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Crítica americana viu nos caldeirões de terracota e tripés de aço alusões aos alquimistas da Idade Média | Gabi Carrera/ Divulgação
Crítica americana viu nos caldeirões de terracota e tripés de aço alusões aos alquimistas da Idade Média| Foto: Gabi Carrera/ Divulgação

Ao exibir as esculturas de sua série From La Voie Humide na galeria nova-iorquina Luhring Augustine, em maio deste ano, a mesma à qual pertencem as peças que expõe, agora, na Galeria Mendes Wood, o artista pernambucano Tunga surpreendeu a crítica americana, que chegou a comparar seu trabalho ao do mítico artista alemão Joseph Beuys (1921-1986).

Há, de fato, algo que liga a obra dos dois, no sentido de que ambas são construídas por meio da conjunção dos mais disparatados materiais e objetos.

Tunga, aliás, acredita, como Beuys, que a matéria está marcada para transcender, que está mesmo amalgamada com sua essência imaterial na forma da consciência.

Beuys exprimia sua crença no transcendental por meio da escolha do material – feltro e banha, basicamente, por causa da experiência pessoal do alemão (seu avião foi abatido na guerra e ele foi envolvido por tártaros em feltro e banha, salvando-se do rigoroso inverno da Crimeia). Tunga vai além do trauma existencial. Volta a Plotino e à alquimia para criar corpos inspirados pela energia da conjunção que animou os protocientistas do passado a buscar o elixir da vida eterna.

Como ciência oculta, a alquimia vive do mistério. Seus textos são herméticos, cifrados – e por vezes contraditórios. O título da exposição de Tunga faz referência à "via úmida", uma das duas técnicas básicas que os alquimistas do passado usavam para transformar a matéria (a outra chama-se via seca, mais arriscada). Na via úmida, o orvalho é usado para umedecer a matéria-prima, tendo o sal como dissolvente e o enxofre como princípio ativo, masculino (o feminino é o mercúrio, volátil). Quando ambos se encontram, o coito é inevitável – e dele surge a vida. Nas esculturas da exposição, o espectador verá não apenas pedras de enxofre como pérolas, cristais, dedos, orelhas e outras parte do corpo, como se entrasse no laboratório de um alquimista iluminado. E é esse o papel que Tunga tem na arte contemporânea – reconhecido, aliás, mundialmente (só este ano ele faz quatro exposições, três delas no exterior).

Alquimistas

A crítica americana viu nos caldeirões de terracota e tripés de aço alusões aos alquimistas da Idade Média, mas não só. Relacionou as formas de Tunga à sintaxe visual dos surrealistas, especialmente do escultor alemão Hans Bellmer (1902-1975), só porque a insubordinação de ambos tem na sexualidade quase explícita um meio de expressão (Bellmer usava bonecas eróticas para incomodar burgueses escandalizáveis). Tunga, evidentemente, não é Bellmer. Suas referências são mais eruditas. Há ecos da filosofia grega, da literatura de Lautréamont, dos desenhos e escritos do visionário William Blake, da poesia de Rimbaud, do cinema de Pasolini e, se alguém estiver em busca de uma referência escultórica, de Louise Bourgeois.

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