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O telespectador só vê os olhos - grandes, verdes, lindos - e ouve a voz-esnobe. "Você fica com a gente?", pergunta Celina (Nathália Timberg). "Não, eu viajo acompanhada. Reserve uma suíte presidencial num desses hotéis limpinhos, mas sem mendigos na porta", recomenda Odete Roitman (Beatriz Segall), na cena que vai ao ar hoje, na reprise de "Vale Tudo" no Canal Viva e que marca a volta à TV de uma das maiores, senão a maior, vilã da teledramaturgia.

Morta e enterrada depois de levar aquele tiro que, a gente já sabe, vai tirá-la de cena no capítulo 193 e instalar a dúvida "quem matou Odete Roitman?", a péssima senhora é esperada por notívagos saudosistas que fizeram da novela de 1988 um fenômeno de audiência da TV paga - é o programa mais visto no horário, 0h45, e ainda movimenta as redes sociais, que repercutem suas cenas madrugada adentro.

Em frente à TV também está o autor Gilberto Braga, que escreveu a trama ao lado de Aguinaldo Silva e Leonor Bassères. "Vi os primeiros capítulos, a sensação é boa. O sucesso vem do fato da novela ser boa, a história prende e os personagens são muito fortes", analisa ele, em entrevista, afastando qualquer comparação com as tramas atuais e as ideias de falência do gênero.

Braga não precisa de falsa modéstia, porque é notória a importância de "Vale Tudo" para a história da TV, não só pela qualidade do texto e das interpretações, mas também por ser um espelho bastante realista daqueles primeiros anos da abertura política, quando a identidade do País era questionada. Um ano antes da que seria a volta do voto direto para presidente, 1988 foi o momento perfeito para a novela perguntar "vale a pena ser honesto no Brasil?", dúvida ilustrada pela história de Raquel (Regina Duarte), mulher recém-separada e batalhadora que leva um golpe da filha ambiciosa, Maria de Fátima (Gloria Pires). Não foi a primeira novela a usar temas atuais - lembremos de Roque Santeiro (1985) -, mas a que fez isso de maneira mais contundente, num primeiro plano.

Alcoolismo, homossexualismo, corrupção e outros temas pouco frequentes na televisão da época foram usados com a polêmica no volume máximo para compor os personagens da novela. Talvez seja por isso que a trama pareça tão atual, apesar do salto de qualidade de imagens que a TV teve nestes 20 anos e das mudanças na moda e de costumes. "Certas coisas soam estranhas, por exemplo, as roupas femininas, era a moda oversize", diz Gilberto. "Também estou achando que o texto sobrevive. Às vezes acho didático demais, mas nada é perfeito."

Prestes a estrear "Insensato Coração", que vai substituir a "Passione" de Silvio de Abreu na metade de janeiro, Gilberto Braga sabe que "Vale Tudo" é referência carregada de responsabilidade, mas nunca se preocupou com a possibilidade de a novela se tornar um fantasma na sua carreira, a persegui-lo e gerar comparações com o que ele escreve hoje.

"Nunca senti que isso tenha acontecido comigo. E adoro quando a novela provoca discussão", garante ele que, no entanto, não se anima a lançar uma nova versão para a história de Raquel. "Prefiro que não tenha remake, porque seria difícil reunir um elenco como aquele."

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