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São Paulo – A afirmação veemente em cada um dos parágrafos de Sayonara, Gangsters (Ediouro, R$ 39,90 ; 296 págs.) é a de que, sim, tanto a poesia como a "tal" literatura experimental podem ser divertidas. É o que mostra esse primeiro romance do escritor japonês Genichiro Takahashi lançado no Brasil, e não só isso, pois outros adjetivos surgirão conforme a leitura avançar: podem ser comoventes, excêntricas e também muito inusitadas.

Igualmente imprevisto é o fato de a edição brasileira ser a segunda tradução do livro, publicado em 1982 no Japão, agora vertido para o português por Jefferson J. Teixeira. E que não deve nada à primeira, traduzida por Michael Emmerich para o inglês em 2004, notadamente pela manutenção do humor trocadilhesco, além das corretas remissões a aspectos dos entrechos reverentes à cultura pop norte-americana, e ainda – e quase à beira da exaustão – à história da literatura. Sem nunca deixar de ser engraçado.

Não sobrevivendo apenas de referências, a história, ou melhor dizendo, as histórias, também primam pelo transbordamento imaginativo: num futuro onde pessoas são nomeadas pelos amantes e não por seus parentes, o protagonista Sayonara, Gangsters (assim batizado por sua namorada Song Book, de Miyuki Nakajima) dá aulas numa escola de poesia onde ninguém faz atividade alguma, a não ser conversar: "Eu não faço praticamente nada aqui. Podemos dizer que minha função é a de um controlador de tráfego", explica o professor.

Os alunos são tão engraçados quanto a idéia (acertada, diga-se) de a poesia como prática vã de estetização de uma realidade em constante transformação. Entre eles há uma "Coisa Incompreensível" que emite ruídos estranhos e muda de cor, um rapaz que paga o curso com picolés de baunilha, o poeta latino Virgílio metamorfoseado numa geladeira (os bacanais entre os poetas clássicos por ele narrados são hilários) e, claro, há os "gangsters". Os "gangsters" Calado, Baixinho, Gorducho e Bonitão são um bando de terroristas que apavora o mundo e que têm por hábito assassinar programaticamente presidentes norte-americanos. O 66.º deles, John Smith Jr., é morto no início do livro, com a cabeça explodida ao mascar um chiclete-bomba.

Chega um dia em que os "gangsters" decidem ter aulas de poesia. O que os leva a tal extremismo não deve ser revelado aqui, com sérios riscos de des-manchar o prazer do leitor. E a resenha poderia seguir assim, enumerando linhas narrativas presentes no romance de Takahashi, e não dizer o que nunca se evidencia, o fato de que o termo "experimental" é sempre usado pelos críticos como sinônimo de "chato". É fácil constatar como essa imposição soaria limitada diante de Sayonara, Gangsters, cujo parentesco é mais devedor do surrealismo irônico de Richard Brautigan e Kurt Von-negut do que de toda a ficção japonesa. "Ah, como a realidade pode ser chata diante da literatura", Takahashi parece dizer. E diz.

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