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Ser de direita no Brasil do início do século 21 é fácil. Afinal, recente pesquisa do Instituto Datafolha revela que pelo menos metade dos eleitores brasileiros agora se classificam ideologicamente assim.

Já há candidatos que usam explicitamente a qualificação como chamariz para atrair votos. Quase todas as revistas e jornais – não apenas os tradicionais baluartes do conservadorismo – têm agora seus colunistas desavergonhadamente "de direita". Nem sempre foi assim. No rescaldo dos anos do regime militar, não ser "de esquerda" era quase um pecado. "Direitista" era ofensa. Mesmo os partidos políticos mais claramente conservadores tentavam disfarçar sua doutrina. Na eleição presidencial de 2002, todos os candidatos tentavam parecer esquerdistas.

Onda neodireitista

Olavo de Carvalho não faz parte desta onda neodireitista, que tem crescido nos últimos quatro anos, com a guinada antiesquerdista do governo Lula e do PT, a vitória do "não" no referendo das armas (63% dos votos válidos contra 36%) e os dados do Datafolha de agosto deste ano (79% contra a descriminalização da maconha, 63% contra a descriminalização do aborto, 84% pela redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos, 51% favoráveis à instituição da pena de morte). Não. O filósofo paulista, que hoje reside nos Estados Unidos, há muito tempo defende posições que atualmente não causam constrangimento a ninguém, mas que há dez ou 15 anos eram capazes de estigmatizar socialmente – pelo menos nos melhores círculos – quem as sustentasse.

Querelas com intelectuais

Seu livro mais conhecido, O Imbecil Coletivo I, está completando dez anos e acaba de ganhar mais uma reedição. Trata-se de uma coletânea de artigos em que o autor trata de variados aspectos da vida cultural e política contemporâneos. Temas que vão do papel da homossexualidade ao papel social da imprensa, das universidades à função do intelectual.

Destacam-se diversas querelas entre ele e outros atores da inteligência nacional, como Emir Sader (professor de sociologia da USP e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro). Índices onosmático e de assuntos ajudariam a tornar a obra mais fácil de consultar.

Ele é típico da produção de Carvalho: volumoso, denso, idiossincrático, erudito, bem-humorado e provocador. O autor é o polemista clássico, da linhagem de Karl Kraus, H.L. Mencken e, no nosso país, Paulo Francis, José Guilherme Merquior, Nelson Rodrigues, Glauber Rocha e Hélio Fernandes.

Oxigenando o debate

O polemista tira e dá prazer com a sua coragem de desafiar o discurso rotineiro e comportado. Com radicalismo não vexado, expõe-se aos ataques e os devolve. Quando é bem feito, como é o de Carvalho, ajuda a oxigenar o debate público de idéias, revigora o pensamento, estimula a reflexão. É difícil concordar com a maioria das teses e proposições de Carvalho. Mas, provavelmente, não é esse mesmo o seu objetivo. O que ele pretende deve ser "criar caso". E, quando o caso se desenvolve com gente de estatura similar, o leitor é quem ganha.

Quem se der ao trabalho de ler pelo menos alguns dos artigos que compõem O Imbecil Coletivo I despido de preconceitos no mínimo vai se divertir um pouco, no máximo questionar algumas de suas crenças arraigadas e trabalhar intelectualmente para reafirmá-las ou (quem sabe?) até refutá-las.

Este resenhista não usou o formulário-padrão para a redação de críticas a O Imbecil Coletivo I que o livro traz na primeira folha, mas achou esta idéia uma das mais originais e engraçadas do trabalho.

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