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Estela Sandrini em seu ateliê: a artista plástica investe na pintura, que foi banalizada e hoje está quase sem mercado | Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo
Estela Sandrini em seu ateliê: a artista plástica investe na pintura, que foi banalizada e hoje está quase sem mercado| Foto: Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo

Linha do tempo

Saiba mais sobre a trajetória de Estela Sandrini

1944 – Nasce, em Curitiba, filha de José Ernesto Ericksen Pereira e Stela Braga. Na década de 1950, cursa o então ginasial no Colégio Nossa Senhora de Sion e, na década de 1960, faz o ginasial no São José

1962 – Faz curso livre com Guido Viaro

1967 – Gradua-se na Embap

1970 – Viaja para a Argentina, aprimora-se em escultura no ateliê de Juan Carlo Labourdette

1970/80 – Participa de mais de uma centena de exposições, individuais e coletivas, em todo o Brasil

1980 – Viaja para os EUA. Em Baltimore, realiza exposições

1990 – Leciona na Embap

Acervo – Tem obras em vários museus e espaços culturais de todo o mundo: na Coleção Carol Pulin (Washington), Eubie Blake Cultural Center (Baltimore), Museu Oscar Niemeyer (MON), Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, Museu de Arte de Goiânia, Museu de Arte Contemporânea do Estado de Pernambuco, Museu de Arte Brasileira (São Paulo) entre outros.

Estela Sandrini traduz em suas telas a ideia da "prisão da pintura". O que é isso? Talvez seja necessário ver para entender. Ela começa com tinta acrílica e finaliza os quadros com tinta à óleo. Aos 65 anos, tem apenas 5% da visão, e isso apenas no olho direito (com o esquerdo, nunca enxergou). Uma doença degenerativa há muito sentenciava que, para ela, as luzes iriam se apagar. "Só vejo o essencial", diz, e logo emenda: "Há compensações." Agora, sente mais os cheiros e os sons do mundo. Afirma que também se livrou de culpa, medo e vergonha.

"Há dez anos, jamais daria uma entrevista dessas", afirma a artista, que conversou com a Gazeta do Povo na sua casa, no bairro do Tarumã. Hoje, Teca – como é chamada por familiares, amigos e colegas – consegue verbalizar quase tudo o que se passa em seu imaginário: "Fato que considera uma conquista".

Ela diz sentir falta do contato diário com o ambiente da Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap), onde lecionou durante a década de 1990. "Dialogar com jovens artistas como o Marcelo Scalzo e o Goto, jovens, brilhantes, pouco preocupados com o mercado, me faz falta", diz. Ela constata, e lamenta, que as vendas de quadros estão estagnadas. "O pintor (de quadros) é igual ao alfaiate. Está entrando em extinção."

Imagem recorrente

A pintura se tornou prática e meio de expressão para Teca durante, e depois, de uma temporada em Baltimore, nos Estados Unidos, na década de 1980. Ela acompanhava o marido, Romolo Sandrini, que fazia um curso de aprimoramento. Entre cuidar dos filhos, e outras atividades, conseguiu espaço em um ateliê no Instituto de Arte de Maryland. Nessa época, a cadeira surgiu – e se consolidou – como tema e imagem recorrentes em suas telas.

"A cadeira representa a espera, o descanso e o pensar", afirma. Hoje, Teca considera que essa cadeira – ou o que esse objeto re­­presenta – é uma maneira (a sua) de olhar o mundo. Co­­mu­­nicar uma ideia por meio de expressão artística é algo que ela conseguiu, indiretamente, por intermédio de seu pai, José Er­­nesto Ericksen Pereira. Ele era jornalista e dialogava com pintores como Freyesleben, Guido Via­­ro e Theodoro De Bona. Quando Teca terminou o equivalente ao ensino médio, em 1962, ainda não tinha pensado no que faria da vida. Então, seu pai lhe apresentou Guido Viaro.

A ex-aluna do Sion lembra da tarde em que subiu os degraus de uma escada que a levariam não apenas ao sótão da Belas Artes, mas à primeira e decisiva aula com Guido Viaro. Antes de ela sair, o mestre – após analisar os primeiros ensaios da futura aprendiz – foi objetivo: "Você tem talento". Essas três palavras mudariam o destino da jovem artista e ainda comovem Teca.

Uma trajetória

Os desenhos que ela elaborou du­­rante a década de 1980 ganharam espaço em salões e se desdobraram em prêmios. Teca traduziu neles a mulher de sua geração, a que aderiu aos métodos contraceptivos, buscou a própria voz e conquistou espaço no mercado de trabalho. Essa dicção, ou "poética", talvez tenha começado a ser elaborada na década de 1960, período em que era estudante na Embap. O convívio com Fernando Calderari, João Osório Brzezinski, Zeca Malu­­celli e Juarez Machado foi enriquecedor.

Os "buracos brancos", presentes em muitos de seus quadros a partir da década de 1990, podem ser interpretados como a artista problematiza a perda de visão. Também podem ser lidos de acordo com a sensibilidade do interlocutor. E interlocução é algo que ela faz questão de ter.

Teca parece sempre deixar portas abertas em sua vida. Atende chamadas telefônicas ao mesmo tempo em que recebe encomendas – e recorda que desenhou mui­­to enquanto cuidada de seus filhos (Giovana tem 39 anos e Juliano, 36).

Na década de 1970, o Centro de Criatividade de Curitiba, no Parque São Lourenço, foi um espaço em que se discutia e se pensava as artes, o mundo, a existência: ela chegou a fazer escultura com resina de poliéster.

A pintura, as razões de pintar, sempre foi uma questão para Teca. Se há preconceitos em relação aos pintores de quadro, "pois a pintura foi banalizada", ela afirma que sente muito prazer em pintar, mesmo com apenas 5% da visão. Emocionada, recorre a Viaro, mais que professor, um sujeito que incentivava todos a conjugar três verbos: fazer, arriscar e ousar. Teca segue a recomendação do mestre. E pretende continuar assim.

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