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O bem bolado do carnaval curitibano

O fotógrafo Mário Nery organizou durante quarenta anos o Baile das Bem Boladas, festa ousada do carnaval de Curitiba

Da loja de canetas da Rua XV e do trabalho na impressão dos jornais Paraná Esportivo e Gazeta do Povo à maior festa do carnaval curitibano: Mário Nery, míudo e contido, é um carnavalesco de mão cheia | Lucas Pontes/Gazeta do Povo
Da loja de canetas da Rua XV e do trabalho na impressão dos jornais Paraná Esportivo e Gazeta do Povo à maior festa do carnaval curitibano: Mário Nery, míudo e contido, é um carnavalesco de mão cheia (Foto: Lucas Pontes/Gazeta do Povo)
Festa que movimentava Curitiba nos anos 1970 e 1980 era destaque na Tribuna do Paraná |

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Festa que movimentava Curitiba nos anos 1970 e 1980 era destaque na Tribuna do Paraná

Quem olha pela primeira vez para o fotógrafo Mário Fernandes Nery não imagina que ele foi, durante quatro décadas, um dos artífices das noites mais quentes que o carnaval curitibano já experimentou.

De gestos e fala contidos e estrutura corporal miúda, é mais fácil imaginá-lo atrás do balcão da loja de canetas tinteiro da Rua XV de Novembro em que, adolescente, começou a trabalhar no início dos anos 1960. Ou na oficina de impressão dos jornais Paraná Esportivo e Gazeta do Povo, onde era o responsável por fazer os clichês metálicos usados nas antigas prensas tipográficas daquele tempo. Mesma época em que conheceu sua vocação e métier que o mantém até hoje: fotógrafo profissional. "Sempre me preocupei com o lado comercial da fotografia. Minhas fotos, eu fiz para vendê-las", admite.

Virou um faz-tudo. Batizados, casamentos, discursos políticos. Fotografou as visitas dos ditadores Costa e Silva e Ernesto Geisel à cidade. Nos anos 70, foi a lente oficial de colunistas sociais como Toniolo, Charles, Dino Almeida... Visibilidade que o tornou o mais requisitado fotógrafo das "festas de bacana". Na década seguinte, era o fotógrafo oficial de grupos "da terceira idade" em viagens internacionais. "Rodei o mundo. Só a Israel foi onze vezes, conheço cada passo da Via Sacra", brinca. "A fotografia, esta profissão linda, me proporcionou tudo isso. "

Assim, é mais fácil imaginar Nery carregando sua grande mala de alumínio, onde cabiam as cubas de revelação e o ampliador, do que comandando nas madrugadas a festa profana do carnaval curitibano. A história mostra, no entanto, que de 1970 a 2010, Nery foi um dos responsáveis pela organização do Baile das Bem Boladas, a festa obrigatória dos domingos de carnaval de então.

A lenda das Bem Boladas nasceu no jornal Tribuna do Paraná. Foi ideia do chefe de oficina Barriga. Ele convocou os irmãos fotógrafos Mário e Jurandir Nery para organizar um "contraponto hétero" ao Baile dos Enxutos, o concorrido baile gay que acontecia no Clube Operário. A festa premiava a mais bela "pássara da noite curitibana, as cortesãs que trabalhavam nas dezenas de boates que funcionavam em Curitiba, região e litoral. Mesmo com a temática ousada, a sociedade curitibana da época, sempre tida como muita conservadora, adotou a festa.

Políticos, empresários, boêmios em geral a frequentavam e levavam as esposas, para conhecer um ambiente que era mais comuns aos homens da época. "Era disputadíssima, todo mundo queria ser jurado", recorda. O sucesso dos primeiros eventos na Sociedade Batel obrigou a organização a procurar locais maiores.

"É injustiça dizer que o curitibano não gosta de carnaval. A prova foi a longevidade da Bem Bolada ou o bloco Garibaldis e Sacis, hoje. Se fizer bem feito, o povo vai e gosta", avalia. Único remanescente do grupo que criou o evento-lenda, Nery se diz um ex-folião. "A formula se esgotou e deixou de ser atração. A cidade e a sociedade mudaram. A internet mudou o imaginário das pessoas. Mas é assim, cada coisa e pessoa tem seu tempo", filosofa.

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