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Juan Villoro é expoente da literatura latino-americana contemporânea: texto vigoroso e narrativa tensa | Divulgação
Juan Villoro é expoente da literatura latino-americana contemporânea: texto vigoroso e narrativa tensa| Foto: Divulgação

Romance

Arrecife

Juan Villoro. Tradução de Josely Vianna Baptista. Companhia das Letras, 240 págs., R$ 39,50.

Um dos seriados televisivos mais populares nas décadas de 70 e 80 foi A Ilha da Fantasia, cujo pressuposto básico era oferecer aos hóspedes de um resort paradisíaco a possibilidade de viver experiências que dificilmente teriam a chance de tornar realidade em seu dia a dia. Era um programa leve, destinado à família, e geralmente lidava com edificantes histórias de redenção, com pitadas de humor. O recém-lançado romance Arrecife, do escritor mexicano Juan Villoro, convidado neste ano da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), tem alguns pontos em comum com essa ideia escapista. Só que em uma versão infinitamente mais sombria.

Na costa do Golfo do México, no passado habitada pelos maias, La Piramide é um hotel de luxo, destinado a turistas que buscam quebrar suas rotinas, se expondo a situações de perigo. A qualquer momento podem ser sequestrados por guerrilheiros, sofrer ameaças de bandidos do narcotráfico, ou se perder em excursões pela floresta tropical, travando contato aparentemente direto com a exuberante flora e fauna da região, vivenciando a sensação de que correm alto risco. Tudo milimetricamente calculado para que cheguem, em alguns momentos, ao limite do pavor, mas sabendo que a simulação, por mais realista que pareça, terminará antes que o pior aconteça.

Os hóspedes de La Pira­­­mide são turistas europeus e norte-americanos, ou de outras regiões afluentes do planeta, entediados com a estabilidade de suas vidas. Buscam os perigos oferecidos pelo resort para abalar o tédio em que estão imersos. Tudo o que se propõem a viver é falso, mas a realidade que margeia o hotel, não. E essa violência latente, que pulsa para além dos muros de La Piramide, aos poucos a invade, misturando-se ao que é meramente encenado. E sem que ninguém se dê conta. Aparentemente.

À deriva

Os personagens que trabalham no resort são pessoas à deriva, que buscam fugir do passado ou uma chance de recomeçar. A norte-americana Sandra, instrutora de ioga e de kung-fu tibetano, tem um passado de drogas e prostituição, e vive ilegalmente no México. Tony, o narrador, é um roqueiro encarregado de criar sistemas de som ambiente para o imenso aquário do hotel. Ele tem dificuldades para lembrar experiências que viveu e depende de seu ex-parceiro de banda, Mario, agora gerente de La Piramide, que se enxerga como espécie de guru new age. Ginger, outro americano, é um mergulhador e integrante de um clube de esportes radicais que funciona dentro do resort, chamado Cruci/Ficção.

Quando o mergulhador, um sujeito de que todos gostam, aparece morto, e ninguém sabe ao certo como seu assassinato ocorreu, a divisão entre realidade e encenação começa a desmoronar.

Com um texto vigoroso, permeado de flashbacks, que aos poucos vão dando pistas sobre como os personagens chegaram aonde estão, a narrativa de Villoro é sempre tensa, nervosa, cheia de referências e jogos frasais que brincam com a percepção do leitor. Propositalmente, o escritor, um dos mais festejados da literatura latino-americana contemporânea, brinca com os limites entre realidade e representação. GGGG

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