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Uma farsa perpetrada por décadas que, mesmo desmascarada, continua a impressionar e conquistar novos adeptos. O suposto plano de dominação do mundo ocidental pelos judeus é investigado a fundo pelo quadrinista Will Eisner (1917 – 2005) em sua derradeira obra: O Complô – A História Secreta dos Protocolos dos Sábios do Sião (Tradução de André Conti, 160 págs., R$ 36), um dos lançamentos da Companhia da Letras que marca seus 20 anos no mercado brasileiro – por conta disso, o livro ganha uma caprichada edição, com direito a capa dura.

Vinte anos também foi o tempo investido por Eisner – um dos maiores quadrinistas de todos os tempos, criador do personagem Spirit e responsável pela invenção do gênero graphic novel, que tornou os quadrinhos respeitados como forma de arte – na produção de O Complô, que envolve pesquisa histórica e jornalismo.

O leitor toma conhecimento que Os Protocolos do Sábios do Sião foi criado no fim do século 19, totalmente copiado de um livro chamado O Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu, escrito em 1864 pelo francês Maurice Joly como uma crítica ao déspota Napoleão III (sobrinho de Napoleão Bonaparte, que primeiro foi eleito presidente e depois de um golpe de estado, tornando-se imperador).

O texto – que falava contra a tirania – foi adaptado por Mathieu Golovinski, um funcionário do governo russo. Publicado pela primeira vez em 1905 como uma obra sionista, foi usado para convencer o czar Nicolau II de que havia uma conspiração judaica para derrubá-lo do poder.

Coincidentemente, alguns anos antes, houve um congresso mundial de sionistas na Europa, mas para discutir a criação de um estado judeu.

O plágio da obra foi descoberto e revelado em 1921 por um repórter do jornal inglês The Times – Eisner dedica várias páginas de O Complô para comparar o original de Joly e Os Protocolos, mostrando as adaptações. Mas mesmo assim o livro continuou servindo como propaganda anti-semita, uma forma de atacar os judeus, que se transformaram em bodes expiatórios de várias ditaduras e governos totalitários – basta lembrar que Hitler escreveu Minha Luta, base de seu ideário nazista, tendo como inspiração a leitura do malfadado texto.

Nas páginas de O Complô, Eisner – que até se torna personagem do próprio livro, mostrando como fez suas investigações – expõe toda a sua perplexidade com a contínua utilização dos Protocolos, apesar de todos os fa-tos contrários – a mentira que, de tanto ser contada, se transforma em verdade. "Apesar de tais revelações, os Protocolos continuam ganhando mais exposição e credibilidade. Eles são publicados em todo o mundo árabe, e em muitos outros países europeus e asiáticos", lembra no prefácio do livro, que tem introdução do escritor Umberto Eco. "Como se pode explicar a resistência contra todas as provas e o perverso apelo que esse livro continua a exercer? ...não são os Protocolos que geram anti-semitismo; é a profunda necessidade das pessoas de isolar um Inimigo que as leva a acreditar nos Protocolos", analisa o autor de O Nome da Rosa.

Ainda na abertura, Eisner revela os motivos de ter escrito o livro na linguagem dos quadrinhos: "Com a crescente aceitação da narrativa em quadrinhos como veículo de literatura popular, existe agora a possibilidade de lidar de frente com essa propaganda numa linguagem mais acessível. É meu desejo que, talvez, este trabalho fixe outro prego no caixão dessa fraude tenebrosa e vampiresca".

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