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Rio de Janeiro – Profissão: ator de cinema. Até bem pouco tempo, era impossível para um artista brasileiro se apresentar dessa forma quando questionado sobre o seu trabalho. Mas o desenvolvimento da produção nacional na última década mudou esse cenário e, hoje em dia, já existem atores nacionais identificados especificamente com a sétima arte.

Antes de brilhar na telinha, profissionais como Matheus Natchergaele, Lázaro Ramos e Wagner Moura fizeram carreira de sucesso no cinema e só depois, por conta de sua competência comprovada nas telas, foram convidados para trabalhar na televisão. Um ator que vem seguindo os mesmos passos dessas estrelas do cinema brasileiro é Flávio Bauraqui, que participa de quatro produções selecionadas pela Première Brasil do Festival do Rio 2006.

Revelado em Madame Satã, de Karim Aïnouz, no qual interpretou o travesti Tabu, o gaúcho radicado no Rio de Janeiro já conta com mais de uma dezena de longas no currículo. Até agora, Bauraqui foi protagonista de apenas uma dessas produções – Quase Dois Irmãos, de Lúcia Murat, pela qual recebeu o prêmio de melhor ator da mostra carioca em 2004 –, mas vem se destacando em importantes papéis de coadjuvantes, como pode ser comprovado em Zuzu Angel, filme ainda em cartaz nos cinemas, em que vive um militar da ditadura, seu primeiro vilão.

Em entrevista ao Caderno G antes de uma das sessões do festival de Os 12 Trabalhos, de Ricardo Elias, o ator revelou um pouco de sua trajetória nas artes, iniciada ainda na adolescência em Santa Maria, no Rio Grande do Sul. "Sou autodidata. Comecei com 15 anos na escola, porque era muito bagunceiro e fui chamado pela direção para canalizar essa energia toda. Participei de uma gincana no colégio e desde então nunca mais parei de trabalhar com teatro", diz Bauraqui, hoje com 40 anos. Ainda na cidade gaúcha, ele formou um grupo chamado Improviso, trabalho que o levou a participar de uma companhia de Porto Alegre um tempo depois.

Ele decidiu vir para o Rio de Janeiro em 1993, com a passagem paga pela mãe e quase sem nenhum dinheiro no bolso. Conseguiu primeiro o emprego como porteiro de um prédio. "Levei todo meu material para a portaria e comecei a divulgar meu trabalho. As crianças do prédio começaram a se interessar e virei professor de teatro delas informalmente, sendo efetivado mais tarde no cargo. A partir daí, muitas pessoas começaram a me ajudar, como Beto Simas, que conseguiu que eu atuasse na minha primeira grande peça de teatro, do André Paes Leme, com quem depois fiz mais de 40 espetáculos de vários gêneros, principalmente musicais", conta.

As atuações garantiram várias indicações para fazer teste em Madame Satã. Quando soube que era para interpretar um travesti, pensou em recusar, pois tinha medo que pudesse ter a imagem queimada logo em seu primeiro filme. "Inventei uma dor de dente e faltei ao teste, mas ligaram de volta e me deram outra chance. Cheguei lá e me deram um baby-doll rosa para fazer a cena. Mas o que era inicialmente um pavor virou um grande desafio, e foi muito legal ter feito, me lançou como ator no Brasil e no mundo", revela.

Bauraqui passou um tempo sem novos convites para o cinema até interpretar Cartola no teatro, elogiada interpretação por seu elaborado trabalho de pesquisa: "Estudei minuciosamente o Cartola cantando e falando, e consegui algo muito próximo da voz dele. Também fiz uma boa composição física do personagem." A peça mostrava toda sua versatilidade como ator e rapidamente novas propostas foram surgindo no cinema. "Tenho encontrado diretores que compram a minha loucura, acreditam na minha forma de trabalhar. Por ser autodidata, minha construção do personagem é diferente, não tenho um processo ou cartilha específica", lembra, explicando o interesse dos cineastas pelo seu trabalho.

No Festival do Rio 2006, além de Os 12 Trabalhos, em que vive o primo do personagem central, um motoboy, Bauraqui é coadjuvante em: Noel – O Poeta da Vila, de Ricardo Van Steen, intepretando o cantor e compositor Ismael Silva; O Cheiro do Ralo, de Heitor Dhalia, como um dos vários personagens que freqüentam o antiquário do protagonista vivido por Selton Mello; e O Céu de Suely, novo de Aïnouz, em que faz uma rápida participação afetiva.

Não deve demorar muito para quem um protagonista marcante apareça para no caminho do talentoso ator, que também fez pequenas pontas na televisão como em Sinhá Moça e A Grande Família. "No cinema, dei sorte e comecei logo no filé mignon. Estou recebendo muitos convites, várias possibilidades de personagens, é um privilégio. Tudo foi fruto de muito esforço e da ajuda de muita gente que acreditou no meu trabalho", conclui.

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