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Prêtá-Porque estará em cartaz no TUC durante o Fringe | Divulgação
Prêtá-Porque estará em cartaz no TUC durante o Fringe| Foto: Divulgação

Na tarde de sábado (27), a Cia. Portátil tomou conta do palco da Escola do Ator Cômico com dois trabalhos opostos no apelo cômico que exercem sobre o público. Enquanto a leitura cênica de Relações – Peça Quase Romântica surtia risadas leves, o riso diante dos números circenses sombrios de Prêtá-Porque vinham carregados de incômodo.

Em Relações, que abriu a programação do Evento Portátil, se reconhece um ritmo de humor semelhante ao ditado pelo diretor Márcio Mattana ao lidar também com esquetes sobre relações amorosas na peça Aperitivos, que montou com a Pausa Companhia.

A dramaturgia do carioca Leandro Muniz, levada à cena pela Cia. Portátil, porém, é mais fragmentada. Recorta breves momentos de interação entre casais, destacando padrões nos relacionamentos e a constatação da incompatibilidade final entre duas pessoas – renegada, contudo, a cada nova paixão que se desperta.

Numa esquete, os atores Alan Raffo e Jussara Batista representam personagens que acabaram de consumar o desejo sexual. Ele se contém para não perguntar sobre seu desempenho, mas acaba ouvindo o que não queria: ela o achou "irregular". A gentileza inicial entre os dois cede lugar ao excesso de franqueza, que desemboca em animosidade até que a garota saque papel e caneta e explique (desenhando) ao rapaz cada vez mais interessado o caminho da sua satisfação. Transições como essas funcionam como gatilho para o riso, que chega fácil, pela identificação.

A direção de Márcio Mattana se aproveita do humor permitido pelas rubricas, contrariando expectativas. Quando dois atores se aproximam e se olham fixamente enquanto uma terceira voz anuncia que agora seus personagens se beijam com intensidade, mas eles permanecem imóveis, a zona de tensão criada entre os dois quase materializa a possibilidade. E a plateia reage.

O troca-troca de personagens e situações culmina em esquetes ágeis em que os quatro atores (Paulo Marques e a convidada Andrea Obrecht completam o elenco) enfileirados alternam farpas de discurso amoroso, multiplicando as vozes envolvidas de modo que já não importa mais quem diz, igualados todos nas mesmas tramas. Com tema tão simpático e abundante em eventos cômicos, e um elenco no domínio das intenções das falas, a experiência de submeter a peça ao público, como um teste do grupo para se decidir se deve montá-la, resultou bem-sucedida. Se algo pode ser ponderado é como torná-la menos inofensiva.

Incapazes

Inofensivo, ao contrário, é tudo o que não se pode dizer de Preta-Porque, o espetáculo apresentado em seguida (e que participará do Coletivo Pequenos Conteúdos, no Fringe), sob a direção de Rafael Camargo. No cenário escuro, significativamente sombrio, desenrola-se um show circense sobre a decadência humana. Em vez de exibir dotes excepcionais, é a incapacidade dos artistas que se revela tantos nos atos quanto nos personagens.

O que pensar de um homem de expressão vaga que escova os dentes, fuma e engole uma bolacha sem parar uma ação para começar a outra? Ou ainda de um vetríloquo que conversa com uma boneca estropiada a lhe contar sobre os abusos físicos que sofreu? O grotesco é oferecido com um peso de estranhamento revelador das limitações, esquisitices e preconceitos visíveis no lado mais ordinário e menos espetacular do ser humano, superando o humor barato, em favor de uma comicidade incômoda.

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