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Bailarinas Hanny Lissa e Shareon Morgenstern, criadoras do método | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
Bailarinas Hanny Lissa e Shareon Morgenstern, criadoras do método| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Seu corpo pode revelar muito mais do que um talento à Fred Astaire ou Ginger Rogers no momento da dança. Ele pode refletir, mesmo que de forma inconsciente, questões emocionais alicerçadas em arquétipos profundos - modelos de personalidades presentes no inconsciente coletivo - que encontram no movimento formas de se fazerem notar. É o que defendem as curitibanas Hanny Lissa e Sharon Morgenstern, ambas bailarinas – a primeira também psicóloga e a segunda também educadora física – criadoras do método “Corpo Emocional” que une expressão corporal e artística com uma leitura jungiana do movimento.

Inspiradas nos trabalhos de estudo do movimento e psicologia de nomes como Isadora Duncan, Martha Graham, Feldenkrais, Alexander Lowen ou mesmo Mário Nascimento e Helena Katz, elas desenvolveram uma série de “ferramentas organizadas para que o corpo visite suas emoções e possa criar a partir delas, o método consiste em um leque de técnicas para que o indivíduo seja capaz de acessar o seu emocional de maneira não invasiva através da vivência corporal, como conceitua Lissa.

Dividido em quatro etapas – Sensibilização; Visitação da Lógica Subjetiva; Desenvolvimento e compreensão de Arquétipos e Organização e Expressão – o método é destinado a dois perfis distintos de praticantes. Existem aqueles que o utilizam como ferramenta de criação artística (bailarinos, atores) e os que buscam o caráter terapêutico. As primeiras etapas do processo podem ser aplicadas para ambos mas a última (que está vinculada à participação do praticante em um espetáculo, fica a critério do indivíduo).

Sheron destaca ainda que a interação com as outras pessoas que o método proporciona tem efeito também sobre si mesma: “O processo é uma entrega, é ser um bem maior que expande o meu afeto, o meu ser sensível, trazendo reflexões sobre quais as minhas responsabilidades éticas para as pessoas e para o mundo”, pondera.

Também participante do processo, o bailarino profissional Ricardo Padovani reflete sobre os benefícios dessa leitura emocional do movimento: “A aplicação do método transformou toda a minha linguagem da arte, é um processo não invasivo e ao mesmo tempo muito profundo que te coloca frente a questões que acabam por te fortalecer”, comenta.

A dança como terapia

O autoconhecimento e a busca pelo equilíbrio também podem motivar o mergulho nas emoções através da expressão corporal. É o caso da representante comercial Thayse Luchetta que encontrou no “corpo emocional uma forma de superar momentos de fragilidade e depressão. Inicialmente como forma de complementar o tratamento medicamentoso tradicional, Thayse buscou se reconectar com sua expressividade, ao mesmo tempo em que trabalhava os gatilhos emocionais da condição que enfrentava: “Talvez o mais marcante tenha sido o estímulo para a busca da sua própria singularidade. Apesar de oferecer orientações, Sharon e Lissa nunca se colocaram de forma restritiva no sentido de ‘certo e errado’, possibilitando que nós mesmos alcançássemos elementos como autoconfiança e fortalecimento emocional”, recorda.

Sobre esse ponto, Lissa aponta que “junto com todo o processo inerente ao quadro depressivo, existe uma perda muito grande sobre o reconhecimento do prazer corporal, e a dança contribui para que o indivíduo redescubra essas sensações. O método cria condições para que o corpo reviva emoções perdidas há muito tempo”, analisa.

E foi exatamente isso que Thayse experimentou. Ela foi gradativamente deixando o tratamento medicamentoso - com o acompanhamento médico - e permaneceu com a dança, estruturando, ao lado do marido, um projeto ligado à música que alcançou reconhecimento até mesmo na ONU. Em 2015, durante o encontro Women’s Empowerment Principles, ela foi convidada a cantar a canção “Mulher”, de sua autoria em parceria com o esposo, na cerimônia de encerramento.

Liberdade do corpo e aceitação

Transformação tão profunda quanto viveu Leonide Melo, de 62 anos. Entusiasta da dança desde sempre, ela pratica o “Corpo Emocional” há cinco anos.

Tendo experimentado um período de grande rigidez enquanto viveu por oito anos como freira, após deixar o convento descobriu na dança um modo de recuperar a “liberdade do corpo”, ao mesmo tempo em que superava os traumas de uma deficiência auditiva. “Junto com o projeto eu já participei de uns seis espetáculos, o que foi perfeito para que eu enfrentasse meus limites e compreendesse e libertasse minhas emoções”, relata.

Embora os resultados sejam, via de regra, positivos, o trabalho de construção da narrativa e dramaturgia do gesto que o método “corpo emocional” proporciona é constante. Existe a possibilidade de adaptar as premissas inclusive para as crianças, respeitando, claro, as diferenças de abordagem. Ao que parece, corpo e mente estão sim conectados, e a dança pode funcionar como ponte para um maior domínio do indivíduo por si mesmo, pois, afinal, como as próprias criadoras do método fazem questão de salientar: “O corpo não mente”.

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