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Biblioteca borgiana

A reedição da obra completa de Jorge Luis Borges pela Companhia das Letras começou este mês, com quatro títulos. Até 2010 serão lançados cerca de 35 titulos, em 23 volumes, em traduções novas (prosa) e consagradas (poesia):

Ficções (tradução de Davi Arriguci Jr., 176 págs, R$ 33) – Lançado originalmente em 1944, o livro reúne alguns dos mais conhecidos contos do escritor, como "Funes, o Memorioso", "Biblioteca de Babel", e "Pierre Menard, autor do Quixote".

O Livro dos Seres Imaginários (tradução de Heloisa Jahn, 224 págs., R$ 35) – Espécie de bestiário de seres fantásticos, o livro faz um inventário de seres fantásticos que povoam as mitologias e religiões do mundo.

Outras Inquisições (tradução de Davi Arriguci Jr., 232 págs., R$ 36) – Coletânea de ensaios e artigos publicados em revistas e jornais argentinos entre 1936 e 1952, o livro abrange alguns dos principais temas da escrita "borgiana", como misticismo, literatura e o infinito.

Primeira Poesia (tradução de Josely Vianna Baptista, 200 págs., R$ 35) – Reunião dos três primeiros livros de poesia de Borges, Primeira Poesia traz a influência que o escritor trouxe da vanguarda européia.

Muito antes de se tornar um dos nomes mais importantes da literatura latino-americana – e universal – Jorge Luis Borges foi um leitor. Não do tipo passivo, que simplesmente acompanha uma história. Borges conversava com seus livros. Como lembra o ensaísta Alberto Manguel, que durante a adolescência leu diversos livros para Borges (já sem enxergar por causa de uma doença genética), "ele interrompia, fazendo comentários sobre o texto a fim de (suponho) tomar notas em sua mente".

A obra completa dessa figura enigmática e labiríntica começa a ser relançada este mês pela Companhia das Letras. Quatro títulos já estão disponíveis: Primeira Poesia, que reúne os três primeiros livros de poesia do autor; O Livro dos Seres Imaginários; espécie de bestiário fantástico; a coletânea de ensaios Outras Inquisições; e os contos de Ficções. Ao todo serão 35 títulos reunidos em 28 volumes, que serão lançados até 2010.

Nascido em Buenos Aires, em 1899, o escritor foi primeiro alfabetizado em inglês pela avó paterna e, desde então, sempre nutriu grande fascínio pela literatura anglo-saxã, especialmente autores menos cultuados, como Rudyard Kipling (O Livro da Selva) e Stevenson (A Ilha do Tesouro). Apaixonado por livros, Borges acumulou ao longo da vida uma grande erudição, que fica evidente no jogo labiríntico de referências presente em seus escritos.

"Para ele, o sonho é ficção. O real é encarado por Borges como um emaranhado de sonhos. Seu estilo é sempre muito breve e objetivo, talvez por conta da doença que o deixou cego aos 55 anos. Isso fez com que passasse a ver as coisas de uma forma diferente, como se estivesse se lembrando delas", aponta Ivete Morosov, do Departamento de Letras da PUCPR.

Emaranhados de sonhos, labirintos e espelhos. A escrita de Borges é encarada por muitos leitores como um desafio. Cada conto, ensaio ou poema propõe uma espécie de jogo intelectual a ser decifrado. Esse talvez seja um dos motivos levou o escritor a ser considerado cerebral e "difícil".

Em um de seus contos mais conhecidos, "A Biblioteca de Babel", que faz parte do livro Ficções (1944), relançado esta semana, o autor constrói uma jornada metafísica para explicar a realidade como uma biblioteca sem fim, que abriga uma quantidade também infinita de livros, a maioria inúteis. Um dos bibliotecários, narrador do conto, explica que se supõem que cada volume contenha uma possibilidade de realidade, por isso a busca por alguém que consiga decifrar os volumes escritos em línguas desconhecidas.

"Borges parte de duas premissas: o caos no mundo e a irrealidade da literatura. Ele trabalha com uma constante troca entre ficção e realidade, ele recria o mundo. São essas mesclas, esses labirintos, que desafiam e, às vezes, confundem", explica Morosov.

O escritor derrubou as fronteiras dos gêneros literários, construindo contos que se aproximam de ensaios e preenchendo ficções com referências eruditas – muitas delas falsas, espécies de brincadeiras com o leitor. "Ele foi um revolucionário com respeito a linguagem literária. A linguagem era vista como um jogo, deixava o leitor sempre ativo", explica a professora Isabel Jasinski, da UFPR. "Através da linguagem, criou realidades imaginárias, em temas como o jogo, a memória, a reescrita da história e o mito".

Um leitor que interagia com seus livros e um escritor que exigia o mesmo de seus leitores. Borges influenciou toda uma geração de escritores, especialmente os ligados ao realismo fantástico dos anos 60, como Cortázar (com quem rompeu por divergências políticas), e Ernesto Sábato (O Túnel). Ainda hoje sua influência é sentida em escritores que buscar recriar a realidade, como seu conterrâneo César Aira (As Noites em Flores).

As reedições da Companhia das Letras contam com uma equipe consagrada de tradutores, como a paranaense Josely Vianna Baptista e Davi Arriguci Jr. Os próximos títulos a serem lançados serão O Aleph, O Fazedor e Atlas. A editora pretende lançar os títulos também em edição de bolso, ainda sem data definida. Uma forma de levar o universo do autor em pequenos formatos. Bem ao gosto de Borges.

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