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Cena de  MicMacs – Um Plano Complicado: estilo de Jeunet permanece  intacto | Divulgação
Cena de MicMacs – Um Plano Complicado: estilo de Jeunet permanece intacto| Foto: Divulgação

São cerca de dez minutos, os primeiros do filme, mas eles bastam para que o diretor francês Jean-Pierre Jeunet nos introduza, de forma encantadora, em seu novo longa metragem: MicMacs – Um Plano Complicado, apresentado na 34.ª Mostra de Cinema de São Paulo.

O azarado Bazil (Danny Boon) perdeu o pai na guerra, vítima de uma mina terrestre que explodiu no Marrocos. Trabalhando em uma videolocadora, o rapaz de boa índole foi vítima de uma bala perdida, que se alojou em sua cabeça. E agora, desempregado e sem perspectivas, quer se vingar das duas gigantescas companhias que fabricaram as armas.

O diretor de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001) e de Ladrão de Sonhos (1995) talvez seja um dos cineastas vivos que mais preservam sua originalidade e sua maneira de ver e fazer cinema. Então, a verve fantástica novamente parece em sua obra quando Bazil encontra uma trupe de indivíduos acolhedores com talentos surpreendentes. São eles que o ajudarão a tentar destruir o império dos dois empresários, ricos e ostentadores.

O grupo mora em uma espécie de caverna, construída em um ferro-velho até que bem ajeitadinho. Um dos personagens é capaz de calcular tudo a qualquer hora; outro é contorcionista; há um construtor de engenhocas; e um homem-bala recordista mundial, representado por Dominique Pinon, ator-fetiche do diretor.

A essa altura a fantasia já está construída. O clima sugerido, valorizado pela fotografia e pelas cores excepcionais, é algo como um circo dentro de um sonho. Ou o contrário. Então, com muita criatividade, a trupe começa a arruinar a vida dos seus poderosos inimigos.

Os golpes são certeiros. O fabricante de munição é um colecionador de carros antigos. Solitário, tem carinho especial pelos veículos. Mas, em uma manh㠖 depois de uma noite inteira de trabalho do grupo de Bazil –, só vê carros enferrujados no pátio. São os carros do ferro-velho.

O outro sujeito, o fabricante de minas, é colecionador de bizarrices valiosas. Com ele estão um dente molar de Marilyn Monroe e as unhas de Winston Churchill, entre outros mimos. Eis que a coleção desaparece, da noite para o dia. A ideia de Bazil – o plano complicado – é colocar um contra o outro. Funciona. Os dois grandes empresários começam a trocar farpas e iniciam uma guerra particular.

No filme, há momentos magistrais. Em uma curta e genial cena, Jean Pierre revisita sua própria obra com muito bom gosto quando Bazil ouve, por meio de um aparelho improvisado, o que se passa no apartamento abaixo: uma violoncelista e o ator Dominique Pinon, tocando uma espécie de theremin, fazem música, recriando uma cena de Delicatessen (1991), primeiro longa do diretor.

Momentos especiais são também os insights que Bazil tem devido à bala que está alojada em sua cabeça. Em um deles, o personagem imagina como seria se, em uma partida de futebol, minas terrestres estivessem enterradas pelo campo.

Apesar da fachada lúdica, o diretor aperta os cintos da viagem que propõe no fim do filme, quando finalmente Bazil consegue render os dois fabricantes de armas. Em um deserto "improvisado", há uma cena que mais parece saída do seriado Os Trapalhões. Mas, ao ver fotos reais e marcantes nas mãos dos "árabes", colocamos o pé no chão. Jean-Pierre Jeunet usa suas próprias armas – a magia e o bom-humor – para dar tapas de luva na in­­dústria bélica.

O jornalista viajou a convite da 34ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

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