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“A voz do narrador, Paulo, é uma amálgama de pessoas que conheci”, diz o jornalista e escritor Edney Silvestre | Divulgação/Editora Record
“A voz do narrador, Paulo, é uma amálgama de pessoas que conheci”, diz o jornalista e escritor Edney Silvestre| Foto: Divulgação/Editora Record

Opinião

Ilusões perdidas

O medo é uma sensação que tende a acompanhar o leitor durante as 302 páginas de Se Eu Fechar os Olhos Agora, romance que marca a estreia literária do, até então, somente jornalista Edney Silvestre.

Seguir, páginas após página, a sedutora narrativa de Silvestre é uma experiência prazerosa e ao mesmo tempo angustiante.

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  • Obra escrita durante vinte anos

O fato de o jornalista Edney Silvestre "aparecer" com um romance não espanta. Afinal, em anos recentes, sua atuação à frente do programa Espaço Aberto Lite­­ratura, na Globo News, já sinalizava que o entrevistador era um sujeito mais do que entusiasmado por literatura. Silvestre é um leitor voraz. Passa os domingos dentro de seu apartamento no bairro do Le­­blon, na zona sul carioca, lendo três ou quatro livros ao mesmo tempo.O jornalista começou a escrever, e jogou fora, dois outros romances. É que o enredo e a linguagem de Se Eu Fechar os Olhos Agora, romance que acaba de ser publicado, exigiram dele muita energia. Silvestre ficou envolvido com esse projeto durante as duas últimas décadas. Mesmo quando não estava escrevendo, ele convivia, e até sonhava, com as personagens, os impasses e a atmosfera dessa obra que pedia para ser escrita.

Se Eu Fechar os Olhos Agora re­­cria literariamente o que pode ter sido o Brasil da segunda metade do século 20, período em que ha­­via esperança de que o país se tornasse uma potência. A obra tem como protagonistas dois personagens de 12 anos, Paulo e Eduardo.

Simbolicamente, o futuro de ambos (e dos brasileiros, em geral) estaria atrelado ao que viesse a acontecer na conjuntura nacional.

A passagem do tempo mostrará o que a realidade evidencia: o sonho tornou-se pesadelo, o Brasil naufragou e não há muito espaço para esperança e utopia.

Silvestre conta que demorou para finalizar Se Eu Fechar os Olhos Agora porque estava em busca da voz que, para ele, seria a mais adequada para conduzir a longa narrativa. Entre silêncios e turbulências internas, a voz do personagem Paulo se impôs. E essa voz pode ser definida como algo entre a ternura e o lirismo. "Ou um oboé", diz Silvestre, referindo-se ao instrumento de sopro que tem uma dicção peculiaríssima.

Essa voz narrativa, que comove por ser lírica e terna ao mesmo tempo, dialoga com o repertório emocional do autor. Silvestre foi correspondente da Rede Globo em Nova York de 1991 a 2002. Ele estava na cidade norte-americana no momento do ataque às Torres Gêmeas – foi o primeiro jornalista brasileiro a chegar ao local da tragédia. O incidente o comoveu "muito". Somado a isso, sofreu com perdas de algumas pessoas de seu círculo pessoal.

"Escrever ficção me trouxe a com­­preensão do poder da memória", diz Silvestre, a respeito dessa experiência em que, diferentemente de tudo o que ele havia realizado no jornalismo, transforma sensações íntimas em texto final.

"Não sou José Saramago, não sou Maria Esther Maciel, não sou João Gilberto Noll", diz Sil­­vestre. Ele hesitou antes de en­­viar os originais do livro para a editora Record. Mas, após al­­gu­­mas conversas, ponderou: "Não sou me­­lhor nem necessariamente pior do que outros autores. Sou diferente."

Ao aceitar a própria voz literária, o escritor Edney Silvestre libertou-se.

Serviço: Se Eu Fechar os Olhos Agora. Edney Silvestre. Record. 302 págs. R$ 34,90.

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