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Woody Allen e a atriz Naomi Watts neste sábado, durante a apresentação do novo filme do diretor em Cannes | Eric Gaillard / Reuters
Woody Allen e a atriz Naomi Watts neste sábado, durante a apresentação do novo filme do diretor em Cannes| Foto: Eric Gaillard / Reuters
  • Os atores Anthony Hopkins e Naomi Watts em cena de

"Não tem vantagem nenhuma em envelhecer. Você não fica mais esperto, mais sábio, mais doce ou mais educado. Você começa a sofrer com dor nas costas, indigestão, a visão fica pior, e vai precisar de ajuda para ouvir. É uma coisa muito ruim ficar velho. Recomendo que vocês não o façam". Aos 74 anos, o "velho" Woody Allen retornou a Cannes neste sábado (14), com a ironia de sempre, para apresentar seu mais recente filme, "You will meet a tall dark stranger", que entre outras coisas conta a história de dois casais cada vez mais infelizes na relação à medida que a idade avança.

Apresentado pela primeira vez no Festival de Cannes neste sábado, com recepção morna, o longa começa logo após o fim do casamento de quarenta anos de Helena (Gemma Jones) e Alfie (Anthony Hopkins), septuagenário obcecado com a saúde que resolve abandonar a mulher para voltar a "viver a vida" e se casa novamente com uma ex-garota de programa jovem e de corpo escultural.

Em paralelo, acompanha a crise no casamento da filha de Helena e Alfie, Sally (Naomi Watts), que depois de alguns anos já está cansada do marido, um escritor frustrado que nunca mais conseguiu fazer sucesso desde o seu primeiro livro (Roy, o personagem, é vivido por Josh Brolin). Descontentes cada um a seu modo, Sally se apaixona pelo chefe (Antonio Banderas) na galeria de arte em que trabalha, e Roy passa a flertar com a "vizinha do vestido vermelho", uma violonista bem educada e encantadora, vivida pela atriz Freida Pinto ("Quem quer ser um milionário?").

O título, "You will meet a dark stranger", faz referência a uma frase ouvida por Helena de uma vidente a quem recorre para tentar superar o divórcio de Alfie - no Brasil, onde o filme ainda não tem previsão de estreia (nos EUA é em setembro), a ideia poderia ser substituída por algo como "você vai conhecer um moreno alto..."

Scarlett de mão beijada

Como em seus últimos trabalhos, Woody, é claro, não é o "moreno alto" do título e sequer atua na história. "Toda vez em que atuei, eu fiz o papel romântico. Mas fiquei muito velho para isso, e não tem graça fazer se você não é o cara que fica com a garota no final. Imaginem como é frustrante fazer um filme com a Scarlett Johansson e ver um outro cara ficando com ela. E eu, lá, sendo só o diretor..."

Em resposta ao seu pessimismo natural, não faltaram oportunidades para os atores do elenco presentes à entrevista coletiva em Cannes - Brolin, Watts, Jones e a novata Lucy Punch - afagarem o ego do diretor.

"Woody foi incrível. Devia pagá-lo como meu terapeuta", disse Naomi Watts.

"Ele é um grande diretor, cria uma eletricidade no set onde tudo pode acontecer e deixa para você a responsabilidade por seu personagem", revelou Josh Brolin. "Ele não diz muita coisa. Mas se você não atinge um nível orgânico de atuação, o desapontamento dele se manifesta de um modo assim [faz uma careta retraída de desgosto]. Não! Gritar com os atores seriam muito mais familiar. Mas isso é muito Woody. Ele é sempre muito Woody", diz o ator, que já havia trabalhado com Allen antes em "Melinda e Melinda", de 2004, e voltou a chamar a atenção do diretor por sua atuação em "W", biografia de George W. Bush dirigida por Oliver Stone.

"Da primeira vez que trabalhou para mim, Josh não conseguia falar direito duas falas. Era como trabalhar com uma múmia", brincou Allen. "E quando vi esse filme ['W'], ele estava fantástico. Pensei na hora, tenho de voltar a fazer algo com Josh."

Diane Keaton, Meryl Streep, Mia Farrow, Penélope Cruz, Javier Bardem, Anthony Hopkins. Mesmo tendo conseguido atrair as melhores atrizes e atores do cinema mundial em suas dezenas de filmes, Allen, bem a sua maneira, faz pouco caso do feito. "Geralmente, não digo que há atores com quem eu queira trabalhar. Depende muito do script e do personagem que estou escrevendo. Aí eu vejo o trabalho das pessoas e, se bater, digo que quero trabalhar com elas", explicou. "O segredo é ser um bom contratador. Se você contrata bem, não tem como errar. Com esses grandes atores internacionais, que direção você precisa dar a eles? É só dar a eles a responsabilidade, ficar de boca fechada e pegar seu pagamento no final."

Entre as atrizes com quem ainda gostaria de trabalhar antes de morrer, o diretor lista "Cate Blanchett, Reese Whiterspon... e só. Essas são as duas que eu gostaria de trabalhar ainda, mas não as conheço, nem nunca tive a oportundidade de oferecer algum trabalho a elas." Mas é cedo para pensar em morte, e Allen usa a perspicácia habitual para se livrar de uma pergunta sobre como lida com a suposta proximidade dela. "Minha relação com a morte continua a mesma: sou totalmente contra ela. Tenho sorte que meus pais viveram muito tempo, então isso talvez seja bom para mim."

Cinza

Se as ideias e a língua de Woody Allen continuam afiadas como sempre, o mesmo não pode ser dito de seu novo filme. Rodado em Londres – escolha que ele descreve com certo desdém: " É fresca no verão, o céu é cinza, o dinheiro é bom. Gosto de fazer filmes lá, mas não só" - , "You will meet a tall dark stranger" não tem a mesma força que seus dois trabalhos anteriores, "Tudo pode dar certo", que marca sua volta à estimada Nova Iorque, e "Vicky Cristina Barcelona", divertida não só pelo espírito alegre da metrópole espanhola mas também pelas atuações hilárias de Penélope Cruz e Javier Bardem.

Mesmo se tratando de uma história com diversos elementos típicos do universo "alleniano" - casais que traem, velhos que se apaixonam por mocinhas (e vice-versa), intelectuais, escritores e galeristas -, falta ao seu novo filme o sabor do tempero local que soube dar tão bem a seus dois outros filmes. Tomara que suas passagens pela França e, com sorte, pelo Brasil possam render melhores frutos.

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