Opinião
Sérgio Bianchi volta a incomodar
Pode-se dizer que o paranaense de Ponta Grossa radicado em São Paulo Sérgio Bianchi é hoje um dos diretores mais polêmicos do país. Seus filmes têm como marca registrada uma aguda crítica ao sistema vigente como, por exemplo, em Cronicamente Inviável, de 1999, em que trata do caos social brasileiro, e Quanto Vale ou É Por Quilo, de 2004, em que denuncia a solidariedade de fachada das ONGs e mostra que a situação dos negros no país pouco mudou após a abolição da escravatura.
A cineasta paulistana Suzana Amaral, 75 anos, mãe de nove filhos (cinco homens e quatro mulheres) conta que não tem paciência para lidar com questões de "mulherzinha". "Minhas filhas têm ciúmes do meu relacionamento com os irmãos, acho que tenho mais ferramentas para lidar com os homens, sou ariana, sou de briga", explica, em entrevista concedida à Gazeta do Povo, apontando o modo despojado como se veste e os cabelos curtos. Conta isso para justificar porque se sentiu tão à vontade realizando seu último filme, o road movie Hotel Atlântico (2008), exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que roteirizou a partir de uma das primeiras obras do autor gaúcho João Gilberto Noll. "Queria sair daquele universo intimista, feminino dos meus filmes anteriores e partir para uma narrativa totalmente alternativa", diz a diretora de A Hora da Estrela, de 1985, adaptação da obra de Clarice Lispector, que rendeu a Marcélia Cartaxo o prêmio de melhor atriz nos Festival de Berlim em 1986. O sucesso do filme, vendido para 25 países, trouxe muitas alegrias para Suzana, mas as viagens para lançar o filme mundo afora foram um transtorno para esta senhora agitada que se tornou cineasta com os filhos já criados. "O sucesso é dispersivo", diz ela, que só lançaria seu segundo longa-metragem de ficção 16 anos depois, Uma Vida em Segredo, baseado na obra de Autran Dourado, sobre uma jovem tímida do interior de Minas Gerais no final do século 19 que não se acostuma com a vida na cidade.
Guinada radical
Hotel Atlântico, como ela mesma diz, representa uma guinada radical em sua trajetória. "Meus outros filmes tinham narrativa tradicional, clássica, início, meio e fim. Eu buscava algo alternativo, estranho, quando me deparei com o livro de Noll", explica Suzana, que se considera ela própria alternativa.
Para levar às telas a "enigmática" história de um ator sem nome, chamado às vezes de Artista pelos outros personagens, que decide pegar um ônibus e sair a esmo rumo ao sul do Brasil, vivenciando aventuras insólitas e imotivadas, Suzana foi buscar atores que tivessem "o tempo ideal de cinema". Encontrou esta "qualidade" em Júlio Andrade, seu protagonista (de Cão sem Dono), que se envolve em situações violentas e pessoas bizarras como um sacristão que gosta de contar suas proezas sexuais (Gero Camilo, de Carandiru), a fogosa filha de um político (Mariana Ximenes) e um enfermeiro que nunca viu o mar (João Miguel, de Estômago).
Para explicar como é esse "tempo de cinema" à repórter, a diretora se movimenta com gestos muitos lentos e olhar compenetrado. "Neste filme sem psicologismos, onde o que interesse é o aqui e agora, o ator precisa se concentrar no momento", explica Suzana. Para isso, ao invés de dar o texto para o elenco estudar, propôs somente a leitura do livro e longas conversas.
Há tempos, Suzana roteirizou Perto do Coração Selvagem, outro romance de Clarice Lispector, mas reluta em filmá-lo. "Gostaria de continuar por mais tempo mergulhada no universo masculino. Sonho em escrever uma história com quatro homens", diz ela, pensando nos atores que mais gosta: José Dumont, Lázaro Ramos, Gero Camilo e, é claro, Júlio Andrade. A jornalista viajou a convite da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
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