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O menino branco e o menino negro; o lado de dentro e o de fora; a grade e a realidade que os separam. No curta Menino do Cinco, de Wallace Nogueira e Marcelo Matos de Oliveira, a oposição é a escolha dos diretores para contar uma história que permeia a sociedade brasileira. Contudo, a opção de crianças como protagonistas é intrigante. Ao apontar para a oposição social e racial, são crianças que exprimem, acima de tudo, sentimentos, sejam eles bons ou maus. O menino negro, da praça, é o desvalido. Ele tem companheiros (não aparece sua família) e se apega a um cachorro que parece ter, na rua, sua casa – como ele e os outros meninos. Este ponto em comum entre o cachorro e o menino é o que mais os aproxima. O menino branco, de apartamento, é o acumulador. A figura distante, porém conivente, do pai é a ponte entre tudo o que o menino quer e que sempre acaba conseguindo. O quarto cheio de brinquedos e o cachorro demonstram isso. O cachorro, centro do conflito, torna-se o novo desejo do menino. Sua postura acumuladora pode ser percebida quando ele simplesmente abandona o carrinho com controle remoto ao encontrar o cão – é o destino final deste. Se não fosse a janela, seria um novo brinquedo.

Temos, no menino branco, uma insinuação explícita de que esta separação de classe e de cor da pele se dá pelo sentimento de posse. Uns têm, outros não – e o pouco que estes têm aqueles o tomam. O suspense toma conta do enredo e, num determinado momento, o espectador já sabe que não há a possibilidade de um fim sem tragédia. A corda, neste caso, arrebenta para o mais fraco – o cachorro. É ele, o objeto da disputa da posse, que sofrerá as consequências que não são explicitadas pela câmera. Porém, esta tragédia antecipada que não vemos tira a impressão de que a parábola social tem alguma chance de ter um bom final. Entre pobres e ricos, brancos e negros, uma hora a corda vai se romper – o cachorro será jogado pela janela – e nenhum dos dois lados sairá vencedor.

Há, contudo, um preciosismo da direção no excesso de planos e sequências que constróem o personagem do menino branco. A suposta fuga de casa com o cachorro na mochila – um plano deslocado e sem continuidade dele num ponto de ônibus debaixo de temporal – e a sequência da birra por não poder ficar com o cachorro são exemplos que não agregam ao personagem nem à narrativa. O dinheiro, por outro lado, é introduzido de forma paralela, superficial, o que faz acentuar que a tensão se dá mesmo no plano dos sentimentos.

É uma parábola social que deixa a sensação de que esta disputa que vemos diariamente nos noticiários e nas ruas não terá um final feliz para nenhum dos lados. Parece, porém, que estamos no plano da porta, quando o menino negro invade o prédio e os dois são enquadrados pela câmera: o menino negro à esquerda, forçando a entrada, e o menino branco à direita, dentro, tentando impedi-lo. Resta saber qual será o cachorro dessa nossa história.

(Texto produzido durante a oficina de crítica cinematográfica da mostra Olhar de Cinema)

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