• Carregando...
Scott Hutchins: estreia ambiciosa aos 39 anos | Divulgação
Scott Hutchins: estreia ambiciosa aos 39 anos| Foto: Divulgação

Romance

Uma Teoria Provisória do Amor

Scott Hutchins. Tradução de José Geraldo Couto. Companhia das Letras, 424 págs., R$ 47,60.

Lá pela página 40 de Uma Teoria Provisória do Amor, romance de estreia do norte-americano Scott Hutchins, é inevitável suspeitar que toda a ambição criativa do autor, professor de Literatura da Universidade de Stanford, não será suficiente para dar conta do que ele pretende fazer com sua história mirabolante. Vai aqui um conselho: não desista da leitura.

O protagonista do livro, Neill Bassett Jr., é um ex-redator de publicidade de seus 30 e tantos anos. Ele está diante de uma crise existencial que, se ainda não o levou ao fundo do poço, dá sinais de que pode desembestar a qualquer momento.

Divorciado, sem grandes feitos profissionais no currículo e uma morosa vida social, Neill, embora não admita, vive à sombra de uma tragédia: quando tinha 20 anos, seu pai, um médico e pesquisador reconhecido de quem não era muito próximo, cometeu suicídio.

A possibilidade de fazer algo relevante na vida surge quando, apesar de não ter estudado informática, o publicitário é convidado a participar do arrojado projeto que pretende apresentar ao mundo o primeiro computador inteligente da história. A proposta vem da modesta Amiante Systems, empresa fundada e comandada pelo genial pioneiro da computação Henry Livorno, hoje esquecido.

Para ganhar subjetividade, a máquina será alimentada com as milhares de páginas do diário escrito década a fio pelo pai de Neill. O projeto parece fadado ao fracasso.

À medida em que o experimento avança, e a inteligência artificial vai ganhando não apenas as reminiscências, mas dicção e, talvez, a personalidade do médico. O rapaz então se vê diante do que julgava ser impossível: não apenas compreender os caminhos que levaram Bassett a tirar a própria vida, mas também, e principalmente, estabelecer com o pai uma relação que nunca existiu no mundo material.

Hutchins intercala capítulos nos quais se discute os meandros tecnológicos que permitirão essa espécie de ressurreição e os tropeços existenciais de Neill. Solitário, ele vive uma vida em preto e branco em São Francisco, uma cidade que esbanja colorido e com a qual ele parece estar em permanente dissonância.

Ainda às voltas com sua relação mal resolvida com a ex-mulher, Erin, ele começa a se relacionar com Rachel, uma jovem de 20 anos um tanto perdida que também deseja um recomeço.

Gera estranhamento o contraste entre a aridez do discurso (pretensamente) tecnológico, presente nos capítulos que buscam explicar o percurso de criação da inteligência artificial, e as partes da narrativa que falam da vida cotidiana e dos percalços emocionais de Neill. Aos poucos, no entanto, essas duas instâncias vão se fundindo no que parece ser um mergulho psicanalítico. Daí, o que se torna penoso é largar o livro, que anuncia o surgimento de um escritor a ser acompanhado com atenção.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]