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O biotecnólogo Jesse Simiyu Machuka, 42 anos, professor da Kenyatta University, em Nairóbi, no Quênia, fez o primeiro test-drive no sistema de emergência das conferências da ONU (Organização das Nações Unidos) sobre biodiversidade e biossegurança. No início da tarde desta quinta-feira, ele teve um enfarte no banheiro do Expo Trade de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, e mobilizou de corpo médico a diplomatas. As informações são de que Jesse passa bem e está internado na Santa Casa de Misericórdia. Dois dias antes, em companhia da cientista filipina Desiree Hautea, 50 anos, o queniano deu entrevista à Gazeta do Povo. Ambos trataram das pesquisas que desenvolvem, da polêmica dos transgênicos e falaram de suas primeiras impressões sobre o Brasil.

Desiree Hautea, logo que desceu no Aeroporto Afonso Pena, teve a certeza de estar desembarcando num lugar absolutamente diferente de tudo o que conhecia. Nenhum problema com as placas indicativas nem com o atendimento aos participantes da MOP3. Difícil, para valer, foi definir um brasileiro típico. Logo descobriu que se trata de uma espécie de difícil catalogação. "Eu me impressionei com a biodiversidade física de vocês", disse a professora de Genética, Horticultura e Agronomia da Universidade Los Baños, de Laguna.

Jesse Machuka não estranhou tanto o perfil dos moradores do Brasil. A pátria em que os quenianos costumam reinar na Corrida de São Silvestre lhe pareceu familiar. Complicado, desde a chegada, foi encontrar uma camiseta do jogador e futebol Ronaldinho Gaúcho – encomenda do filho.

Machuka e de Desiree integram uma tribo muito particular dentro da reunião em que se discute o Protocolo de Cartagena. São observadores. Não têm direito a voto, a participação é discreta, mas ao voltar para casa terão a tarefa de virar o encontro do avesso junto a colegas de universidade e governos. Obviamente, as impressões de ambos sobre o país da COP/MOP não vão passar batido quando tiverem de reproduzir entruncados debates sobre rotulagem, carga e identificação de produtos geneticamente modificados. Uma dessas impressões que ficam é a rejeição da população brasileira à palavra "transgênico". Jesse e Desiree estranharam, pois em seus países a biotecnologia é vista como salvação da lavoura. Confira os principais trechos da entrevista.

Como anda a pesquisa em seu país?Desiree M. Hautea – A pesquisa biotecnológica em meu país nasceu com a intenção de multiplicar os alimentos. Depois passamos das pesquisa de tecidos para a produção dos transgênicos. Primeiro foram plantas, arroz, banana, berinjela, tomates, papaia, milho e algumas pesquisas com microorganismos. Pesquisamos também vacinas para doenças. Queremos criar uma planta que tenha propriedades farmacológicas, que as pessoas comam como se estivesse tomando uma vacina. As Filipinas também estão participando da pesquisa do arroz dourado.

Jesse Machuka – Estudo cultura de tecidos e faço pesquisa molecular para conter os danos da devastação. Há incentivo do governo e participo de um projeto que tem apoio da Fundação Rockefeller. Estamos desenvolvendo uma mandioca sem toxinas e com mais proteína.

O que a experiência de vocês pode contribuir para a MOP3?Desiree M. Hautea – Sou professora de Genética, Horticutura e Agronomia. Trabalho com melhoramento das culturas, usando biotecnologia e técnicas tradicionais de meu país. Pesquisamos as duas frentes. Como as Filipinas ainda não são signatárias do Protocolo de Cartagena, mas seguem procedimentos reguladores da biossegurança desde 1999, vim para ouvir as experiências de outros países e levá-las ao conhecimento do governo e dos pesquisadores da universidade.

Jesse Machuka – A MOP nos ensina que é importante respeitar os cientistas e que não tem só multinacional pesquisando. A Embrapa, por exemplo, goza de alto conceito no mundo todo. No meu país, 80% da população vive no campo, depende da terra. Nosso problema fundamental é desenvolver culturas resistentes à seca e ao solo maltratado. Nossa lei de biossegurança começou em 1998, mas o transgênico não é usado na alimentação.

Como a população reage aos transgênicos?Desiree M. Hautea – Há controvérsias. As discussões existem, à semelhança no Brasil, mas o ponto de vista é diferente. A aceitação dos transgênicos é maior, talvez porque nas Filipinas há uma tradição de ver os cientistas como fontes para o desenvolvimento do país. Exatamente por isso o governo concordou em adotar a biotecnologia. Nosso maior problema é a população ser muito grande e a área pequena. Temos de incentivar a produção e as pesquisas com transgênicos podem ajudar.

Jesse Machuka – Nosso povo come milho transgênico da Argentina e da África do Sul. E há pesquisas locais em desenvolvimento sobre mandioca, milho, sorgo e batata-doce. Não há um debate violento, nem político. A preocupação é com a saúde."

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