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A publicação mensal trazia fotos em suas capas: de bailes carnavalescos (no fundo) à realidade (em primeiro plano) |
A publicação mensal trazia fotos em suas capas: de bailes carnavalescos (no fundo) à realidade (em primeiro plano)| Foto:
  • Joel Silveira era outro colaborador da publicação mensal
  • Dalton Trevisan publicava textos, a exemplo de
  • Samuel Guimarães da Costa produziu texto sobre Graciliano Ramos
  • Reportagem mostra um
  • Dalton Trevisan: desconstruindo Curitiba
  • Saiba mais sobre a trajetória da Revista da Guaíra

Curitiba pulsava com intensidade incomum na metade do século 20. A euforia diante dos festejos do Centenário da Emancipação Política do Paraná, em 1953, e a iminência da construção dos prédios do Centro Cívico, entre outros, além do dinheiro que fluía do café do norte do estado, criaram um ambiente propício para aqueles anos de renovação que levariam, tempos depois, o presidente Juscelino Kubitschek a imprimir um toque de modernidade em todo o país.

Uma publicação gerada a partir de Curitiba encontrou ressonância naqueles ventos: a Revista da Guaíra.

De fevereiro de 1949 até a década de 1960, o periódico mensal circulou do Rio Grande do Sul ao Maranhão – e, via marítima, atravessou o oceano Atlântico e esteve até mesmo nas mãos de leitores portugueses. Reportagens, entrevistas, páginas femininas, notas do mundo social, esporte e literatura preenchiam as páginas, que geralmente ultrapassavam as seis dezenas em cada edição.

Rubem Braga, Joel Silveira, Rachel de Queiroz, José Paulo Paes e Dalton Trevisan eram alguns dos colaboradores. A revista também veiculava a prosa inventiva de autores estrangeiros, entre os quais James Joyce, Rudyard Kipling e Guy de Maupassant. E o responsável pela iniciativa? O alagoano radicado em Curitiba Oscar Joseph de Plácido e Silva (1893-1963) que, influenciado pela numerologia, sempre assinou De Plácido e Silva.

O diretor da Revista da Guaíra, entre tantas atividades, também participou da fundação da Gazeta do Povo, em 1919, ao lado do advogado Benjamin Lins, e estaria à frente da Empresa Gráfica Paranaense, que editaria o jornal diário. Posteriormente, a empresa passou a se chamar Editora Guaíra, que –além de livros – teria na revista um de seus produtos de maior visibilidade.

Um caso à parte

O pioneirismo da empresa curitibana despertaria a curiosidade de intelectuais e leitores de todo o Brasil (o que é comprovado por algumas correspondências publicadas nas páginas da revista), sobretudo naquele contexto – afinal, excetuando a Editora Globo (de Porto Alegre), as principais casas editoriais estavam instaladas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Entre as coleções de livros, a Guaíra colocou no mercado a Estante Americana, Romances Brasileiros, Contos Nacionais e Poesia e Teatro – as obras desses projetos praticamente estão esgotadas e fora do comércio.

A professora titular de Gestão da Informação da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Leilah Santiago Bufren pesquisou a Guaíra e chama a atenção para o fato de a editora ter publicado, com o selo da coleção Estante Americana, uma trilogia de romances do escritor norte-americano John Dos Passos: Paralelo 42, 1919 e Dinheiro Graúdo. "Além de viabilizar obras de autores brasileiros, como Joel Silveira, a Guaíra teve a impetuosidade de disponibilizar títulos até então inéditos no Brasil, como foi o caso dos livros de John Dos Passos", afirma Leilah, observando que a empresa tinha na revista uma vitrine para difundir o seu catálogo.

De Plácido e Silva era interlocutor de intelectuais e autores brasileiros, e alguns deles colaboraram nas traduções, a exemplo de Silveira Peixoto, Miroel Silveira e Zenha Machado – o trio atuou no projeto de edição dos títulos de John Dos Passos. Entre os destaques da editora, Huasipungo, o mais importante romance do escritor equatoriano Jorge Icaza e Ódios da Cidade, a longa narrativa ficcional de autoria do editor. Mas um incêncio, na década de 1960, iria colocar um inesperado ponto final na empresa instalada na Travessa dos Editores, no bairro Mercês, em Curitiba.

Uma vitrine

Antes de acabar em chamas, a Guaíra "incendiou" a vida cultural, social e política de Curitiba. Samuel Guimarães da Costa, Manoel de Oliveira Franco Sobrinho e Luiz Geraldo Mazza, entre outros, produziam reportagens de fôlego, por exemplo, sobre a vida de jangadeiros, a respeito de Guaratuba e uma em especial, com o título "Um Domingo em Curitiba". Anunciantes locais, como as lojas de departamentos Prosdócimo e Hermes Macedo, espalhavam anúncios entre um texto e outra nota.

Naquele tempo, era mais do que comum assinar com pseudônimo. Juril Carnasciali, filha do proprietário da Guaíra, estreou no jornalismo como redatora da revista e não foi exceção à regra: utilizava inúmeros outros nomes, e mesmo iniciais, em seus textos. Colunista dominical da Gazeta do Povo, Juril debutou como colunista social na edição de maio de 1949: ela fez a cobertura do casamento de Jayme Canet Júnior e Maria de Lourdes Araújo, realizado em abril, com cerimônia na Catedral Metropolitana e recepção no (extinto) Grande Hotel Moderno. "Foi um acontecimento na cidade", recorda Juril.

"Era uma revista de qualidade, bem feita, com muita popularidade em Curitiba", diz o crítico literário Wilson Martins, colunista da Gazeta do Povo, que acompanhava – atentamente – as edições da Revista da Guaíra. Observador do mercado editorial há mais 60 anos, Martins afirma que o periódico teve o destino da maioria das iniciativas locais: a extinção. "As revistas no Paraná parecem predestinadas a ter vida curta. A Revista da Guaíra, assim como a editora, teve ainda o azar de encontrar um incêndio em sua trajetória", completa.

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