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Disco de Gaby faz uma série de referências que unem a Amazônia à tecnologia | Dudu Maroja/Divulgação
Disco de Gaby faz uma série de referências que unem a Amazônia à tecnologia| Foto: Dudu Maroja/Divulgação

"O que mais me orgulha é que o Treme consegue agradar à galera mais underground, mais cult e formadora de opinião, mas é um disco popular. É um disco que o povão entende e a galera ‘mais pensante’ também."

Gaby Amarantos, cantora.

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Serviço

CD

Treme

Gaby Amarantos. Som Livre. R$ 14,90. Pop. GGG

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Ouça também

Kitsch Pop Cult

Felipe Cordeiro. Na Music. R$ 19,90. Pop.

O cantor, compositor e instrumentista paraense Felipe Cordeiro também faz uma espécie de panorama da cultura do Pará em seu segundo álbum, Kitsch Pop Cult, lançado no início do ano. O músico une tradições de seu estado, como a guitarrada e o tecnobrega, a outras referências da música brasileira, como a Vanguarda Paulista, em uma síntese que questiona os conceitos do título do CD.

Desde abril a música "Ex Mai Love" é o cartão de visitas diário do álbum Treme, de Gaby Amarantos, em rede nacional. O brega em roupagem moderna está na abertura da novela Cheias de Charme, da Rede Globo – uma das ações de aproximação da emissora com a emergente "nova classe média", que se tornou público preferencial.

Não é tão simples, no entanto, atribuir a atenção que o álbum vem ganhando desde que foi lançado, no mês passado, a um fenômeno segmentado. Treme se destaca entre os produtos da efervescente cena do Pará que vêm atraindo os olhares do país há mais de uma década (seja pela popularidade de bandas como o Calypso, seja pelo interesse acadêmico que se tornaram ao representar expressões culturais da periferia e ao romper com o mercado fonográfico tradicional quando absorveram a pirataria às suas estratégias de divulgação).

AUDIO: Ouça a cantora Gaby Amarantos falando das ideias do projeto gráfico e de cada canção de Treme

O disco de Gaby Amarantos representa tudo isso, mas conseguiu mais. A paraense, que ficou conhecida como a Beyoncé do Pará no programa do Faustão, caiu nas graças de importantes críticos de música e de um público tipicamente fechado à música popular francamente comercial.

Pop brasileiro

Gaby, o diretor artístico, Carlos Eduardo Miranda, e os produtores Luiz Félix Robatto e o DJ Waldo Squash uniram uma síntese representativa do Pará com uma sonoridade pop com muitos méritos. Estão ali as marcas da música popular paraense: a fusão do Caribe com o norte do Brasil, a mistura de carimbó, cúmbia, merengue, tecnobrega, eletromelody (versão mais pesada e acelerada do anterior), a sonoridade estridente e pesada das aparelhagens (as tradicionais festas eletrônicas que misturam música e efeitos visuais futuristas). Enfim, as bases da peculiar mistura criada com múltiplas referências e material escasso.

E também um verniz pop que é, ao mesmo tempo, sofisticado e despretensioso, descontraído e rico musicalmente. Com mais recursos, Treme foi concebido com bons timbres e banda ao vivo – o que, aliado à poderosa voz de Gaby, representa um salto em relação à sonoridade do tecnobrega rudimentar que é consumido em ritmo frenético em Belém.

"É um pop brasileiro. Talvez seja o primeiro pop brasileiro de verdade", diz Gaby, em entrevista por telefone para a Gazeta do Povo. "Sem querer fazer o que todo mundo estava fazendo, fizemos algo muito autêntico, muito nosso. Que era muito roots, mas que ganhou uma sonoridade internacional. Em qualquer lugar do mundo o Treme vai ser compreendido. Embora seja em português, ele quebra fronteiras musicais, porque tem uma sonoridade muito peculiar", diz a cantora.

Foram cerca de cinco anos entre a ideia de fazer um disco com Miranda – que abordou Gaby na época da banda que a projetou regionalmente, a Tecno Show, criada em 2002 – e o "laboratório" que gerou o disco. As músicas foram escolhidas aos poucos. "Xirley", gravada em uma mistura de tecnobrega com cúmbia, foi ouvida pela cantora em um carnaval no Recife. "Ex Mai Love", de Veloso Dias, foi sugerida por Robatto. "Mestiça", uma das mais interessantes do disco, foi feita por Dona Onete, da velha guarda do Pará, especialmente para Gaby – descendente de escravos, portugueses e índios que é. "Meu amor eu sou nativa/ Cativa, cativa, cativa eu não sou", diz a letra.

Significados

O orgulho da mestiçagem é apenas um dos significados culturais mais amplos que Gaby inseriu em Treme. As temáticas das letras, sensuais e festeiras, trazem uma forte postura feminina. Em "Pimenta com Sal", que tem participação de Fernanda Takai, a afirmação da diversidade é contundente. "Quem viu uma preta e uma branca/ De mãos dadas na praia/ Provocando frisson".

"Fernanda Takai é meu oposto", explica Gaby. "Por isso quisemos convidar a Fernanda e mostrar a abrangência que o estilo pode ter, a relação com todas as tribos", diz.

Discurso legítimo para uma mulher que, dentro de seus próprios padrões de beleza, se apresenta como um desafio a ser assimilado.

"Acho que o Brasil está cansado de ver Barbie. O Brasil que ver gente de verdade, para poder se identificar com um diferente padrão musical, estético, comportamental, pensante. Isso causa questionamentos."

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