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Contos: Um Tal Lucas. Julio Cortázar. Tradução de Paulina Wacht e Ari Roitman. Civilização Brasileira, 192 págs. R$ 25. |
Contos: Um Tal Lucas. Julio Cortázar. Tradução de Paulina Wacht e Ari Roitman. Civilização Brasileira, 192 págs. R$ 25.| Foto:

Em 1979, Julio Cortázar já era reconhecido como um dos maiores expoentes do conto e da prosa poética do século 20, um autor substancialmente original e inventivo. Nesse ano em que foram publicados os contos de Um Tal Lucas, relançado agora pela Civilização Brasileira, em homenagem ao seu centenário de nascimento, o argentino tinha em seu catálogo experiências estéticas suficientemente amplas.

Precursor do surrealismo na literatura hispano-americana, de Ficções a Jogo da Amarelinha, sua obra-prima em forma de labirinto, Cortázar recorria costumeiramente à fantasia, à aventura linguística e à fanfarronice – e um pouco de hermetismo, é verdade, sendo, contudo, essencialmente lírico e divertido. Uma certa disposição para envolver o leitor à sua maneira.

Um Tal Lucas é todo este universo latente com ainda maior tendência à zombaria. O personagem-título, inclusive, foi considerado, à época, o próprio autor refletido, o que, na verdade, não importa tanto assim: é um livro para olhos atentos e que gostam de surpresas.

Frangos

O Lucas-narrador é um sujeito um tanto libertino, sem lugar fixo no mundo, ora na França, ora na Argentina, ora em lugar nenhum. Ele divide pensamentos e sustos cotidianos. "Nesta época de retorno despenteado e turístico à Natureza, em que os cidadãos veem a vida do campo como Rousseau via o bom selvagem, eu me solidarizo mais do que nunca com: a) Max Jacob que, respondendo a um convite para passar o fim de semana no campo, disse entre estupefato e apavorado: O campo, esse lugar onde os frangos passeiam crus?"

O discurso de Cortázar é uma teia sem limites que ri de si mesma: "Pode-se esperar qualquer coisa da cultura nipônica, sobretudo quando tenta imitar a mexicana".

Rede de artifício

Criador nato, Cortázar aparece especialmente lírico, como quando nos revela, em "Caçador de crepúsculos", um projeto cinematográfico: "Se eu fosse cineasta me dedicaria a caçar crepúsculos. Já tenho tudo planejado, menos o capital necessário para o safári, porque um crepúsculo não se deixa caçar assim tão fácil. [...] De qualquer maneira, acho que se eu fosse cineasta daria um jeito de caçar crepúsculo, na verdade um único crepúsculo, mas para chegar ao crepúsculo definitivo teria que filmar quarenta ou cinquenta, porque se fosse cineasta eu teria as mesmas exigências que tenho com a palavra, as mulheres ou a geopolítica." É, como dizia o filósofo búlgaro Tzvetan Todorov, a literatura como esforço para dizer o que a linguagem comum não diz ou não pode dizer. GGGG

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