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Avesso ao estrelismo

Alheio ao rebuliço que causa, Chico Buarque desembarca amanhã em Curitiba. Reconhecidamente discreto, o cantor não faz exigências além de água de coco e uma partida de futebol. Está no contrato: em cada cidade onde se apresenta, a produção local deve organizar um jogo entre a equipe do show e um time adversário. O local do bate-bola não é divulgado para evitar confusões com fãs, mas é raro que elas ocorram.

Segundo o assessor Mário Canivello, o único lugar em que as mulheres ficaram "mais assanhadas" foi Belo Horizonte, onde fãs subiram ao palco e quase derrubaram o cantor. "Chico não gosta desse tipo de idolatria, quer que as pessoas o ouçam.", avisa o assessor.

Oito anos se passaram desde a última vez que Chico Buarque pisou em palco curitibano. As esperanças de retorno já haviam esmorecido e, para os fãs que nunca assistiram a um show do cantor, ver o ídolo ao vivo parecia cada vez mais improvável. O lançamento do novo álbum em 2006 reavivou a possibilidade, mas a capital paranaense não estava, em princípio, entre as paradas da turnê divulgada. A incerteza da vinda e o longo tempo de espera culminaram em uma multidão que tomou a calçada em torno do complexo Teatro Guaíra na abertura da bilheteria para o show Carioca, em plena segunda-feira, sob sol forte e chuva. Mais de quatro mil ingressos foram vendidos até o fim daquele dia. A atração que Chico exerce sobre todas as gerações ainda é descomunal.

A sanitarista Joseli Araújo, 48 anos, não se contentou em esperar e partiu para o Rio de Janeiro, pouco antes do carnaval, para assistir a Carioca no Canecão. Apesar de ouvir as músicas do compositor desde a infância e admirar a poesia e a crítica dos versos de Chico, essa foi a primeira vez que assistiu a um show do cantor. Nos próximos dias, Joseli repetirá a experiência, desta vez ao lado da filha, que recebeu o convite da mãe como presente de aniversário. "Vou compartilhar com ela um momento muito importante da minha vida e tenho a alegria de saber que minha filha conseguiu perceber, mesmo sendo de outra geração, a beleza da obra dele", diz orgulhosa.

Bruna Merci, a filha de 21 anos, enfrentou a fila interminável para realizar o desejo de assistir à apresentação. "A expectativa é enorme porque eu sei que será muito difícil ver outro show dele. É uma oportunidade única que eu esperava muito. Não foi à toa que fiquei oito horas e 40 minutos na fila com o meu namorado", conta a estudante, que prefere as composições do período da Ditadura Militar porque retratam uma época que não viveu.

Fã da mesma geração de Bruna, a universitária Lara Frutos, 20 anos, permaneceu sete horas na fila e viu centenas de pessoas passarem à sua frente, devido à desorganização, para garantir um lugar na platéia. "Eu vou realizar um sonho, achei que nunca assistiria a um show do Chico. Vou ver o cantor que escutei a vida inteira", comemora. E não é exagero. Lara conta que a mãe tocava, ao violão, "João e Maria" para que a menina dormisse. Na infância, gostava de "Morena de Angola", a adolescência foi marcada por canções como "Tatuagem" e "Atrás da Porta" e, hoje, destaca "Geni e o Zepelin", que já era uma das preferidas quando criança. "O Chico é um pouco a trilha sonora da minha vida, porque cada momento tem uma música dele que me diz alguma coisa. Gosto da maneira como ele empresta pra gente a sua visão de mundo, esse realismo lírico", define.

O cantor da alma feminina, da "Rosa", "Rita" e "Beatriz’, encanta também o público masculino. O músico Carlos Machado, 30 anos, é outro que herdou da mãe a admiração pela obra de Chico Buarque. A abrangência temática e a "brasilidade" das letras chamaram a atenção e levaram-no a acumular toda a discografia e os livros do artista. "O Chico representa um pouco da elegância da música brasileira que temos perdido, ele representa a fuga contra a banalização geral da música.", defende. Carlos foi a São Paulo assistir a Carioca e já tem os ingressos para a apresentação em Curitiba. "Não posso perder a chance de assistir ao show no Guaíra. Quero ver de novo para repetir aquele momento.", conta.

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