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Visões pessimistas da Humanidade marcaram o programa do 71º Festival de Veneza ontem, sétimo dia de competição pelo Leão de Ouro. Ambientada nos últimos momentos da Segunda Guerra Mundial, nas Filipinas, Nobi (Fires on the plain, no título para o mercado internacional), do japonês Shinya Tsukamoto, é a mais chocante delas, por mostrar o aspecto literal da carnificina dos confllitos armados. O sueco A pigeon sat on a branch reflecting on existence, de Roy Andersson, por outro lado, forneceu o contraponto tragicômico ao tema, ao dramatizar dezenas de situações que realçam o caráter grotesco do comportamento humano.

Fires on the plain é uma adaptação do livro de Shohei Ooka, lançado em 1951, que descreve os horrores da guerra a partir das memórias de um escritor que serviu no front. A trama é contada a partir do ponto de vista do soldado Tamura (Tatsuya Nakamura) que, nos momentos finais do conflito, quando o exército japonês perdia terreno rapidamente para os aliados, é abandonado à própria sorte por seu pelotão. Em sua desesperada tentativa de manter-se vivo no meio da selva filipina, Tamura conhecerá o inferno na Terra, enfrentando tuberculose, fome e até a tentação do canibalismo.

"No romance de Ooka, a prática do canibalismo entre os soldados japoneses é um tema importante. Ele chega a descrever em detalhes como eles cortavam os membros de um corpo." explicou Tsukamoto, que é conhecido no circuito de festivais por suas experiências em filmes de gênero, como o thriller de ficção científica The ironman (1989). " Mostrar a realidade da guerra, por mais nauseante que seja, é uma maneira de deixar explícito que o nível da degradação física, mental e moral dos homens no conflito mundial foi terrível".

O filme de Andersson defende a sua tese sobre a falência da sociedade pelo viés da ironia e do humor. São 39 situações em que o cineasta sueco convida o espectador a um passeio da tragédia humana. Há a velhinha em seu leito de morte que não larga a bolsa em que carrega suas joias mais preciosas; a professora de dança flamenca que revela sua afeição tocando o corpo de um de seus alunos durante a aula; os dois apáticos vendedores de bugigangas cômicas, que oferecem seus produtos nos lugares mais inesperados; e um executivo desesperado interrompe o suicídio para atender um telefonema de boas novas.

"Não odeio gente, o que odeio é a estupidez dos seres humanos que, em geral, é resultado da falta de conhecimento ou de empatia com os outros " comentou Andersson. " Levei quatro anos para filmar. Rodei tudo em Estocolmo e nos arredores, mas as situações mostram o que está acontecendo no mundo inteiro. Algumas delas podem parecer muito cruéis, reconheço, mas expressam alguns dos meus mais profundos receios".

A "pigeon sat on a branch" é, supostamente, o terceiro capítulo de uma trilogia em que o diretor convida o espectador a refletir sobre a própria existência, iniciada com Canções do segundo andar (2000), e Vocês, os vivos (2007). Todas as situações seguem um mesmo padrão de encenação: cenário e figurinos de cores monocromáticas, personagens de fisionomia pálida, e a ação transcorrendo dentro de um quadro fixo.

"Não gosto de filmar como se estivesse contando uma história, mas como se pintasse um quadro", comentou o diretor.

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