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Cineasta já considera escrever um segundo livro | Eric Gaillard/Reuters
Cineasta já considera escrever um segundo livro| Foto: Eric Gaillard/Reuters

Romance

Consumidos

David Cronenberg. Tradução de Cassio de Arantes Leite. Alfaguara, R$ 39,90. Lançamento no dia 1º de outubro.

Os elementos da história são bem usuais para quem está acostumado com o cinema de David Cronenberg: os protagonistas mantêm uma relação quase sexual com a tecnologia; um cirurgião bizarro aceita operar pacientes clandestinamente; há situações de canibalismo e automutilação, inclusive com uma personagem que se mutila para se canibalizar; e tudo isso é relata do com altas doses de horror e sensualidade, como se horror e sensualidade fossem complementares.

A diferença é que Consu­midos não é um novo filme de Cronenberg. É um romance, o primeiro da carreira do diretor canadense, um dos mais celebrados autores do cinema contemporâneo.

"Quando eu era jovem, sempre me imaginei como um escritor, nunca como cineasta. O que aconteceu é que acabei sequestrado pelo cinema. Mas então um editor me procurou em 2007 e perguntou se eu já havia considerado escrever um romance, alegando que meus filmes são muito literários. Minha resposta foi que pensei nisso durante 50 anos. E aceitei o desafio", explicou Cronenberg, em entrevista, por Skype, de sua casa, em Toronto.

Agora, depois de sete anos de trabalho, ele lança quase que simultaneamente nos Estados Unidos, Canadá, Europa, América Latina e outros mercados, seu romance Consumidos – no Brasil, o livro sai pela Alfaguara no dia 1.º de outubro. A obra está sendo divulgada ao mesmo tempo que Mapas para as Estrelas, o 21.º longa-metragem de Cronenberg, que só será lançado no Brasil em 2015, mas integra a programação do Festival do Rio, com exibição amanhã. O filme rendeu a Julianne Moore um prêmio de melhor atriz no último Festival de Cannes.

"Muita gente sugeriu que eu divulgasse Consumidos em eventos de cinema, mas eu tenho evitado. Não tenho certeza se o público do romance será o mesmo dos filmes", diz Cronenberg. "Mas entendo que é impossível separar meu cinema do livro. Só torço para que as pessoas leiam sem saber o que esperar. Gostei muito da experiência de escrever um romance, e agora pretendo fazer logo um segundo, sem filmes no meio. Ainda não parei para pensar na história, mas eu sinto que, inconscientemente, já sei sobre o que vou escrever. Só falta trazer à tona."

Definitivamente os mistérios sobre o inconsciente têm tudo a ver com a carreira de Cronenberg. Assim como o terror, a fantasia, o sexo, a relação homem-máquina, o consumismo ou também qualquer desgraça que possa assolar o mundo. Por filmes como Calafrios (1975), A Mosca (1986), Gêmeos – Mórbida Semelhança (1988), Marcas da Violência (2005) e Um Método Perigoso (2011), ele é considerado um diretor atormentado, alguém que vê o mundo através de uma lente sombria.

"Minhas histórias não são exatamente como as pessoas pensam. Elas têm humor, são amigáveis. O que acontece é que eu sou um dramaturgo, e se você focar apenas nas coisas amáveis e doces, você não terá muito drama para tratar num filme. George Bernard Shaw dizia que o conflito é a essência do drama. E nem é necessário ser um conflito físico", afirma Cronenberg.

Trama

Consumidos certamente tem o humor amigável que Cronenberg diz inserir em seus filmes. A história é narrada através do trabalho de dois jovens jornalistas, Naomi e Nathan, ambos fissurados em câmeras fotográficas, celulares, computadores e outros fetiches eletrônicos. Eles namoram, mas se encontram separados pela distância do trabalho: enquanto Naomi começa a história em Paris, apurando o assassinato de uma filósofa, supostamente canibalizada pelo marido também filósofo, Nathan está em Budapeste, acompanhando uma cirurgia ilegal para tratar o câncer de uma paciente.

"Volta e meia sou entrevistado por jovens jornalistas que são bastante interessados em tecnologia, e algumas vezes você sente que eles são muito profissionais e sabem do que estão falando, mas outras vezes parecem crianças que não têm a menor ideia de nada. São jovens adaptados à tecnologia, mas são ingênuos culturalmente. Acho que tirei a história daí", explica o autor.

"Em Consumidos, uma parte do debate é sobre o controle da realidade. A realidade é uma criação, nunca é absoluta, sempre é diferente para cada um. Com a internet, isso é mais claro: as pessoas criam para si novas realidades. Na internet, você pode morrer fisicamente e ninguém perceber que você morreu. Acho até que as pessoas tiram selfies para tentar se lembrar de que existem fisicamente", diz. "Então a ideia de se perder o controle de sua própria realidade, uma que você próprio criou, é um tanto assustadora, não?"

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