• Carregando...
Vídeo | TV Paranaense
Vídeo| Foto: TV Paranaense

Entre o cômico e o trágico

Outras peças "curitibocas" mereceram destaque de público e crítica. Os Bobos de Shakespeare, monólogo dirigido por Laércio Ruffa e interpretado por Thadeu Perrone, recebeu o prêmio Gralha Azul de melhor maquiagem, para Maura Cristina.

Mas, o rosto pintado dos vários bobos pinçados por Edson Bueno na obra de Shakespeare não teria o efeito esperado sem a atuação elogiada de Peronne. Ele multiplica-se no palco, interpretando desde o clown ao arlequim da commedia dell’arte. A aventura teatral exigiu uma extensa pesquisa do ator, que teve aulas de corpo, mímica e preparação vocal.

Antígona – Reduzida e Ampliada, da Cia. Senhas, foi valorizada pela leitura ousada da obra de Sófocles para refletir a civilização contemporânea. Coordenados pela diretora Sueli Araújo, o grupo criou uma versão própria da tragédia de Sófocles, escrita há mais de dois mil anos. A tragédia de Antígona é trazida para os dias atuais, para falar da guerra a partir de pontos de vista femininos.

A peça amadureceu ao longo de noves meses de preparação. Parte do processo foi apresentado antes mesmo da estréia, em dezembro passado. A reação do público em determinadas cenas contribuiu para a conclusão da montagem.

O Fringe, mostra paralela do Festival de Teatro de Curitiba, está maior a cada nova edição. Este ano, conseguiu reunir 180 peças de todo o Brasil – sendo duas do exterior. Mas, o sotaque "leite quente" sobrepôs-se aos demais: 108 peças eram de Curitiba contra menos de 5% originárias das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Dentre as curitibanas, muito mais da metade são comédias ligeiras e comerciais com título de livros de auto-ajuda como O Que As Mulheres Pensam sobre Sexo e Por que os Homens Transam e as Mulheres Fazem Amor, algumas delas há muitas edições no Fringe.

Mas, as salas repletas e a boa repercussão da crítica especializada comprovaram que o público soube identificar em meio a um emaranhado de montagens tão díspares – e, por vezes, disparatadas – produções locais de qualidade.

A diretora Nadja Naira mal deu conta de acompanhar todos os comentários publicados na imprensa sobre Os Leões, seu espetáculo de estréia na função. A peça caiu nas graças de críticos de todo o país, que a consideraram a mais significativa do Fringe. "Os jornalistas vieram assisti-la logo na primeira semana do Festival e, por isso, tiveram tempo de repercutir o que viram. Tivemos sorte", conta a diretora.

Mas, não foi só sorte que favoreceu tamanha repercussão. O prestígio deveu-se a uma junção de acertos da jovem companhia A Armadilha, encabeçada pelo ator Diego Fortes, que junto com Alexandre Nero forma a dupla de personagens solitários, obrigados a conviver um com o outro. Ele descobriu o texto do espanhol Pablo Miguel de la Vega y Mendoza, decidiu adaptá-lo e surpreendeu Nadja Naira com o convite para dirigi-lo como ator.

Foi uma grata surpresa para quem já era dona de uma fértil trajetória como iluminadora e atriz. Desde 2002, Nadja integra a Companhia Brasileira de Teatro, do diretor Márcio Abreu. "A experiência que tive com ele me deu tranqüilidade para trabalhar. Além disso, iluminar também é dirigir o olhar do espectador", diz.

A nova diretora atribui o bom resultado do espetáculo "à feliz união de três pessoas". "Não me impus na direção, não se faz mais teatro assim. Eu e os atores construímos o trabalho juntos. Ele tem a cara dos três e, por isso, é tão sólido".

Cooperação

Mas, o público que visitou o pequeno espaço do Teatro Experimental da UFPR, o TEUNI, também veio atraído por uma boa "estratégia de marketing" de jovens companhias da cidade. Como destacar seus trabalhos em meio a tantas opções?

Para resolver a questão, o grupo criou uma "mostra dentro da mostra" – a Novos Repertórios, que reuniu os grupos Pausa (Menos Emergências), A Armadilha (Os Leões), Silenciosa (Mecânica) e Provisória (Após Ser Jogado no Rio e Antes de Me Afogar).

Em comum a vontade de realizar um trabalho artístico contínuo, com ênfase na pesquisa de novas linguagens. Na opinião de Valmir Santos, crítico da Folha de S. Paulo, a mostra organizada pelas quatro companhias foi um dos "nichos de qualidade" do Fringe, em meio à mediocridade da maioria das peças locais.

O grupo inspirou-se no Coletivo de Teatro, que durante três anos, agrupou espetáculos de diretores como Paulo Biscaia, Fernando Kinas, Márcio Abreu e Giovana Soar. "A diferença é que ainda somos companhias desconhecidas", conta Naira. A junção também possibilitou equipar melhor o TEUNI para as apresentações. "Foi bom para o espaço, que quase ninguém conhece", diz.

O sucesso já abriu portas. Em breve, o grupo vai apresentar o espetáculo em outros dois festivais brasileiros.

O tom da palavra

Muita gente visitou a casa do Marcos Damaceno durante o Fringe. Explica-se: Damaceno é diretor do espetáculo Sonho de Outono, primeira adaptação do texto do norueguês Jon Fosse no Brasil. Ele abriu a intimidade de seu lar para oferecer ao público um ambiente em que as relações entre os atores e a platéia fossem mais próximas.

Peça para ser assistida com os ouvidos, nos dizeres do próprio diretor, Sonho de Outono é concisa, focada no texto e no trabalho de excelentes atores – encabeça Rosana Stavis, seguida por Luiz Carlos Pazello, Richard Rebelo, Ludmila Nascarella e Laura Haddad.

O texto de Fosse fala sobre o reencontro de um casal em um cemitério. Ela quer voltar a viver o amor que já sentiu por ele, mas ele hesita. As conversam giram em torno de sentimentos, da vida e da morte, para retratar as relações entre as pessoas, marcadas por inseguranças e medos. E, para mostrar tudo isso, nada mais do que a linguagem, cotidiana, clara e direta, mas poética e musical.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]