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Ponta Grossa - A saga do indiano favelado Jamal Malik, herói de Quem Quer Ser um Milionário? (foto) (Índia/Reino Unido, 2008), faturou oito Oscars e chegou ao Jardim Paraíso, na periferia de Ponta Grossa. A vila não tem cinema, mas recebeu o projeto itinerante CineMonsanto, que selecionou o filme para o público – a maioria nunca havia entrado em contato com a telona.

Lá, porém, o que parece estar escrito não é o destino de ficar milionário como Jamal, mas sim o de ter que morar longe, pegar ônibus lotado todos os dias, trabalhar muito e ganhar pouco. Até mesmo vencer o Show do Milhão – versão Sílvio-santista dos programas do gênero – é um sonho distante.

A auxiliar de serviços gerais Ana Maria do Nascimento, de 38 anos, senta-se na arquibancada da Casa Brasil – projeto de inclusão do governo federal –, cruza as pernas e contempla "uma Índia diferente". "Eu achei bonito, ele sabia as respostas graças ao que aconteceu na vida dele". Mas o pé na realidade corta as asas da ficção: "só que na vida não funciona assim, sem estudo não teria como ele responder nada".

A pobreza na comunidade do Jardim Paraíso não pode ser comparada à das favelas de Mumbai, mas o lugar também não é ne­­nhum paraíso. O conjunto habitacional e registra elevados índices de violência, além da pouca estrutura social e de lazer. Sem falar nas suas margens, rodeadas de favelas: a periferia da periferia. "Geral­mente as pessoas saem caladas e a primeira coisa que falam é a diferença com a Índia da novela. Elas levam um choque", analisa o produtor cultural do projeto, Hélio Ramos.

Se Jamal vence o programa porque "está escrito" que assim seria, o que dizer do destino dos espectadores do Jardim Paraíso? "Não acredito que seja tão fácil ganhar como ele ganhou. Se for trabalhando, não tem a menor condição de ficar rico, e sem estudo não dá pra ganhar nem no Show do Milhão", desdenha Fábio Cunha, auxiliar de produção. Mas ele gostou do filme, embora o tenha achado muito violento. Nada mais que a realidade para o cadeirante Sandro Boamorte, 28 anos, que trabalha na Casa Brasil.

"É isso o que a gente vê no dia-a-dia. Abuso das empresas e da po­­lícia sobre as favelas e as classes menos favorecidas. Além disso, crianças que passam fome, que têm pai e mãe e é como se não ti­­vessem. E eu não acredito em destino. Se não trabalhar, as coisas não vão cair do céu", sentencia, sentado em sua cadeira de rodas.

O que caiu do céu na noite da exibição foi água, e muita. O resultado foi uma sessão esvaziada, comprovando que na periferia nada é fácil, mesmo quando há oportunidade.

Quem foi torceu para Jamal ficar rico e ficar com Latika, mas não desgrudou da labuta diária. "Muita gente acredita em dinheiro fácil. É por isso que o pessoal cai naqueles contos do bilhete premiado", acusa Fábio. Mas será que ninguém acalenta o sonho de sair da vida comum e ficar rico? Realidade à parte, é como diz o mesmo Fábio, meio perguntando, meio afirmando: "claro que é difícil, mas quem não sonha às vezes que ganhou na Mega Sena?".

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