Estratégia de vida

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Quando deu um curso sobre jazz em Porto Alegre há dois anos, inspirado pelo centenário do gênero musical, Roberto Muggiati se surpreendeu. O formato do evento era o de três palestras de três horas cada uma. Todas contaram com um público que tomou conta do Espaço Cultural Santander, com idades entre 18 e 80 anos.

O tema, que poderia espantar aqueles que não são familiarizados com a música, demonstrou ter um poder de atração mesmo sobre quem não sabem a diferença entre o bebop e o free jazz (e não é preciso saber para gostar de música). De acordo com Muggiati, o estilo "é visceral, mexe com as emoções e inspira".

Disposto a mostrar que o jazz pode ser um modo de encarar o mundo, o jornalista curitibano escreveu Improvisando Soluções – O Jazz como Exemplo para Alcançar o Sucesso. Vivendo no Rio de Janeiro há mais de 40 anos, o autor de 71 anos está em Curitiba e lança o livro amanhã no Hermes Bar, acompanhado do trio Zero e Uns, da pianista Marília Giller – completam o grupo o baterista Fábio Charvet e o saxofonista Sérgio Monteiro.

Por Muggiati, o título seria "O jazz como estratégia de vida", mas a editora optou por tornar o invólucro de auto-ajuda mais evidente, talvez para atrair um público maior. Ainda assim, é fácil supor que o alvo são leitores que simpatizam com o jazz.

"É um exercício de mistificação. Eu uso o formato (da auto-ajuda) sem aderir a ele", explica Muggiati, que, hoje à noite, planeja rever um amigo de longa data se apresentar no Teatro Paiol, o trombonista Raul de Souza.

O "sucesso" a que se refere o título está longe da visão materialista que prega a necessidade de fama, dinheiro e poder, temas que orientam muitos livros de auto-ajuda. Para Muggiati, a meta a ser alcançada tem a ver com "satisfação espiritual, qualidade de vida, amor a si mesmo e aos outros, respeito à natureza e o prazer de fazer aquilo de que se gosta".

Com esse horizonte, Improvisando Soluções se divide em capítulos temáticos e cada um traz breves histórias sobre personalidades do jazz ligados ao assunto proposto. "Abraçando o Acaso" conta episódios da vida de Louis Armstrong, Miles Davis e Dizzy Gillespie para ilustrar a importância do acaso na vida e na arte. Foi por acaso que Armstrong criou o scat, o estilo vocal em que o cantor simula notas musicais com a voz – porque havia esquecido a letra de "Heebies Jeebies" no meio da gravação do disco, em 1926.

Os capítulos seguintes têm títulos pró-ativos como "Usando a Imaginação", "Superando Adversidades" e "Rompendo Barreiras", e falam de figuras que vão de Hermeto Pascoal a Bill Evans, de John Coltrane a Bix Beiderbecke e de João Gilberto a Benny Goodman.

Além de ignorar os conceitos materialistas de sucesso, Muggiati também evita uma fórmula clássica da auto-ajuda, a que organiza as idéias em fórmulas e listas. Algo na linha de "dez passos para se tornar um executivo de sucesso", "sete coisas que você precisa saber sobre liderança" etc.

No desfecho do livro, o autor entrega um de seus melhores momentos: um capítulo autobiográfico em que conta como, nas suas palavras, o jazz salvou a sua vida. Nesse ponto, lembra também das apresentações que viu (Coltrane entre elas) e dos artistas que conheceu (Chet Baker entre eles). Desiludido do amor e disposto a se afogar no rio Sena, em Paris, Muggiati foi salvo pela melodia de "Round About Midnight", de Thelonius Monk, tocada por um sax-tenorista da vizinhança. Embalado pela música, desistiu de se suicidar e foi comer uma travessa de ostras com vinho branco.

Livro de auto-ajuda, Improvisando Soluções funciona também como uma compilação ótima de anedotas sobre jazz.

Serviço

Lançamento do livro Improvisando Soluções – O Jazz como Exemplo para Alcançar o Sucesso, de Roberto Muggiati. Best Seller, 304 págs., R$ 24,90. Hermes Bar (Av. Iguaçu, 2.504 – Água Verde), (41) 3018-9320. Amanhã (dia 5), às 19 horas.

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"Esse exercício de espontaneidade e liberdade (do jazz) é a razão de ser deste livro, em que procuro passar adiante as lições que aprendi ao longo de quase sessenta anos ouvindo jazz sem preconceitos: jazz de todos os tipos, de todas as escolas, de todas as épocas. A tal ponto que apliquei à minha própria vida (...) os ritmos do jazz, sua agilidade mental, sua propensão a abraçar o acaso."

Trecho de Improvisando Soluções, de Roberto Muggiati.