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Maya Angelou sugere que você seja franco quando alguém perguntar: “Tudo bem?” | Robyn Beck/AFP
Maya Angelou sugere que você seja franco quando alguém perguntar: “Tudo bem?”| Foto: Robyn Beck/AFP

Maya Angelou tem uma história de vida que faria qualquer um parar e pensar. Pensar no quanto o ser humano é fantástico. A escritora de 82 anos, uma senhora respeitadíssima nos Estados Unidos e pouco lida no Brasil – seus livros estão fora de catálogo há anos –, cresceu com a avó, se tornou mãe solteira na adolescência, apanhou feio de um namorado problemático, estudou, viajou parte do mundo trabalhando como atriz e cantora e sempre amou a arte.

Parte dessa existência surpreendente é contada no seu livro mais importante, Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola (publicado no Brasil em 1996 pela José Olympio). Agora, a Nova Fronteira publica Carta a Minha Filha, uma espécie de balanço que a autora faz da própria vida.

É um livro curto que mistura memórias, poesia e até um discurso de formatura em versos. Ele fala com leveza de temas complicados, extrai pequenos episódios da própria vida que podem servir para os outros sem que isso pareça uma lição de alguém que fala de pé no tablado da experiência.

Pioneira

Maya foi a primeira mulher negra a trabalhar como motorista de ônibus em San Francisco, na Califórnia, aos 14 anos. Esse emprego seria o passo inicial numa jornada longa de luta por direitos civis que a colocou ao lado de Martin Luther King e Malcolm X. Não por acaso, ela é uma figura que inspira muitos afro-americanos, incluindo a apresentadora de tevê Oprah Winfrey, uma das mulheres mais poderosas dos EUA e do mundo. Doutora Maya Angelou é como as pessoas costumam se referir a ela.

Da poesia ao engajamento, muitos temas perpassam a Carta a Minha Filha. Mas o tom do livro é o de uma conversa de mãe. A escritora tem um filho, mas acabou encarnando o papel de mãe para muitas pessoas, de raças, cores e crenças diversas. A carta é então para todo mundo que quer saber um pouco sobre as coisas que Maya aprendeu com o tempo.

É confortante encontrar uma senhora octogenária que admite ter errado muito e diz que ainda deve errar mais antes de morrer. Ela consegue dizer verdades profundas e também lançar ideias singelas. "Tente ser um arco-íris na nuvem de alguém", diz a certa altura.

Num dos textos, ela lembra a vez que sua mãe, enquanto a acompanhava até o ponto do bonde número 22, disse: "Filha, andei pensando e agora tenho certeza. Você é a maior mulher que eu já conheci". Maya pensou que ela falava de sua altura, afinal era uma mulher de 1,80 metro, mas ela se referia ao fato de a filha ser muito gentil e muito inteligente. "E esses dois elementos nem sempre andam juntos."

Surpresa com o comentário da mãe, permitiu que o elogio a envolvesse por um instante. "Pensei: ‘E se ela tiver razão? Ela é muito inteligente e já disse muitas vezes que não tem medo de ninguém a ponto de mentir. E se eu realmente chegar a ser alguém? Imagine só", escreve Maya.

Embora possa encarnar a imagem de autossuficiência tão cara aos americanos – a da pessoa que parte do nada e conquista o sucesso sozinha –, Maya Angelou é um pouco diferente desses empreendedores que acumulam milhões ou erguem impérios econômicos. Sua conquista é mais humana, assim como seu legado.

Em outro texto, a escritora sugere a ousadia de, na próxima vez que ouvir a pergunta "Tudo bem?", você responda a verdade e diga o que está errado. "Bem, sinto como se meus joelhos estivessem quebrados, e minhas costas doem tanto que tenho vontade de desabar e chorar".

Seja sincera, porém se prepare para ser evitada porque poucas pessoas querem ser incomodadas com os problemas alheios. "Mas pense assim: se elas nos evitarem, teremos mais tempo para meditar e fazer uma boa pesquisa sobre a cura para o que realmente nos incomoda".

Serviço: Carta a Minha Filha, de Maya Angelou. Nova Fronteira, 120 págs., R$ 19,90.

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