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Há, basicamente, dois tipos de eutanásia. No primeiro, a família de um doente terminal inconsciente decide poupá-lo da condição vegetativa. É o caso recente da norte-americana Terry Schiavo, cujo marido entrou na Justiça para conseguir o direito de interromper sua vida – e acabou batendo de frente com os sogros, radicalmente contra o procedimento. No segundo, é o próprio paciente que escolhe morrer, sob a alegação de que não suporta mais o sofrimento imposto pela enfermidade.

Para muitos, este último exemplo equivale ao suicídio, e por isso deve ser analisado em uma esfera ética e jurídica que não passa necessariamente por questões médicas. O debate, complexo, é o tema central de Mar Adentro, premiada produção espanhola recém-chegada às locadoras.

Dirigido por Alejandro Amenábar (Os Outros, Preso na Escuridão), o filme é baseado em Cartas do Inferno, biografia do espanhol Ramón Sampedro. Tetraplégico desde os 25 anos, quando bateu a cabeça ao mergulhar na praia, ele escreveu o livro para tentar convencer a sociedade de que tinha o direito de morrer. Queria ajuda para abreviar sua vida, mas, de acordo com as leis espanholas, quem colaborasse poderia ser condenado por homicídio. Em 1998, aos 45 anos, após ter seu pedido negado pelos tribunais, Ramón bebeu uma dose letal de cianureto e finalmente morreu. Contou com o auxílio de uma amiga, identificada – e absolvida – há pouco tempo.

À primeira vista, a transposição da história para o cinema só poderia render um dramalhão pesado e lacrimejante. Mas, pelas mãos de Alejandro Amenábar, um dos realizadores mais criativos da nova geração, a saga de Sampedro (vivido pelo ator Javier Bardem) é contada como uma fascinante viagem interior. Diretor, produtor, co-roteirista e compositor da trilha sonora, Amenábar soube driblar uma das principais questões da filmagem: como tornar interessante um longa sobre um sujeito que está deitado há 20 anos?

A resposta está nos outros personagens, decisivos para a condução da trama. Da cunhada devotada à operária que conheceu Ramón pela tevê e se apaixonou por ele, os coadjuvantes só pensam e falam sobre o protagonista – e acabam o "levando" para todos os lugares.

Fã confesso de Steven Spielberg, mas também de Alfred Hitchcock e Stanley Kubrick, Amenábar conseguiu equilibrar suas influências e fez um filme que nunca resvala na pieguice. Nesse ponto, também é preciso destacar o convincente trabalho de Javier Bardem, conhecido por títulos como Carne Trêmula, Segunda-feira ao Sol e Antes do Anoitecer. Se houve uma injustiça no Oscar deste ano, foi sua não-indicação ao prêmio de melhor ator.

Por outro lado, o Ramón de Bardem é tão carismático e inteligente que, em alguns momentos, o espectador se esquece da eutanásia e embarca em uma lição de vida. E aí reside o único, porém considerável, ponto fraco de Mar Adentro. Ao se concentrar na aura especial do protagonista, o longa deixa de lado seu pesadelo cotidiano. Dessa forma, fica difícil entender e concordar com sua causa. Faltou o lado sombrio da história. GGG1/2

Prêmios

Oscar – melhor filme estrangeiro.

Globo de Ouro – melhor filme estrangeiro.

Festival de Veneza – Grande Prêmio do Júri e Volpi Cup de melhor ator (Bardem).

14 prêmios GoyA - filme, diretor, ator, atriz, ator e atriz coadjuvante, maquiagem, fotografia, trilha sonora, direção de arte, roteiro original, som, revelação masculina e feminina.

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