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Cena do filme "Tropa de Elite 2" | Divulgação
Cena do filme "Tropa de Elite 2"| Foto: Divulgação

Os inimigos do Capitão Nascimento agora usam black tie. Também passa a vestir terno e gravata o próprio policial interpretado pelo ator Wagner Moura em "Tropa de elite" (2007), cuja sequência tem première nesta terça-feira (5), em Paulínia, no interior paulista, e entra em cartaz em 600 salas do país na próxima sexta (8).

Sem especificar o cargo burocrático que o promovido "Coronel Nascimento" ocupará na áerea da segurança pública – "Tropa de elite 2" tem um salto de 15 anos em relação a trama original –, o diretor José Padilha garante que o personagem continua o mesmo dos tempos de comandante do Bope. O que deve ser entendido como truculento, cruelmente debochado e que usa métodos questionáveis no combate ao crime.

"O Nascimento é o mesmo cara, não deturpamos sua lógica", explica Padilha. "Agora ele está mais maduro, é pai de um adolescente e sua forma de trabalho mudou. O Nascimento não está dentro de uma equipe da polícia, mas no processo decisório, que é contaminado por outros interesses. Ele descobre ali que nem sempre as decisões são técnicas, muitas vezes são políticas".

O fato de Nascimento deixar de invadir morros e circular por gabinetes também não fez com que "Tropa de elite 2" tivesse menos cenas de ação – o que seria uma decepção para os fãs do primeiro filme, que é recheado de sequências sanguinárias quando o protagonista sai para o confronto direto com a bandidagem.

"O 007 não usa a farda do exército inglês, mas dá tiro pra caramba", compara o diretor, que repetiu em "Tropa 2" a parceria com a equipe do longa "Falcão negro em perigo" (2001) na concepção de planos que envolvem helicópteros, explosões e operações espetaculares de tomada de favelas e presídios.

"A galera veio amarradona de Los Angeles fazer a continuação do 'Tropa'. Filmamos muitas cenas de ação, há duas de megainvasões. A sequência de Bangu 1 talvez seja a melhor que já filmei na minha vida", orgulha-se o cineasta.

Dom Corleone

Além do agente 007, o diretor também cita o mafioso Dom Corleone ao teorizar sobre sucesso de Nascimento. Padilha não concorda com a ideia de que parte do público – em especial o "povão" e os conservadores – considere o policial do Bope como o mocinho da saga.

"É importante distinguir a diferença entre herói e ícone pop. E o Nascimento não é um herói", pondera. "Por exemplo: o Dom Corleone. É um personagem carismático, de apelo popular, embora seja um mafioso assassino. Em outras culturas há milhões de ícones pops violentos e com a moral torta. É um fenômeno esporádico que acontece no cinema".

Mesmo tipo de apelo tem o Capitão Fábio (Milhem Cortaz), o policial corrupto e boa praça apresentado no primeiro "Tropa", também está de volta com a promessa de renovar bordões como "pede pra sair", "missão dada é missão cumprida" ou "faca na caveira".

"O Milhem e o Wagner são caras bons nessa coisa de lançar bordão. Eu não amarrei essas expressões no roteiro, foram eles que as incluíram depois do laboratório com o Bope", revela Padilha. "'Tropa 2' certamente terá novos bordões. Eu já tenho meus favoritos, mas prefiro não falar para deixar o público eleger os seus".

Direitos humanos e milícias

Além de jargões policiais inéditos, outra novidade de "Tropa de elite 2" é a figura do representante dos direitos humanos que questiona a tortura praticada pela polícia. Segundo Padilha, Fraga - papel do ator Irandhir Santos - foi inspirado na trajetória do deputado estadual do Rio de Janeiro Marcelo Freixo (PSOL), ativista que participou das negociações entre o Bope e os presos de Bangu 3 na megarrebelião de 2003.

"É o único personagem do filme baseado em alguém real. Todos os outros são ficcionais", garante o diretor, descartando que o traficante Fernandinho Beira-Mar tenha inspirado o bandidão Beirada (Seu Jorge), outra nova figura a infernizar Nascimento.

Mas o que Padilha espera ser a grande discussão de "Tropa 2" são as milícias, que no filme são representadas pelos personagens Fortunato (André Mattos) e Russo (Sandro Rocha). Para o cineasta, a forma como o poder paralelo nas favelas foi apresentado pela ficção até hoje "não existe".

Padilha cita como exemplo o Juvenal Antena, personagem de Antonio Fagundes na novela "Duas caras" (2007), do autor Aguinaldo Silva. "Aquela figura do paizão, que cuida da comunidade, é irreal. O 'Tropa' não compra essa ideia", explica. "As milícias são o crime organizado, elegem candidato. O tráfico, não", analisa.

'PT e PSDB amarelaram', diz diretor

Padilha acredita que com o novo filme conclui suas teorias sobre violência urbana, no que seria uma espécie de trilogia com "Ônibus 174" (2002) e "Tropa de elite". "Mas, se eu perceber que tenho mais algo a dizer, faço outro filme", diz.

Com as pesquisas sobre o tema, revela que chegou a certas conclusões que o fizeram, por exemplo, votar nulo nas eleições para presidente. "Os políticos tem medo da segurança pública. Não vi nesse debate eleitoral um programa realmente focado a resolver o problema", opina. "O PSDB amarelou. Durante todo o governo do Fernando Henrique, milhares de pessoas morreram e não foi só no Rio de Janeiro. O PT amarelou, também não fez nada".

O diretor vê nas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) - onde aconteceram boa parte das filmagens de "Tropa 2" -, um "comecinho de solução". Mas faz suas ressalvas. "Não basta exportar a violência. É preciso saber para onde os criminosos que estão sendo expulsos dessas comunidades estão migrando".

"Outra coisa: a velocidade de crescimento da UPP não é facilmente conciliável com o tamanho da polícia. São 1.700 favelas e 40 mil policiais na ativa", aponta. "Sei lá, talvez 20 mil deles fiquem no administrativo, servindo cafezinho... Sabia que há policiais fabricando xampu de jaborandi para vender nos batalhões? Certamente deve ter alguma corrupção nessa história...".

A descriminalização das drogas também não é a solução, segundo Padilha. "Não vejo motivos para que a maconha seja proibida. Mas sou contra a legalização do crack, da heroína e da cocaína", defende. "A maconha tem efeitos menos nocivos que o álcool. Você já ouviu falar de alguém que morreu por overdose de baseado? Seria bastante interessante que se liberasse a maconha, porque uma parte significativa do tráfico vem dela".

Educação, pirataria e mensalão

Desde o fim das filmagens de "Tropa 2", em março deste ano, Padilha já trabalha em quatro projetos paralelos. "Tenho dois roteiros sobre educação e pirataria. Serão dois filmes de ficção, mas são projetos que estão bem no começo".

Mais adiantados estão os roteiros de "Nunca antes na história desse país" - que vai abordar o escândalo do mensalão no governo Lula - e a adaptação do romance "Marching Powder: A true story of friedship, cocaine and South America's strangest jail", que traz as memórias do traficante Thomas McFadden, co-escritas por Rusty Young.

"É uma adaptação que quero dirigir para uma produtora americana", o diretor não confirma, mas a produtora seria a Plan B, do astro Brad Pitt.

As propostas de adaptar "Tropa de elite" para o cinema estrangeiro continuam. A maior dessas sondagens foi feita pela diretora Kathryn Bigelow, ganhadora do Oscar em 2010 por "Guerra ao terror", feita por intermédio do produtor Michael Shaefer, da Summit.

"Fico relutante com essas adaptações internacionais, porque lá eles não têm as favelas daqui e essa polícia maluca. Na época eu nem sabia quem era a Kathryn Bigelow, ela não tinha ganhado o Oscar ainda", relembra Padilha. "Se eu soubesse teria conversado com ela, teria sido muito legal. Pô, acho 'Guerra ao terror' um filmaço..."

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