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Sting: sem dom para as rimas | Arquivo Gazeta do Povo
Sting: sem dom para as rimas| Foto: Arquivo Gazeta do Povo

Pessoas portadoras de deficiência auditiva de Curitiba, poderão um motivo a mais para freqüentar espetáculos de teatro. O vereador Zé Maria (José Maria Alves Pereira - PPS), apresentou um projeto de lei que recomenda a adoção de legendas ou linguagem de sinais (Libras) nas exibições teatrais no município de Curitiba.

"Em um país que prega o direito de igualdade entre os cidadãos é necessário ver a realidade dos portadores de deficiência auditiva, que são excluídos das exibições teatrais", comentou o vereador que exerce seu primeiro mandato em Curitiba, e tem um trabalho ligado aos deficientes. Há mais de 20 anos, antes de assumir uma cadeira na Câmara Municipal, trabalha como voluntário na Escola de Educação Especial Primavera, e foi um dos articuladores da campanha para incluir pessoas com deficiência mental no mercado de trabalho, principalmente em supermercados.

O vereador explica que o projeto de lei atende aos pedidos de parentes, pessoas portadoras de deficiência auditiva e da campanha "Legenda para quem não ouve, mas se emociona!" (veja o site), coordenado no Paraná pela estudante Josiane Maria Poleski. A proposta coloca a questão como uma recomendação, e não uma obrigação, onde os teatros poderiam ser multados.

"Acredito que se um fizer todos fazem. Não são todos os teatros que adotariam as legendas, porque tem a questão de espaço. Mas acredito que uns 10 a 12 teatros fariam isso, é só instalar um aparelho", comentou o vereador, em entrevista por telefone. Ele não especificou qual a tecnologia a ser utilizada, mas explicou que o equipamento seria como uma tela de televisor, que deverá ser instalada no canto do palco, e conforme o ator for recitando o texto, o mesmo aparece escrito na tela para que o público faça a leitura.

Apesar do vereador ter declarado que não haverá punição para quem não cumprir a lei, o 2º artigo da proposta estabelece que caso seja aprovada, a exibição de peças teatrais ou demais obras dramatizadas ou cenográficas que não cumprirem a lei, serão punidas. Mas não está estipulado na proposta o tipo de punição. O projeto ainda não entrou na pauta de votação da Câmara Municipal.

Campanha

A luta dos deficientes auditivos pela inclusão de legendas em teatros, programas de televisão e filmes brasileiros teve início no Brasil, em 2004, sensibilizando a comunidade sobre as dificuldades vivenciadas. Com manifestações em eventos como o Festival de Cinema de Gramado e a Mostra de Cinema de São Paulo, um grupo paranaense esteve presente na entrega do Troféu Gralha Azul, destinado aos melhores profissionais do teatro paranaesne em 2006, realizado no último mês de março, no Guairinha, em Curitiba.

A manifestação sensibilizou alguns produtores, que não tinham pensado na questão. "É uma campanha recente. Nós recebemos portadores de deficiências em nossos espetáculos, mas não temos um equipamento especial para atender os deficientes auditivos. Enquanto inclusão social, a proposta é válida, mas a lei teria que deixar bem claro quem iria arcar com este custo e se haveria uma linha de financiamento, para não repetir os erros da lei da carteirinha de estudante. Somos obrigados a aceitar até de alunos de curso de inglês ou mestrado", comentou o produtor e ator Jader Alves, da Cia Máscaras de Teatro.

A atriz, diretora e produtora Regina Vogue tem opinião semelhante. "A idéia é superviável, bacana, mas vai encarecer o espetáculo e quem paga a conta? O ideal é que a lei apresente uma forma de subsídio para os teatros realizarem este investimento. Mas concordo que devemos oferecer conforto para as pessoas especiais", afirmou. O Espaço Teatro Regina Vogue, possui rampa e espaço destinado a cadeirantes (pessoas que se locomovem com cadeiras de rodas), o que facilita a entrada de deficientes físicos.

ExperiênciaSensibilizadas com a manifestação na entrega do Gralha, a produtora Tânia Araújo e a atriz e diretora Cleide Piasecki, usaram legendas na remontagem da peça "A Feia", de Piasecki, cuja história acompanha o julgamento de um casal que é acusado de matar a filha, que nasceu com deficiências físicas. O espetáculo teve temporada no teatro José Maria Santos, no último mês de junho e depois no Novelas Curitibanas, com as legendas.

"No José Maria, adotamos as legendas nas sessões de quarta e domingo. No início chegou a atrapalhar até mesmo o elenco. Usamos uma tela no fundo e um projetor que mostrava o texto na íntegra. Mas conversando com os deficientes, percebemos que não foi a melhor solução porque eles não conseguiam ler tudo. Então deixamos só o que é mais importante do texto, pois eles entendem os gestos, a encenação", explicou a produtora. Na temporada no teatro Novelas Curitibana, a legenda foi melhorada, com o uso de uma tela com fundo preto e as letras brancas. "Ficou bem melhor", declarou a produtora.

Tânia salientou que a inclusão de legendas não atrapalha o espetáculo, mas exige um investimento extra e a presença do público específico, que praticamente não compareceu durante as sessões no Novelas Curitibanas.

"Percebemos que a maioria é carente, sem condições de pagar R$ 5,00 pelo ingresso. Chegamos a elaborar um questionário, para a temporada, mas foram apenas dois deficientes auditivos e nem aplicamos. Mas, mesmo com o público pequeno, achamos que a experiência foi válida e vamos adotar em um novo projeto que estamos trabalhando, agora de comédia. Acreditamos que muitos não estão acostumados a ir ao teatro e não conhecem o uso da legenda. Temos que continuar. Fazer disso uma rotina, afinal eles estão no mundo", concluiu Tânia Araújo.

Para a inclusão da legenda, a produção do espetáculo digitou todo o texto na íntegra, e para exibir durante a peça contou com um computador lap-top, um projetor e um operador que liberava o texto em sincronia com o andamento da peça.

Teatro Guaíra

Para a produtora do Teatro Guaíra, Bia Reiner, o custo para instalação da legenda deve ficar mesmo com os produtores do espetáculo que, ou adquirem o equipamento ou precisam locar. "Mas depende também do tamanho do espaço. No caso do Miniauditório (do Guaíra), por exemplo, acho que seria inviável colocar legendas por falta de espaço".

O público

A webdesigner portadora de deficiência auditiva, Elissane Zimmermann, 25 anos, contou em entrevista por e-mail, que nunca foi ao teatro, mas considera importante possibilitar aos deficientes auditivos maior integração com a sociedade. Ela estudou em escolas particulares, com colegas ouvintes, e entende quando as pessoas falam com ela devagar. No fim deste ano, se forma em Design Gráfico pela Universidade Tuiuti do Paraná.

Já Josiane Maria Poleski, 21 anos, aluna do curso Administração de Empresas na Faculdade Dom Bosco, disse que foi muito bom ver o espetáculo legendado. "Foi a primeira oportunidade para surdos assistirem os espetáculos e conseguir entendê-los. Atendeu a expectativa, porque com a legenda os deficientes auditivos conseguiram entender a peça", escreveu no e-mail. Ela é portadora de deficiência auditiva profunda congênita. Josiane organizou a ida de um grupo de deficientes auditivos para assistir a uma sessão de "A Feia".

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