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Livro

Por onde anda Christiane F.?

Em nova biografia, a junkie alemã que causou polêmica no fim dos anos 1970, conta o que fez de sua vida nas últimas três décadas

Christiane, aos 18, pouco antes de voltar a usar heroína | Divulgação
Christiane, aos 18, pouco antes de voltar a usar heroína (Foto: Divulgação)
Hoje, aos 52: mal de saúde e à sombra da junkie-star |

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Hoje, aos 52: mal de saúde e à sombra da junkie-star

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"Ainda está viva? Continua drogada?" Essas são as primeiras perguntas que vêm à cabeça quando o assunto é Christiane Vera Felscherinow, a famosa junkie alemã eternizada pela chocante biografia Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada, Prostituída.... Publicada em 1978, a obra escrita pelos jornalistas Kai Hermann e Horst Rieck a partir de depoimentos de Christiane vendeu mais de 4 milhões de exemplares pelo mundo, foi traduzida em inúmeras línguas, adaptada para o cinema e é até hoje um dos livros de não ficção mais lidos do mercado alemão.

A biografia, que narra passo a passo o envolvimento de Christiane com as drogas pesadas quando ela tinha entre 12 e 15 anos, transformou a então menina em uma espécie de anti-heroína. Após o lançamento do filme Christiane F., em 1981, sua fama ficou ainda maior. O mesmo aconteceu com a sua conta bancária – no dia em que completou 18 anos de idade, ela teve acesso a cerca de 400 mil euros.

O que aconteceu com ela desde então – sim, ela está viva! – é narrado com a mesma crueza no recém-lançado Eu, Christiane F., a Vida Apesar de Tudo. Escrita em parceria com a jornalista alemã Sonja Vukovic, de 29 anos, a obra segue os percalços vividos por Christiane, que (respondendo à segunda pergunta que abre este texto) nunca conseguiu se livrar definitivamente de seu vício em heroína.

Hoje, Christiane tem 52 anos e vive em um apartamento em Berlim, na companhia de seu cachorro Leon, um chow-chow. Tem o fígado inflamado desde 1989, é portadora de hepatite C, sofre dores terríveis com biópsias constantes e passa dias sem levantar da cama por causa de uma fibrose. Precisa ir sete vezes por semana ao médico para receber sua dose de metadona (narcótico para tratamento de toxicodependentes) e sente-se constantemente perseguida por pessoas que, segundo ela, abrem suas correspondências e revezam-se em turnos para vigiá-la. "Nesses dias, como gostaria de nunca ter experimentado drogas, nunca ter tido a sensação maravilhosa de uma picada – pois é o preço que se paga", diz, resignada.

Ser parada por pessoas nas ruas para dar autógrafos e tirar fotos é algo que nunca deixou de fazer parte de sua vida. "Meu Deus, eu sou e vou continuar sendo uma junkie-star. Um animal de feira. Um bicho raro, da espécie ‘criança da estação do Zoo’", reclama.

Indas e vindas

O primeiro livro de Chris­tiane termina com sua família no auge do desespero diante da dependência da filha mais velha. A garota teve dificuldades em se habituar ao dia a dia interiorano de Kaltenkirchen, onde passou a morar com a avó. Mas se desintoxicou da heroína e terminou a escola com notas boas.

No entanto, antes mesmo do lançamento de seu filme, Christiane já estava novamente viciada. Após receber os lucros referentes ao livro (graças a isso, ela nunca precisou trabalhar), mudou-se para Hamburgo, onde passou a viver com músicos e artistas que também eram usuários de drogas. No ano seguinte, foi para Zurique, na Suíça. Lá, virou frequentadora assídua do assustador Platzspitz, um parque onde quase 2 mil junkies se drogavam a céu aberto.

Em 1985, de volta a Berlim, Christiane foi flagrada com heroína e presa por dez meses. Depois de solta, viveu sete anos na Grécia, perambulando de ilha em ilha, como uma beduína, "livre do consumismo e do dinheiro" (mas não da heroína), ao lado do namorado local Panagiotis. Em 1993, voltou para Berlim e iniciou o tratamento de desintoxicação com metadona. Três anos depois, "limpa", deu à luz Phillip, filho de um namorado ex-viciado. "Ter um filho me fazia bem, fazia de mim uma pessoa melhor. Deu-me vontade de viver durante o dia, respeitar horários, ser confiável", conta.

Ao tentar se mudar com o filho para Amsterdã em 2007, Christiane enfrentou o maior drama de sua vida. Após cancelar a matrícula de Phillip na escola, o serviço de apoio à infância levou-o para um abrigo. Desesperada, Christiane armou um sequestro e fugiu com Phillip para a Holanda. Na época, ela namorava o filho adotivo de um chefão das drogas berlinense, foragido da polícia. O rapto do filho e a relação com um criminoso procurado a fizeram perder a guarda de Phillip, que passou a morar com pais adotivos.

Christiane voltou então a usar heroína. "Ainda hoje não consigo aceitar que tenham tirado meu menino. Sou covarde demais para me suicidar, mas desde então minha vida parou", desabafa. Ela jamais deixou de conviver com o filho, que hoje tem 18 anos e nunca leu a biografia da mãe.

No novo livro, Christiane não revela se ainda usa heroína ou não. O que ela não esconde de ninguém, nem do filho, é o fato de saber que sua morte está cada vez mais próxima. "Quando a hora chegar, terá chegado e nada mais. Um dia, meu fígado vai parar de funcionar, meu sangue não se renovará mais e eu acabarei completamente intoxicada. E morrerei disso."

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