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| Foto: Liz Lawley/Wikimedia Commons

Antes de passar um fim de semana inteiro com Christian Grey – lendo a prova do livro “Grey”,com lançamento nacional na sexta-feira (18) –, já o conhecia por relatos de pessoas muito próximas. Minha paixão dos tempos de faculdade, admiradora dos livros de E.L. James, me mostrou o rapaz no começo do ano, no trailer do filme “Cinquenta Tons de Cinza” em que ele (o ator Jamie Dornan) sensualizava com Anastasia Steele (Dakota Johnson), a tímida estudante de Letras, fã das irmãs Brontë e de Jane Austen.

Achei tudo bem canhestro. As interpretações se assemelhavam muito às do meu grupo de teatro infantil, recitando Escaravelho do Diabo, da coleção Vaga-Lume, para a nossa turminha. Não quis ver o primeiro filme da franquia – bastou o trailer –, mas me lembro da imitação que um amigo fez para a cena em que Grey diz a Ana – os próximos não a chamam de Anastasia – que irá “f***-la com força”.

Noite dessas, num horário em que nada de bom poderia acontecer, duas amigas entraram numas de escorraçar o mote da espertíssima escritora britânica – a trilogia “Cinquenta Tons de Cinza” já vendeu mais de 125 milhões de exemplares no mundo, 6 milhões só no Brasil.

A picaretagem de “Grey”

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Elas alegavam que o contrato de dominação & submissão imposto pelo rapaz, um sujeito rico, bonito, jovem e solteiro, podia ser encarado como a exposição das entranhas do machismo e do patriarcado, algo no terreno da violência doméstica.

Eu me lembrei de uma cena de “Os 120 de Sodoma”, de Marquês de Sade, e resolvi não argumentar. Algum tempo antes, minha sobrinha de 17 anos ganhou o livro como presente de aniversário. Minha irmã, ao me emprestar o exemplar dela na semana passada, disse que não leu. Um pouco incrédulo, observei que algumas páginas estavam nitidamente amassadas.

Bem, depois de um período curto em que Grey e Ana desapareceram da minha vida, E.L. James retorna às livrarias com este “Grey: Cinquenta Tons de Cinza Pelos Olhos de Christian”, editado pela Intrínseca.

O mote é simples: tudo o que acontece no primeiro livro também acontece neste “Grey” (o quarto livro da série), mas com o itálico dos pensamentos ao cargo de Grey, dono de um império empresarial regido por helicópteros, carros de luxo, atendentes loiras e negócios de Detroit ao Sudão.

Coisa barulhenta

“Grey” é a sensação de chuva intermitente no fim de semana de praia: uma coisa barulhenta atravancando a programação. O que interessa a E.L. James é o ideário romântico escrito de modo comum. Há passeios de mãos dadas. Descrições repetidas de mordidas de lábio. Reforços sobre pureza e castidade . Monogamia. Sussurros. Promessas. Mais do mesmo com os enfeites morais já cansados de guerra.

Ao que se sabe, a ideia de recontar a história pela perspectiva do milionário partiu dos fãs, que não paravam de importunar a autora. Em seu site, James alegou que o rapaz é um personagem complexo que fascina por seus desejos e passado conturbado.

Preciso discordar com a força de um chicote de couro estalando nas minhas costas: Christian Grey é um personagem profundo como uma piscina de bolinhas. Contudo, é preciso reconhecer que há, nesses dois personagens, uma “potência”, uma leitura possível do espírito do nosso tempo, em que a convivência a dois é cada vez mais ruidosa. Ou sempre foi, mas não com tanta exposição.

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