato com o objeto, com a fita cassete – outro barato do colecionador. Ali no computador você tem bits", diz.

Nicho

Costa explica que o CD é ainda mais interessante que o vinil, por exemplo, que teve uma recente retomada no mercado. "Não é uma questão especifica de formato pra mim. É uma questão de conteúdo. O CD possibilitou coisas que não existiam antes. Chegou num momento que era possível importar coisas e é uma mídia mais barata de ser produzida", explica o colecionador, para quem o disco de plástico, mais barato que o bolachão, deu acesso a um rico acervo que era difícil de ser encontrado. "É muito mais valioso ter acesso à obra poética completa do Bob Dylan do que um único disco de vinil restaurado", diz.

No entanto, é difícil prever se o CD poderia seguir o mesmo caminho do vinil e se tornar um nicho. Para Simone, o formato ficou "no meio do caminho": tem algumas características do vinil, mas é pior que ele em atrativos materiais. Por outro lado, é pior que o MP3 porque não tem tanta portabilidade. "Mas é possível", conjectura a pesquisadora. "Esses dias eu ouvi um pessoal ouvindo fita cassete no ônibus. Então, tudo é possível."

Leia o perfil do produtor Rodrigo Faour, especializado em reedições e relançamentos da música brasileira, clicando AQUI.

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