O escritor e editor Carlos Eduardo de Magalhães confessa não saber definir o que é poesia, "mas quando a vejo eu a reconheço". A afirmação é recorrente entre especialistas, poetas e leitores de poemas. A poesia, comenta o vendedor da Livrarias Curitiba Claudecir de Oliveira Rocha, "é um texto de Carlos Drummond de Andrade, de Manuel Bandeira ou de João Cabral de Melo Neto. Ou seja, a gente sabe o que é [poesia] quando lê um autor relevante."
Rocha, formado em Letras pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), há sete anos comercializando livros, conta que apenas poetas e professores universitários consomem poesia. Aqueles que prentendem entrar em uma universidade também acabam comprando livros de poemas que são indicados em concursos vestibulares este ano, entre os dez títulos indicados pela UFPR, apenas dois são de poesia: Poemas Escolhidos, de Gregório de Matos e Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles.
Compreensível?
Vendedor da Livrarias Curitiba, que trabalha na loja da Boca Maldita, Rocha afirma que há clientes que dizem não gostar de poesia "porque o gênero é incompreensível". O hermetismo da linguagem seria o motivo que afasta o leitor dos poemas? "A poesia tem de ser como o poeta acha que deve ser, hermética ou comunicativa", afirma Luís Augusto Fischer, da UFRGS. Alcir Pécora, da Unicamp, completa o raciocínio do colega gaúcho: "[A poesia] tem de ser consistente com seus próprios parâmetros de criação, não importa se compreensível para muitos ou não. Góngora, autor do século 16, não é compreensível, ainda hoje, para muitos. Stéphane Mallarmé (1842-1898) não é compreensível para muitos, mas muito do que se entende por poesia de qualidade, hoje, se deve a autores desse tipo: radicais em seus procedimentos de invenção."
Não ser compreendido é, enfim, até um direito dos poetas, mas Carlos Eduardo de Magalhães observa que, hermética ou compreensível, a poesia deve ter aquilo que chamam de "substância" e mantém um livro "em pé". "A literatura, em qualquer forma que se manifeste, é vazia sem uma ideia que a sustente, sem uma matéria-prima verdadeira que a legitime", finaliza Magalhães.
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As tardes
de sol sob a figueira
e o mate doce
de chuva o rosto
grudado na vidraça
a mesa
farta contudo simples
toalha branca
com flores
em ponto de cruz
louça de porcelana Schmidt
talheres com
o cabo de osso
as mãos
minha mãe bordando
guardanapos
de algodão
a saudade
uma xícara lascada
num canto
da cristaleira.
Poema, de Sergio Napp
Os demônios azuis já se foram
e da passeata do girassol
restam os dedos crispados
no teclado,
impotentes como o olho que,
arregalado,
tenta olhar para dentro.
O espírito é por demais
veloz.
Rafe, de Eloésio Paulo
Não sei bem onde foi que me perdi;
talvez nem tenha me perdido mesmo,
mas como é estranho pensar que isto aqui
fosse o meu destino desde o começo.
Perplexidade, de Antonio Cícero
não quero chegar aos cem anos
com saúde
tal qual o adolescente
feliz que nunca fui
só me sinto à vontade
enquanto faço a barba
ouvindo Nelson Cavaquinho
sem camisa e descalço
o barrigão à mostra
e viajando
nos sambas de Nelson Cavaquinho
Não Te Esqueças Que És um Palhaço, de Fabrício Corsaletti
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