Revelação da MPB, Tiê é “uma janela para o céu”

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Foi imobilizada sobre uma cama, com o pé engessado em consequência de uma queda da escada, que a britânica Kate Nash compôs seu disco de estreia, Made of Bricks. A jovem musa americana do jazz Melody Gardot também deve seu primeiro CD a um período de recuperação, ao recorrer à musicoterapia após de ter sido atropelada enquanto andava de bicicleta. É de se pensar que uma temporada prolongada de convalescença, obrigando a um mergulho interior um tanto solitário, tem efeito positivo sobre a sonoridade de jovens cantoras.

A história da paulista Tiê comprova a hipótese. Apenas depois de passar por uma cirurgia para extrair um tumor benigno do pulmão, com a imunidade fragilizada, a moça se pôs a compor e gestou o álbum independente Sweet Jardim, com o qual garantiu lugar privilegiado entre as vozes estreantes no crescente cenário das cantoras de música popular brasileira.

Seu terreno não é o samba, que ainda predomina como influência-mor dessa nova geração, mas o som acústico sustentado por voz e violão, com um toque mais folk – outra tendência em alta, que o diga Mallu Magalhães, a quem Tiê, de 28 anos, já foi comparada, mas como uma "versão para adultos" da adolescente precoce.

O primeiro a sucumbir à doçura do seu timbre foi Toquinho, dando-lhe uma vaga em sua banda, com a qual viajou em turnê pelo Brasil e exterior, ganhou experiência e segurança para seu posterior voo-solo. Mal a cantora com nome de ave saía sozinha do chão, veio em sua defesa um encantado Caetano Veloso, cravando em seu blog a impressão deixada pela canção "Passarinho": "é uma janela para o céu". Rendeu-se, em seguida, a imprensa paulista. E o adjetivo "promissora" não mais descolou de seu nome, a não ser por aqueles que já a consideram uma promessa realizada.

Confessional

Dentre tantos rostos bonitos e vozes afinadas que surgem pelos cantos do país, Tiê, ex-modelo com passagem pelo Japão e pelas capas das revistas Querida e Capricho, se distingue por envolver suas canções em um universo muito particular, de tom autobiográfico, marcado pelo fraseado confessional.

É hábil letrista, a cantar seus afetos com a coloquialidade de quem diz o que pensa e sente sem filtros, sem anular os resquícios infantis persistentes na vida adulta, muito menos sua dose de romantismo. "Chá Verde" está entre suas canções mais pessoais, lembrando os tempos de tratamento com um acupunturista chinês e litros da bebida diurética, enquanto em "A Bailarina e o Astronauta" inventa um romance delicado entre os personagens. As duas são embaladas ao piano.

Graciosas, hipnotizantes, suas composições parecem sair de um quarto de menina crescida, e se conjugam em um disco bastante homogêneo, com personalidade própria, no qual se abrem espaços para o silêncio, a arejar os arranjos minimalistas.

Toquinho faz sua contribuição tocando violões ciganos na faixa-título, mais acelerada do que o restante, assim como "Aula de Francês", na qual a cantora se entrega à língua da chanson, e "Stranger But Mine", sua incursão pelo inglês.

Recém-lançado seu disco, produzido por Plínio Profeta, Tiê pode ser ouvida em casas de show paulistas, como o Tom Jazz, e tem apresentações previstas no Rio de Janeiro. Seu nome sonoro, assim como seu canto frágil e melodioso, merecem se espalhar por todo país. GGG1/2

Serviço

Sweet Jardim. Tiê. Independente. Preço médio: R$ 16,90. www.myspace.com/tiemusica