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literatura

Português faz livro com descrições cinematográficas

“Short Movies”, de Gonçalo M. Tavares, tem dezenas de textinhos que podem ser lidos em meia hora – autor recomenda ao leitor: “aguardar para sentir”

 | Osvalter Urbinati/
(Foto: Osvalter Urbinati/)

Dá quase para bater o martelo: a literatura portuguesa contemporânea redescobriu no Brasil um porto seguro.

Edições de obras de escritores lusos encontram naturalmente um público cativo capaz de lotar eventos literários nacionais e locais.

Lembre-se do Litercultura, por exemplo, que nos últimos anos apostou na fama e no talento de Valter Hugo Mãe e José Luís Peixoto para discutir o velho ofício de se colocar uma palavra atrás da outra.

Capítulo recente desta relação é o lançamento de “Short Movies”, de Gonçalo M. Tavares. Publicado originalmente em Portugal em 2011, é aposta da editora gaúcha Dublinense – que neste ano também lançou “Morreste-me”, de José Luís Peixoto (livro do qual se sai com o coração mais apertado).

O barulho de um avião. Um menino com ar de deficiente mental aponta para cima e grita. A mãe está a apanhar sol, virada de barriga para baixo. (...) Ela não se mexe, nem com o barulho do avião, nem com o alvoroço do filho.

Gonçalo M. Tavares, no livro “Short Movies”.

Ao se aproximar com a atual prosa de Portugal, é possível notar diferenças entre seus protagonistas. Se Valter é “fofo”, etéreo e ultrassensível, se Peixoto é preciso e profundo, Gonçalo é o professor pardal da turma.

“Short Movies” compreende cerca de 70 textos curtos, que se dedicam meramente a descrições de cenas e imagens.

Não há espaço para arroubos reflexivos, digressões. Nada disso. A narração dura e imagética tem o efeito demonstrativo de uma câmera cinematográfica.

“Há um conjunto de imagens que não são contos, são pequenas descrições de fatos e gestos. O leitor precisa aguardar para que as imagens façam seu percurso e aí sentir a tensão que existe nas descrições verbais”, explica o autor em entrevista à Gazeta do Povo, que se sente à vontade ao fundir estilos literários.

Seu último romance, “Matteo Perdeu o Emprego” (2010), mistura ensaio e ficção.

“Gêneros literários são calcificados. Eles podem ser limitativos da criatividade, impor um conjunto de regras não aceitáveis. Um escritor escreve com o alfabeto – o alfabeto é seu ‘matrial’ – ele não escreve pensando que será um conto, um romance ou um poema”, explica Tavares, que conta mais de 30 obras lançadas e prêmios importantes como Portugal Telecom e José Saramago no currículo.

Aliás, uma frase do autor de “Ensaio Sobre a Cegueira” sobre seu pupilo já se tornou famosa: “Ele não tem o direito de escrever tão bem apenas aos 35 anos”.

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