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São Paulo – O chileno Jorge Durán, radicado no Brasil desde 1973, levou 20 anos para realizar seu segundo longa-metragem, Proibido Proibir, em cartaz na 30.ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Tempo demais para um homem de cinema, ainda mais se levarmos em conta que seu filme anterior, A Cor do Seu Destino, foi um êxito de público e crítica na década de 80, premiado em festivais nacionais e internacionais, como Brasília, Havana (Cuba) e Cartagena (Colômbia).

Explicações para esse hiato de duas décadas são muitas, mas não exatamente objetivas. Vão desde a escassez de recursos que viabilizassem um novo projeto até um suposto boicote imposto ao diretor depois de ele afirmar, quando do lançamento de seu primeiro longa, que "odiava os homens de direita", tanto os do Chile, responsáveis por seu exílio no Brasil, quanto os daqui, que cerceavam a criação artística e intelectual com sua truculência. A verdade precisa talvez ninguém saiba, nem o próprio diretor, que prefere agora se concentrar no presente e no futuro. E com razão: Proibido Proibir é um filme e tanto.

Pai de cinco filhos e professor de Cinema em duas instituições cariocas, a Universidade Gama Filho e a escola livre Darcy Ribeiro, Durán é fascinado pelo universo jovem. Tanto que quis investigar em seu novo filme os valores, desejos, ambições, frustrações e ansiedades de três universitários que buscam respostas para muitas perguntas.

Em entrevista exclusiva ao Caderno G, Durán diz que discorda de quem afirma que a nova geração de brasileiros seja alienada, desinteressada e individualista demais. Embora concorde que todas essas características sejam traços presentes em quem tem menos de 30 anos, essa geração é bem mais complexa do que se supõe: "Convivo com essas pessoas e percebo que, apesar de serem menos politizadas, elas pensam, gostam de estudar, de ler. Sentem, se apaixonam e, sobretudo, temem pelo futuro do país".

Para provar sua tese, o diretor criou um trio muito interessante de personagens. Paulo (Caio Blat, em ótima atuação) é um estudante de Medicina cuja filosofia de vida dá nome ao filme, "É proibido proibir". Essa postura lhe confere o direito de se drogar, seguir seus instintos sem maiores conseqüências e, principalmente, esconder suas verdadeiras emoções por trás de uma fachada de cínismo e irreverência. Seu melhor amigo, o estudante de Sociologia Léon (Alexandre Rodrigues, de Cidade de Deus), é seu oposto: politizado, ele acredita na transformação da realidade por meio do engajamento em causas justas. O terceiro vértice do trio é Letícia (Maria Flor, de Quase Dois Irmãos e da novela Belíssima), estudante de Arquitetura que namora Léon, mas se sente atraída por Paulo, que também se envolve com ela e se vê dividido entre essa afeição e a lealdade ao amigo, com quem divide a casa.

Mais do que a história de um triângulo amoroso, contudo, Proibido Proibir é um estudo sobre as expectativas de três representantes de uma mesma geração, que se defrontam com um país esfacelado, sem perspectivas. Paulo, por meio da Medicina, não acredita nem em Deus e nem no Estado, que sujeita os pacientes que atende à indigência da saúde pública brasileira. Léon, por sua vez, acredita compreender a complexidade do mundo real por meio de suas pesquisas em uma periferia do Rio de Janeiro, até ser surpreendido por uma realidade de violência, desmandos e injustiças bem mais cruel do que imaginava. Por último, o olhar de Letícia vaga por uma cidade que, apesar de bela, revela-se arrasada pelo abandono físico e pela miséria que a corrói aos poucos.

Durán conta que fez questão de, por meio desses personagens, analisar o perfil ético de uma geração que tenta acertar, mas muitas vezes erra pela falta de referências e de informações. Aos 64 anos, o diretor ri ao dizer que não tem a pretensão de saber tudo sobre os jovens de hoje. Para não cair no risco da artificialidade, apelou para o convívio com seus alunos, que lhe serviram de fonte para reforçar o grau de autenticidade dos diálogos e das situações retratadas pelo filme: "Leio muitos roteiros. Bons, médios e ruins. Mas todos me fornecem um material valioso no que diz respeito à forma de falar, de enxergar a realidade".

Esses mesmos alunos também trabalharam na produção. Enquanto os estudantes da Gama Filha fizeram o making of do filme como uma espécie de trabalho de conclusão de curso, os da Darcy Ribeiro atuaram no set de filmagem, desempenhando as mais diversas tarefas.

Rio Zona Norte

Ao contrário da maior parte das produções realizadas no Rio de Janeiro, Proibido Proibir não se passa na Zona Sul ou nas favelas da região. Por uma questão de coerência com a história que pretendia contar, os personagens centrais do filme, universitários sem muito dinheiro, vivem em um bairro do subúrbio carioca, a Penha.

Sobre a experiência de rodar o longa-metragem na região, Durán diz ter apenas elogios. "Se você vai filmar num bairro da Zona Sul, tem de pagar para o prédio, conseguir a autorização do síndico, interditar a rua, apelar para a polícia para garantir que a coisa vai acontecer. Na Zona Norte, não. As pessoas se entusiasmaram em fazer parte de um projeto de cinema e abriram suas casas e estabelecimentos", conta.

Essa opção de mostrar um outro Rio também teve seus motivos econômicos. Proibido Proibir é um filme de baixo orçamento. Custou aproximadamente R$ 1,1 milhão, levantados graças a um prêmio recebido do Ministério da Cultura, mais recursos de um prêmio recebido na Espanha, que viabilizou sua finalização em Madri. Outro prêmio, concedido pela Petrobrás, ajudará no lançamento do longa.

Elogiado por onde passou, Proibido Proibir já traz no currículo prêmios de melhor filme no Festival Ibero-Americano de Biarritz (França) e melhor direção no Festival Internacional de Valdivia (Chile). Também foi selecionado para a mostra competitiva de Havana.

Durán garante que está em vias de fechar um contrato de distribuição, mas prefere não adiantar os detalhes. O lançamento de Proibido Proibir deve acontecer em março ou abril de 2007.

O jornalista viajou a convite do evento.

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