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Gramado – Os sinais de que coisa boa não viria de Sonhos e Desejos, principal longa-metragem do segundo dia do 34.º Festival de Gramado – Cinema Brasileiro e Latino eram claros. A começar pela frase-chave do cartaz da fita: "Eles não resistiram ao fogo da paixão". Dá para levar a sério um filme com essa premissa de novela mexicana? Saber quem faz parte do elenco também não gera grandes expectativas: Felipe Camargo, Mel Lisboa e o novato Sérgio Marone, mais uma das revelações (esta duvidosa) de Malhação. Para completar, o diretor – o estreante Marcelo Santiago – foi assistente de direção das "obras-primas" Bella Dona e A Paixão de Jacobina, ambos de Fábio Barreto, que por sinal é produtor artístico de Sonhos e Desejos.

Sempre tenta-se dar o benefício da dúvida, mas as primeiras seqüências do filme já demonstram que se está diante de uma verdadeira bomba, no mesmo nível de Dom, Procuradas, Araguaya – Conspiração do Silêncio, fracas produções que têm aparecido constantemente na seleção de Gramado nos últimos anos.

São tantos problemas com a fita, que fica difícil enumerá-los. Há uma trama sobre guerrilheiros brasileiros na década de 70, tema batido e recorrente no cinema brasileiro recente (com Zuzu Angel e Cabra Cega, que parecem clássicos se comparados a Sonhos e Desejos). O texto é primário, com péssimos diálogos que infantilizam e banalizam as utopias de uma geração. Mel Lisboa aparece novamente como uma lolita, dessa vez um pouco envelhecida – só para reafirmar que deverá ficar para sempre marcada pelo papel na série Presença de Anita.

"O filme procura investigar como a sociedade perdeu a vontade de lutar por algo coletivo, maior, trocando tudo por uma felicidade individual", disse Santiago, também autor do roteiro – baseado no livro Balé da Utopia, de Álvaro Caldas –, em coletiva de imprensa realizada em Gramado. Como discurso, o ponto de vista é interessante, a dificuldade está em passar o que se pensa para a tela.

A história gira em torno de um triângulo formado por Saulo (Felipe Camargo) um experiente professor revolucionário, Cristiana (Mel Lisboa), uma jovem aluna que se torna sua parceira sexual, além de lutar pela causa, e André (Sérgio Marone), um guerrilheiro ferido em ação contra a ditadura. Enquanto Saulo continua na batalha diária contra os militares, Cristiana fica cuidando do outro rapaz, que está fora de combate, no aparelho (esconderijo) dos revolucionários. Acontece o esperado, os dois últimos se apaixonam.

Mas Santiago não decide se quer fazer um filme político ou de amor. A parte política da trama tem vários furos, além de falta de contextualização – vale lembrar que o filme é ambientado em Minas Gerais apenas porque o diretor nasceu lá; todas as empresas patrocinadoras são mineiras: depois de captar dinheiro por um bom tempo no Rio Grande do Sul, o esperto clã Barreto, produtor da película, parte para "morder" recursos de novos mercados.

O envolvimento amoroso do jovem casal é construído de forma risível, com sentimentos revelados através de frases que parecem saídas de romances baratos. O personagem de Marone, que usa um patético capuz (Cristiana não pode ver seu rosto para não prejudicar a causa!), é um bailarino fã de Nijinski. Mas essa faceta é pouco explorada pelo roteiro, pois exigiria um certo aprimoramento do texto, destoando completamente do tratamento raso dos temas, marca principal do filme.

Para a "sorte" do espectador, Sonhos e Desejos já tem distribuidor (UIP, através da Paramount) e o selo Globo Filmes, e vai estrear com cerca de 30 cópias nas principais capitais do Brasil no dia 27 de outubro.

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