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Neguette foi um guerreiro e quis continuar em campo mesmo machucado, mas técnico Lori Sandri não deixou | Antônio Costa / Gazeta do Povo
Neguette foi um guerreiro e quis continuar em campo mesmo machucado, mas técnico Lori Sandri não deixou| Foto: Antônio Costa / Gazeta do Povo

A arquitetura é mais que um abrigo físico. É também refúgio psicológico e guardiã da identidade de seus habitantes. Convencido de que "somos pessoas diferentes em lugares diferentes" e, portanto, à arquitetura cabe nos lembrar de quem poderíamos ser, o filósofo suíço Alain de Botton fez de seu livro A Arquitetura da Felicidade, recém-lançado pela Rocco (272 págs., R$ 42), uma reflexão sobre a volátil noção de beleza a partir de um ponto de vista emocional.

"Sentir uma sensação de beleza é sinal de que encontramos uma expressão material de certas idéias que temos do que seja viver bem", define o autor de As Consolações da Filosofia e O Desejo de Status, entre outros títulos. A beleza arquitetônica vem, portanto, dessa promessa de felicidade que cada edificação – com sua fachada mais despojada ou aristocrática, a decoração em tons alegres ou sóbrios, linhas retas, curvas ou adornadas – pode suscitar. Arquitetura é, enfim, capaz de sugerir distintos "estados de alma".

Ao se sentir atraído pela beleza de um espaço construído, o que sucede, na opinião de Botton, é o desejo de parecer-se com o que se vê. Pensando nisso, o filósofo propõe a arquitetura como um recurso para equilibrar a personalidade e a rotina de quem habita um lugar. Uma questão de contraste: escolher para a construção as características em que se é deficiente. O minimalismo e o rústico seriam os dois grandes estilos atuais por esse critério. Fornecem a calma e o contato com a natureza que a vida (pós)moderna esqueceu.

A determinação psicólogica na arquitetura não é uma idéia exclusiva do filósofo francês. Como ele, Emerson Vidigal, mestre em Arquitetura e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Centro Universitário Positivo (UnicenP), identifica o prazer visual como um fator que tem forte relação com a felicidade. Se, por um lado, o contato com um ambiente agradável proporciona alívio ao cotidiano, do outro, a poluição visual é capaz de gerar mais estresse. A arquitetura "altera o humor", resume o professor.

Esse poder, é claro, pode e deve ser usado à favor de quem habita um lugar. "O arquiteto pode auxiliar o cliente a estabelecer qual é o padrão estético comum aos dois. E ele tem o papel de explicar ao cliente de que maneira esse espaço trará efeitos psicológicos à família que vai viver naquela casa", opina Vidigal.

A tarefa, muitas vezes, é de convencimento. "Há casos em que o cliente busca um ambiente que não corresponde aos seus hábitos de vida, exigindo dele sacrifícios que não está preparado para fazer", afirma o arquiteto curitibano Alfred Willer.

É o caso de salas de estar decoradas com abundância e luxo, mas que não se adaptam aos costumes diários do proprietário e acabam sem função na casa.

A afinidade do habitante com o espaço ao seu redor é decisiva para a sensação de conforto e de alegria que o ambiente pode provocar, na opinião do arquiteto Manoel Coelho.

"O arquiteto deve respeitar as características emocionais e culturais da família e os seus hábitos. Tudo isso deve ser levado em conta para tornar os espaços adequados para os vários momentos, nas áreas de convivência e nas áreas íntimas. Quanto melhor o arquiteto entender isso, maior será a felicidade da família", opina.

Nem sempre é o que acontece. Um dos motivos é que a casa sonhada seria algo difícil de materializar. "Não é somente um objeto arquitetônico concreto, é memória de fatos vividos, espaços, sensações", diz a coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPR, Josilena Gonçalves.

Outro é que, muitas vezes, o temperamento e o estilo de vida dos habitantes é tomado menos em consideração do que modismos e desejos de status.

A pouca familiaridade de alguns profissionais com os aspectos subjetivos a serem levados em conta em uma construção também surge como empecilho. "Falta tentar enxergar o ser humano de maneira mais ampla", opina Emerson Vidigal. "Os arquitetos não estão preparados – do ponto de vista das ciências humanas – para pensar o que é viver nos espaços hoje".

Aí está um grande problema. Afinal, a arquitetura deve refletir o seu lugar e o seu tempo. Mas, quando a qualidade de vida é algo tão desejado quanto distante, como acontece na rotina moderna, a falta de qualidade arquitetônica se torna uma queixa mais constante. É um dos males da arquitetura brasileira em geral praticada hoje, na opinião de Manoel Coelho, para quem a crise abala arquitetos e projetos. "A arquitetura brasileira é também conseqüência do momento social, econômico e político", diz.

Embora os arquitetos não tenham poder para resolver os problemas sociais, Vidigal acredita que eles podem colaborar ao menos para melhorar os espaços onde o homem vive – e a influência psicológica destes nos habitantes. "A gente (arquitetos) consegue conceber uma casa como uma ilha de segurança para que o proprietário saia do estresse para sua ilha de conforto. Mas ela não é suficiente diante da correria da vida. Sozinha, não dá conta", diz.

A opinião é coerente com a de Alain de Botton. A beleza arquitetônica está longe de ser uma garantia de felicidade ou ainda de melhora da personalidade de quem a contempla. Isso porque a arquitetura apenas sugere. Não impõe.

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