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Não vá assistir a Graphic esperando algo "cabeça". A peça, em cartaz até domingo no Teatro da Caixa, é diversão garantida para quem gosta de quadrinhos, de cinema e até mesmo de teatro – mas não do tipo convencional. O autor e diretor Paulo Biscaia não faz o tipo do cara que produz peças engajadas ou existencialistas. Tudo bem, há algo de crítica social na trajetória de três personagens que brigam por uma vaga como desenhista de quadrinhos de uma grande editora. O fato pode parecer bem familiar a incontáveis artistas que desperdiçam seu talento em empregos burocráticos para sobreviver. Mas, essa é apenas a deixa para que o diretor exercite o que sabe fazer de melhor, ou seja, juntar no palco tudo aquilo de que mais gosta – quadrinhos, cinema, música e outras referências da cultura pop, criando, assim, uma poética teatral bem pessoal.

O texto é muito bom. Biscaia consegue transformar biscoitos da sorte e novelas em temas para diálogos demorados e, por vezes, bem poéticos. Em uma das cenas, Becca, a executiva de finanças da editora Cruz de Barros, explica gráficos financeiros aos seus superiores, enquanto Artie, o desenhista de manuais de instruções da empresa, explica o passo-a-passo para usar uma câmera fotográfica. Em seguida, a angústia pelo patético de suas situações profissionais faz com que os dois personagens subvertam os mesmos discursos. Ao demonstrar a insatisfação dos funcionários, Becca usa gráficos e números para citar seu próprio caso "desesperador". Desde que começou a trabalhar lá passou a assistir progressivamente a todas as novelas (incluindo as mexicanas). Paralelamente, Artie oferece um passo-a-passo de como se suicidar das mais variadas formas. Os diálogos dos dois personagens "conversam" com a projeção dos desenhos feitos pelos artistas DW e José Aguiar, para caracterizar o traço dos dois personagens – o que é feito ao longo de toda a peça.

O cenário de Guilherme Sant’ana, um grande cubo que os personagens vão virando conforme as cenas, viabiliza a intenção do diretor de aplicar conceitos gráficos à dramaturgia. As projeções dos desenhos revelam a expressão interior dos personagens – sobretudo as cenas que indicam o trajeto de Raf, a artista de rua, por uma cidade que pode ser qualquer uma.

Os personagens são "estranhos, melancólicos e divertidos", nas palavras de Biscaia, mas merece destaque a interpretação bizarra de LEANDRODANIELCOLOMBO (assim mesmo, com letras minúsculas e sem espaços entre os nomes). A impressão é de que ele foi capaz de transformar Artie em uma criatura ainda mais esquisita e cheia de tiques do que a prevista no roteiro. Mais engraçado do que ele, só o chinês viciado em Talking Heads, dono do botequim onde os personagens se encontram. GGGG

Serviço: Graphic. Teatro da Caixa (R. Conselheiro Laurindo, 280), (41) 2118-5233. Texto, vídeos e direção de Paulo Biscaia Filho. Com a Companhia Vigor Mortis. Quinta a sábado, às 21 horas, e domingo, às 19 horas. R$ 10 e R$ 5 (funcionários e clientes da Caixa, estudantes e idosos). Até 5 de novembro.

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