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Apresentação foi em playback e durou cerca de 20 minutos: fenômeno excêntrico | Natasha Bagatoli/Divulgação
Apresentação foi em playback e durou cerca de 20 minutos: fenômeno excêntrico| Foto: Natasha Bagatoli/Divulgação

"Bufffffffffffffffffffff". Entro no porão do Wonka, na última sexta-feira, e esse é o primeiro som que ouço antes do show de Gretchen, senhora de 52 anos que nunca perdeu o rebolado. Uma parede de calor quase palpável apunhala quem se aventura a chegar perto do palco. "Bufffffffff". Alguns hesitam, limpando a testa com a costa das mãos, também já suadas. Outros entendem que aquele inferno momentâneo faz parte do contexto. Mesmo que – saberiam em pouco tempo – não pudessem ver quase nada da performance da carioca, eterna intérprete de "Conga, Conga, Conga".

Confira a entrevista de Gretchen no Blog do Caderno G.

"Diva!, diva!". Gritos a anunciam. Gretchen veste uma calça jeans justíssima que parece feita sob medida para suas proporções generosas. E uma blusa tie-dye, que igualmente deixa à mostra a abastança frontal. Fora do palco, a estratégia é acompanhar a performance através de máquinas fotográficas alheias, já que, sobre ele, só se vê um movimento pendular dos cabelos da grande atração da noite, três seguranças suando às bicas e dois fotógrafos que não têm lá muito espaço para seus registros.

De repente abre-se espaço para alguém que sai carregado – pressão baixa. Enquanto o teto pinga e as paredes escorrem, uma moça tenta desesperadamente algum contato mais direto com a cantora. Como outros, se segura no forro e se apoia na ponta dos pés. Talvez ela não soubesse que a Maria Odete Brito de Miranda tem 1 metro e 58 centímetros. Seus privilégios são horizontais, não verticais.

Então "I’m Cool", nova música da artista, ressoa abafada enquanto se forma uma espécie de corredor no porão do estabelecimento. Entra-se pela direita, com a expectativa de chegar ao meio e poder ver algo daquele estranho show. Com o empurra-empurra e principalmente devido ao calor de um Saara ao meio-dia, cria-se uma forma indireta e amigável de revezamento, em direção à saída do lado oposto. O "rito de passagem" durou pouco mais de vinte minutos, mesmo tempo que a apresentação da Rainha do Bumbum.

Todo o show aconteceu em playback. Biquinhos afrancesados acompanhados de gritinhos diversos surgem durante "Melô do Piripipi"; e em "Freak Le Boom Boom", alguns tentam em vão dançar com mais, digamos, desenvoltura.

Gretchen saiu da casa pouco tempo depois, escoltada por quatro seguranças que repetiam com firmeza "licença!, licença!, licença!". Da janela, pôde-se notar a alegria irônica de um fã, que não conseguiu entrar e mesmo assim roubou um autógrafo. Gretchen entrou pela porta de trás em um carro grande e novo, mas o frisson continuou na fila interminável que se formou depois do show.

Apelo

O tempo de espera para pagar foi maior do que o show de Gretchen, e também um bom momento para se tentar entender o tipo de apelo que tem uma artista como ela, capaz de reunir um público tão distinto em um espaço curitibanamente alternativo. Isso porque, lado a lado, havia uma senhora de vestido florido que exibia um disco da cantora – provavelmente ela nunca havia pisado lá – e um rapaz maquiado, dizendo que tinha achado tudo aquilo incrível, inesquecível.

Perto do banheiro, os desavisados. "Sabia que a Gretchen estava aqui?", perguntou um garoto vestido de xadrez. "Gretchen? Aquela?", devolveu outro, surpreso. Nenhuma dessas pessoas, ensopadas de suor, reclamou do pouco tempo de show. Tampouco da fila na hora de ir embora.

Sabe-se que a situação da "diva" não anda lá aquelas coisas. Recentemente Gretchen trabalhou como garçonete para promover um restaurante em Orlando, nos Estados Unidos.

No Brasil, a irmã de Sula Miranda, com trinta anos de carreira, agora parece ser tratada como um fenômeno mais folclórico do que artístico. A aparência artificial, o pouco tempo de show e todo infernal quiproquó que ela proporcionou naquela noite comprovam que Gretchen está – ou sempre esteve – em gloriosa decadência. Mas, para a alegria de alguns, ainda rebolando.

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