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Gloria e Raul, no início do namoro, em 1974 | Arquivo pessoal
Gloria e Raul, no início do namoro, em 1974| Foto: Arquivo pessoal
  • Gloria, grávida de Scarlet, em foto de 1976, ao lado de Raul

Quando escreveu a música "Tente outra vez", parceria com Paulo Coelho e Marcelo Motta no disco "Novo aeon" (1975), Raul Seixas tentava novamente ser feliz no amor. Poucos meses antes de lançar o álbum, o cantor havia se casado pela segunda vez, com a americana Gloria Vaquer, a irmã de Jay, o guitarrista de sua banda.

O idioma e as diferenças culturais não foram barreira para que o casal se apaixonasse rapidamente. Tanto que, 20 anos após a morte do roqueiro, ela ainda se lembra do primeiro encontro. "Fiquei muito impressionada com ele, que estava lendo um livro de filosofia. Seu inglês era perfeito, sua voz macia só falava de conceitos muito inteligentes", conta.

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Foi durante sua história de amor com Gloria – que hoje, aos 59 anos, adotou o nome de "Sky Keys" (chaves do céu) – que o roqueiro criou seus maiores hits. Além de "Tente outra vez", estão na lista "Eu nasci há dez mil anos atrás", "Maluco beleza" e "A maçã".

A união durou quatro anos e o casal teve uma filha, Scarlet, hoje com 33. Se estivesse vivo, Raul seria o vovô orgulhoso de Dakota, de 13. O adolescente vive com a mãe e a avó na cidade de Opelika, no estado do Alabama, nos Estados Unidos.

Homem de muitos amores, Raul também foi casado com Edith Wisner, com quem teve sua primeira filha, Simone; Kika, mãe da caçula Vivian, além de uniões com Tania Menna Barreto e Lena Coutinho. Pertencem às três herdeiras os direitos sobre a obra do pai. Scarlet e Simone, que vivem fora do país, são representadas por advogados no Rio de Janeiro.

Já Sky Keys, diz que a única relíquia que herdou de Raulzito foi um "amor absoluto e incondicional que transcende tudo e todos". Algo tipo... as chaves do céu!

Confira na entrevista a seguir as histórias que a ex-mulher de um "maluco beleza" tem para contar.

Como foi o início de seu namoro com Raul Seixas?

Conheci Raul em fevereiro de 1974, em seu apartamento em Ipanema. Fiquei muito impressionada com ele, que estava lendo um livro de filosofia. Seu inglês era perfeito, sua voz macia só falava de conceitos muito inteligentes. Nunca conheci ninguém como ele. Simplesmente gostei de ficar o ouvindo falar, embora nem sempre pudesse entender o que estava dizendo, pois os assuntos iam além da minha limitada capacidade para compreender um verdadeiro gênio. Mas nós nos apaixonamos, assim mesmo, sem rima e sem razão.

No ano de seu casamento com Raul, 1975, ele lançou o álbum "Novo aeon". Quais lembranças você tem do processo de composição deste disco?

Eu não participava muito do processo de criação de Raul, Paulo [Coelho] e Marcelo Motta. Lembro que o Paulo era um compositor magistral, pleno de conhecimento e sabedoria. Mesmo quando os temas e letras eram sérios, Paulo nunca deixava a atmosfera pesar. Ele gostava do processo de compor e demonstrava isso com seu senso de humor multifacetado. Já Marcelo Motta era uma personalidade totalmente diferente. Marcelo era um bruxo com incríveis habilidades paranormais, que realmente me assustavam.

Esse disco tem alguma faixa inspirada no relacionamento de vocês?

Todas e nenhuma. O álbum era genial, multidimensional e multifacetado, com uma profundidade que até hoje me surpreende. A música "A maçã", por exemplo, tem a ver com todos os relacionamentos. "Sunseed" foi escrita por mim para ele e por ele para mim. Somos nós nos vendo e eu cantei com ele. "Love is Magick" também é minha e de Raul.

A imagem de Raul para os fãs é a de um gênio rebelde. Mas como ele era na intimidade?

Raul adorava rir e brincar. Era um homem que sabia amar. Ele sabia como estar realmente presente em todos os momentos de sua vida e via as coisas de uma forma além da compreensão de uma mente limitada pelas três dimensões.

Qual sua música preferida do Raul?

Atualmente é "Minha viola", uma canção escrita pelo pai de Raul. Amo essa música pois na voz de Raul você pode ouvir a curiosidade de uma criança inocente, a incerteza de um jovem descobrindo o mundo e as dores que ele encontrou como um homem. Está tudo em sua voz. Pura e real.

Você teve uma filha com o Raul, Scarlet. Ele foi um pai "maluco beleza"?

Quando nos separamos, Scarlet tinha menos de 2 anos. Ela só conviveu mesmo com ele por alguns meses, em 1988, quando já tinha 12. Raul faleceu no ano seguinte. Ele não poderia ser descrito segundo as convenções sociais como um pai, digamos, "aceitável". Era um gênio e nem sequer conseguia fingir ser "normal". Assim, sem mais detalhes, vou dizer apenas que Raul era um pai excepcional, com uma sabedoria e um amor tão dedicado que as palavras nem sempre eram suficientes para o seu "método de ensino".

Como era a rotina de vocês durante o casamento? Você acompanhava as turnês do cantor?

Nos conhecemos em fevereiro de 1974, casamos nos Estados Unidos no mesmo ano e nos separamos em março de 1978. Morávamos em São Conrado, no Rio. Estive com ele em algumas excursões e shows, mas não era como a maior parte das pessoas imagina. Era tudo desgastante e cansativo. Muitas vezes os empresários fugiam com o dinheiro e deixavam o Raul sozinho com todas as despesas de hotel, alimentação, transporte e cachês da banda. Uma vez, Raul raspou a barba e os fãs não acreditaram que ele fosse realmente o Raul, o que foi muito desanimador. Na verdade, não importa o quanto Raul dava de si: nunca era suficiente. Sempre queriam mais. As gravadoras, os empresários, os fãs, o governo. Todos sempre esperavam e queriam algo diferente dele. Queriam o que eles próprios nunca poderiam ter: a coragem de ser Raul Seixas.

Como o Raul é visto pelos americanos? Há fãs do cantor nos Estados Unidos ainda hoje?

Infelizmente Raul não é muito conhecido aqui. Apenas nas comunidades brasileiras de Nova York e Miami você encontra uma concentração de fãs. Mas isso um dia vai mudar.

Por que mudou seu nome?

Na medida em que vivemos, precisamos mudar. Gloria Seixas não é mais quem eu sou. Coisas antigas que não me servem mais estavam atreladas a esse nome, mas hoje sou livre. Estou livre de um modo que não pode ser expresso em palavras e me expando como o céu. O conhecimento me fornece as chaves para abrir portas que estiveram trancadas e posso me redescobrir. Portanto, neste momento, sou Sky Keys.

Tem alguma relíquia herdada do Raul

O que resta de Raul para mim é um momento no tempo. Um dia, estávamos sentados em um restaurante na praia de Ipanema. Ele olhou para mim e nesse olhar eu soube que a única coisa real era o amor. Nada mais importa. Nada mais é. A única realidade é amor. Eu não estou falando de amor por outra pessoa. Estou falando de um amor absoluto e incondicional que transcende tudo e todos. Para mim, Raul vive em tudo o que é belo.

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