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Procure lembrar quantos comerciais aos quais você assistiu nos últimos tempos traziam um apresentador famoso de programa de auditório, uma cantora de axé ou um ex-BBB. Até o hit chicletão do último carnaval botou esponjas de aço e o cachorrinho da Redecard para rebolar, respectivamente, nas versões Assolation e Faturation.

A popularização cada vez maior do intervalo comercial se deve, principalmente, à ascensão social das classes C, D, E e sua consequente inserção no mercado de consumo. "Esse fenômeno só foi pos­­sível graças ao declínio da in­­flação, à expansão do crédito, políticas sociais e até mesmo à queda da taxa de fecundidade", enu­­me­­ra a antropóloga Luciana Aguiar, que há 18 anos estuda essas faixas de público em pesquisa etnográfica.

Somadas, essas classes sociais representam 85% da população brasileira e, entre 2002 e 2008, tiveram um aumento de poder de compra na ordem de US$ 75 bilhões.

"Os anunciantes e publicitários sempre se dirigiram a quem tem poder de consumo e, até a década passada, isso incluía apenas a elite e a classe média-alta brasileira. Quando a classe C migrou para um patamar econômico melhor e passou a consumir, a primeira reação dos profissionais foi acreditar que os emergentes teriam um comportamento semelhante ao das classes A e B. Acharam que eles ouviriam Gal Costa quando eles preferiam Sula Miranda", exemplifica Marcos Camargo, doutor em Multimeios pela Unicamp e autor do livro A Montanha Que Partiu Ratinho.

Camargo conta que conhecer o público de baixa renda se tornou fundamental no meio publicitário de uns tempos para cá. "Diretores de marketing de grandes empresas fazerem imersões em favelas como estratégia para penetrar nesse universo e conhecer seus hábitos culturais, já que estes estão ne­­cessariamente vinculados aos hábitos de consumo", diz.

Em entrevista para o livro Propaganda Popular Brasileira, de Guilherme Azevedo, o publicitário e empresário Celso Loducca afirma que as classes mais baixas sempre sustentaram as grandes marcas no país. "Casas Bahia não existiam, nem as Havaianas vendiam mi­­lhões e milhões para a classe A. A classe C sempre esteve lá. A comunicação é que era feita para a classe A. Na realidade, esse público nem tinha televisão para ver, não comprava revista, não tinha dinheiro, mas era quem mantinha, pelo volume de compras, todas essas empresas."

Oral e imagética

Para o consultor em marketing e comunicação corporativa Eloi Zanetti, apesar de algumas mudanças, o publicitário brasileiro ainda não aprendeu a se comunicar de verdade com a base da pirâmide. "Ele continua criando campanhas voltadas à antiga classe média tradicional, ignorando os signos e valores desse novo consumidor e julgando sua estética com arrogância", critica. Zanetti lembra que o profissional de publicidade vem da classe média-alta, já nasce no mundo do consumo e tem alto nível de instrução, enquanto o novo consumidor tem poucos anos de estudos. "Ele não quer um anúncio com layout sofisticado, com um título irônico e bem-sacado.

A publicidade voltada a esse nicho deve investir em sonoridade, ritmo, elementos que conversem com a oralidade", diz. Marcos Camargo, professor de Semiótica da Faculdade de Artes do Paraná, acredita que, se o público consumidor é popular, de nada adianta eruditizá-lo.

"Quando o consumidor da elite era o principal foco das campanhas publicitárias, as mensagens refletiam sua cultura letrada. Hoje, as culturas oral e imagética imperam na publicidade, porque ela se destina a um público com baixa escolaridade, que vive na era pós-letrada – dos emoticons na internet aos vídeos no YouTube, passando pelas frases curtas no Twitter – sem nunca ter sido letrado", opina.

Microcosmo

Um caso emblemático de inserção da classe C na publicidade brasileira é a família Amorim, que ficou conhecida após protagonizar um quadro do Fantástico sobre educação financeira e, em seguida, estrelar uma campanha de crédito bancário da Caixa Econômica Federal.

Em agosto deste ano, a família que retrata o microcosmo da classe emergente estreou novo filme, assinado pela agência Fischer América, evidenciando ainda mais sua ascensão social. Agora, além da cozinha nova, adquirida graças à expansão do crédito, os Amorim tam­­bém exibem na sala de casa um televisor de LCD de última geração.

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